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X de Sexo Por Bruna Maia
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Conheça o segredo das casadas transantes

Spoiler: elas se livraram das amarras patriarcais de comportamento

Carlos Alberto Riccelli e Bruna Lombardi, juntos há 46 anos: 'A gente está sempre numa conquista, num tesão...', disse ela, em recente entrevista - Mathilde Missioneiro - 6.fev.24/Folhapress
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Sempre achei estranho que, diante do mau humor ou desgosto (em geral justificado) manifestado por uma mulher, as pessoas a xingassem chamando-a de mal comida. Ora, é o cara que manda mal e a culpa é dela? Com o tempo passei a achar esse tipo de insulto mais machista ainda porque ele coloca o prazer —e o humor– feminino sob responsabilidade e tutela de algum homem, em geral o marido.

E eis que, um dos segredos para você continuar transuda depois de anos de relacionamento, é justamente tomar o próprio prazer para si. Esse foi um dos achados do artigo "É o meu prazer": fatores subjetivos implicados em mulheres com desejo sexual, de autoria das pesquisadoras Gerli Araújo e Valeska Zanello, publicado em novembro. Trata-se de um estudo qualitativo, que ouviu doze mulheres de 32 a 78 anos que estão em relacionamentos longos e qualificam seu desejo sexual como muito bom.

As pesquisadoras encontraram alguns pontos que atravessavam os relatos. Um deles é a desromantização. Elas se permitiam vivenciar a sexualidade sob a lógica do erótico, do prazer físico, e não como algo necessariamente atrelado ao amor e ao romântico, muito menos na esfera da obrigação conjugal.

Relataram não esperar que tudo parta dos parceiros: muitas buscam por conteúdo erótico em livros e filmes, se masturbam e, na hora da relação sexual, orientam os cônjuges se for necessário. Além disso, costumam dizer não para o que não gostam ou não querem e não hesitam em tomar a iniciativa quando têm vontade. Um trecho do estudo exemplifica:

"Sabrina, 30 anos de casada, considera que o seu relacionamento sexual melhorou nos últimos anos, a partir do ponto que falou para o marido que determinadas práticas sexuais não a agradavam, como o sexo anal. Margarida, 56 anos, servidora pública, está lidando com a impotência recente do parceiro, e considera que há outras formas de prazer além da penetração.

Por isso, enviou uma reportagem sobre o assunto para o marido, informando que havia ‘mil formas de fazer amor’. E lhe disse claramente: ‘É assim que gostaria de ser tratada’."

Além da clareza de comunicação, as experientes transantes demonstraram impor limites em outras esferas do relacionamento além do sexo. Uma delas relata ter deixado o marido que bebia, mesmo gostando dele.

Depois de um ano de insistência, ela aceitou voltar, desde que vivessem em casas separadas e ele não bebesse quando fosse vê-la. Impera um certo pragmatismo entre essas mulheres: o companheirismo é importante, mas o próprio bem-estar é prioridade, mesmo que isso implique o fim de um relacionamento.

As entrevistadas não vinculavam o fato de desejarem e serem desejados a rígidos padrões de estética. Estão mais gordinhas ou mais velhas? Ok, faz parte, não é isso que vai impedi-las de desfrutar. A proatividade, significando a capacidade de tomar decisões e agir de acordo com o próprio desejo, também se demonstrou uma característica comum:

"Beatriz não sabia dançar e sentia-se constrangida por isso. Procurou ter aulas e foi num salão de dança que conheceu o atual marido. ‘E aí quando ele me abraçou pra dançar... aí ele... tudo mudou, né. E, assim, teve um envolvimento muito grande’.

Foi recorrente o fato de os relacionamentos serem mais igualitários do que o tradicional contexto patriarcal que coloca mulheres no lugar de esposas e mães, e maridos no lugar de sujeitos a serem cuidados. Na cama, os maridos sabem como estimular a parceira, se preocupam com o prazer delas e ouvem o que elas têm a dizer.

"Ele percebe pela minha respiração, pelo meu olhar, pelo meu jeito de mexer, se eu tô curtindo, se eu não tô. O outro cara era chegar, meter, gozar e acabou", disse Paula, uma das entrevistadas. Além disso, os casais agem com cumplicidade e amizade no cotidiano:

"Arlete revela como é a sua convivência com o marido. ‘Se eu estiver aqui e ele tiver comendo, vem me dar comida na boca e eu a mesma coisa que ele. E quanto mais velho está ficando, parece que mais unido a gente está, sabe?’. Margarida tem estratégias para manter o vínculo com o marido, mesmo morando em casas separadas. ‘Nós vamos no cinema na quinta…mas aí a gente janta, conversa, morre de rir. E a gente faz caminhadas todos os dias juntos, pilates…’."

Olhando assim, parece que a receita é fácil, né? Autoestima, iniciativa, amizade... Mas acredite ou não, desejar é muito difícil para muitas pessoas. E, quando se trata da construção da feminilidade, que consistentemente nos coloca como objeto de desejo e não como seres desejantes, é mais complicado ainda. Sair dessa posição passiva nos faz mais felizes. Vamos tentar?

X de Sexo por Bruna Maia

Bruna Maia é escritora, cartunista e jornalista. Autora dos livros 'Parece que Piorou', 'Com Todo o Meu Rancor' e 'Não Quero Ter Filhos', fala de tudo o que pode e do que não pode no sexo.

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