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X de Sexo Por Bruna Maia
Descrição de chapéu Todas LGBTQIA+

Madonna ajudou várias gerações a descobrirem sua sexualidade

Cantora se comunicou com LGBTQIAPN+ e com mulheres inconformadas com seu papel social

Madonna no clipe de 'Justify My Love' - @Madonna/Youtube
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Quando eu tinha uns 12 anos, eu vi pela primeira vez o clipe de "Human Nature", de Madonna. Nele, a cantora e seus dançarinos usavam roupas de vinil e faziam coreografias sinuosas em cubos brancos, ostentando alguns acessórios fetichistas. Esteticamente era chique demais, mas o que mais me pegou foi a letra. Foi uma influência e tanto, daquele tipo de obra de arte que me fez pensar: "Quero viver nesses termos".

Ela canta coisas como: "Eu disse algo errado? / Oops, eu não sabia que não podia falar sobre sexo (Eu devia estar doida) / E eu não me arrependo (não me arrependo) / É a natureza humana (é a natureza humana) / E eu não me arrependo (não me arrependo) / Não sou sua, não jogue suas porcarias em mim."

É uma mulher avisando que não vai se deixar calar, que não se arrepende de falar sobre suas fantasias e que não aceita ficar presa em um lugar pequeno e nem vai aceitar carregar o fardo da amargura alheia nas costas. É sexy e, ao mesmo tempo, político. Dialogou bastante com a garota que eu era na época: morando em uma cidade periférica de um estado provinciano, achando quase todos os meus colegas um bando de caretas com cabeça fechada e ansiando por descobrir o mundo.

Madonna teve esse efeito em muitas pessoas ao longo da sua carreira. Uma vanguardista do pop, ela sabia quais assuntos abordar e qual estética usar para criar identificação com o público. Ela não é uma mera causadora de polêmicas, ela é uma artista mainstream que conseguiu se comunicar com pessoas divergentes ao mesmo tempo que fazia os normativos dançarem. Bichas, sapatões, bissexuais, transgêneros, fetichistas, surubeiros, mulheres heterossexuais que não aceitavam o papel que lhes era imposto conseguiam enxergar na artista uma avalanche de possibilidades.

A atriz e roteirista Tatá Lopes acumula CDs, DVDs, vinis, pôsteres e revistas da cantora e acompanha sua carreira desde que tinha 13 anos. Disposta a quase tudo para conseguir o ingresso VIP e ver a cantora mais de perto, Tatá conta que a música "Justify My Love" e seu clipe, de 1990, foram uma revolução em sua vida. "Tinha 13 anos quando o clipe foi exibido e foi a primeira vez que vi duas mulheres se beijando. Ali eu entendi que bissexualidade era possível e perfeitamente aceitável. Com cenas de sadomasoquismo, ménage e estética andrógina, ela confundiu os gêneros pré-estabelecidos e explicitou o voyeurismo que reside em cada um de nós."

No vídeo de "Justify My Love", que chegou a ser banido da programação diurna da MTV, a cantora está em um hotel onde vive aventuras sexuais com algumas pessoas diferentes. "Ela esfregou na cara da sociedade no início dos anos 90 alguns fetiches que as pessoas têm e, por puritanismo, não admitiam; tinha mulheres e homens se beijando, aquilo mexeu demais com todo mundo", diz Alex, um fã da cantora desde 1989 que conheci na frente do Copacabana Palace (zona sul do Rio), onde ela está hospedada.

A aglomeração na frente do icônico hotel carioca demonstra bem o impacto de Madonna. Estavam lá muitos homens gays por volta dos 45 anos, mas também idosos de sunga e senhoras praianas característicos do bairro, performers, casais heterossexuais, mães de família. Uma delas era Fabiane, que vestia um corset, luvas e meias arrastão. Ela puxou o celular e me mostrou várias fotos de looks que ela costurou à mão inspirados nos visuais da diva e me disse que ela e as duas filhas vão montadas tal qual dançarinas de Madonna para o show de sábado. "A música mais sexy dela é 'Fever'. É de 1992 e a performance é bem liberal, isso num mundo em que as pessoas não gostam de se mostrar como são", diz.

Com apreço por boas letras, produção musical de qualidade e busca por elementos visuais que dialogam e reforçam a mensagem que quer passar, Madonna é uma artista de rara qualidade técnica e estética. Mas, para além disso, ela conseguiu trazer a política para sua arte, fazer o público LGBTQIAPN+ se sentir representado e criar meninas inconformistas. Sem nunca deixar de ser a rainha do pop.

X de Sexo por Bruna Maia

Bruna Maia é escritora, cartunista e jornalista. Autora dos livros 'Parece que Piorou', 'Com Todo o Meu Rancor' e 'Não Quero Ter Filhos', fala de tudo o que pode e do que não pode no sexo.

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