'Pantanal': Renato Góes diz que José Leôncio o salvou do posto de mocinho
Para ator, primeira fase da novela será como ter 'minissérie no horário nobre'
Para ator, primeira fase da novela será como ter 'minissérie no horário nobre'
Onças, jacarés, cobras, banhos de rio e pores do sol multicoloridos estão de volta à TV brasileira após 32 anos. A partir desta segunda-feira (28), a Globo exibe na faixa das 21h a nova versão de "Pantanal", novela já produzida com sucesso pela extinta Manchete em 1990, com um misto de reverência e ressignificação do texto original.
Entre os muitos elementos que tornaram a novela um clássico, estão personagens icônicos costurados em uma saga familiar que perpassa gerações. A espinha dorsal da trama, no entanto, é José Leôncio, personagem que, na primeira fase, é vivido por Renato Goés, 35.
Ele encarna o personagem nos 20 primeiros capítulos. Depois disso, há uma passagem de tempo e o papel passa a ser interpretado por Marcos Palmeira, 58. Drico Alves, 19, também aparecerá brevemente, em cenas que mostram a adolescência de José Leôncio.
Os atores trabalharam juntos para chegar a um denominador comum. "Eu sou muito grato ao Marquinhos, ele foi um cara muito generoso nesse processo", comenta Góes. "Ele trouxe muitas coisas para a gente colocar em cena."
Os dois atores se encontraram antes das gravações, mas também no Pantanal, enquanto a novela já estava sendo rodada. "Depois de tudo o que já tínhamos conversado, tivemos a oportunidade de voltar a falar quando aquilo já tinha tomado forma, já tinha ido para a vida. Fomos moldando juntos o personagem, isso foi muito importante."
Na trama, José Leôncio cresce sem uma figura materna e admirando profundamente o pai, Joventino (Irandhir Santos), um exímio peão, considerado uma espécie de encantador de bois pelos colegas. Após se estabelecer no Pantanal, Joventino some misteriosamente dentro da mata, ficando o filho responsável pela fazenda de gado erguida pelo pai.
"A relação de José Leôncio com o Joventino tem uma potência muito grande, tanto é que, aparecendo em apenas dois capítulos praticamente, ela permeia a novela inteira", comenta Góes. "Foi isso que eu e o Irandhir tentamos construir."
O desaparecimento jamais explicado ou aceito pelo filho faz com que Joventino seja uma presença constante, mesmo sem estar em cena. "O pai é um norte para ele", explica o ator. "Tudo o que o pai foi é o que ele quer ser: o peão que o pai foi, o homem que o pai foi... A questão sempre presente para ele é: 'Como eu, um simples mortal, vou conseguir fazer do mesmo jeito que meu pai?'."
Até a vida amorosa de José Leôncio é atravessada por essas questões. Na trama, ele tem dois grandes amores, Madeleine e Filó, interpretadas por Bruna Linzmeyer e Leticia Salles. Para o ator, o fato de a primeira ir embora do Pantanal levando o filho enquanto ele está em uma comitiva, mexe com o maior trauma do personagem: o abandono.
"O José Leôncio foi abandonado pela mãe, depois pelo pai e, mais adiante, pela mulher, então ele sofre muitos abandonos", analisa. É por isso que, na opinião do ator, ele não vai atrás de Madeleine e resolve se casar com Filó, que ele considera um "porto seguro".
"A Madeleine vem de uma forma muito explosiva, é muita paixão, muito amor, mas também muita briga, muita confusão", explica. "Enquanto a Filó não trouxe para ele essa carga de amor e paixão tão grande, ela traz uma devoção jamais vista por ele. São dois relacionamentos com muita força, mas com intenções, entregas e formas completamente diferentes."
Góes diz que o personagem é de uma complexidade ímpar em sua carreira. "É um cara de uma retidão muito grande, de muito amor pelos outros, de muita empatia, mas ao mesmo tempo é um cara muito grosseiro, que tem um status de retrógrado em algumas coisas", avalia. "Ele é machista e coronelista, por exemplo."
Ele comemora essas muitas camadas do personagem. "Eu já estava preocupado porque vinha de três ou quatro mocinhos e é difícil entregar mocinhos diferentes", revela. "Queria fazer algo novo e, assim que o Rogério [Gomes, diretor artístico da novela] ligou e foi me contando o que era, eu já fiquei todo arrepiado."
O ator diz que, então, já tinha ouvido falar que haveria um remake da novela e já acreditava que tinha o perfil para fazer algum personagem na trama. "Eu mentia para mim mesmo, mas na verdade eu estava na expectativa talvez quase um ano antes de o convite vir", lembra.
Ele diz que conhecia a primeira versão da novela, mas era muito jovem na época que ela foi exibida. "Eu não lembrava da dramaturgia em si, dos arcos dramatúrgicos dos personagens", afirma. Entre as coisas que o marcaram estavam a trilha e os nomes de alguns personagens, como Juma ou o Velho do Rio, que estavam presentes nas brincadeiras de infância.
"Ficou muito marcada também a abertura da novela, que tinha uma atriz [Nani Vanâncio] que aparecia meio nua, de lado", conta. "Tinha essa coisa de eu, supernovinho, estar vendo uma coisa que era meio proibida."
A nudez, aliás, não estava presente apenas na abertura. Algumas das cenas que mais fizeram sucesso na época eram de personagens, como o próprio José Leôncio, tomando longos banhos de rio completamente pelados e integrados com a natureza, algo que deve se repetir na nova versão.
"Não tem nada muito diferente da outra versão", garante Góes. "Tem banho de rio e algumas cenas de sexo. Como isso é mostrado não muda tanto. Não se estabeleceu uma regra para mostrar mais ou menos. Eu, em nenhum momento, fiquei preocupado em ter que mostrar. Também não vi nenhum movimento desse tipo entre meus colegas. O que está no papel vai ser feito sem essa preocupação."
Isso mesmo considerando que o público atual esteja menos habituado a esse tipo de cena na TV aberta do que na época da novela original. "Ninguém escreveu nem dirigiu essa versão pensando em ideologia do pudico", afirma.
"Com responsabilidade, se fez uma ou outra adaptação que fazia sentido", avalia. "Mas acho que o autor e o diretor não fizeram nessa versão nada pensando em se o público era mais ou menos conservador, liberal, progressista ou qualquer que seja a ideologia que limitaria um tipo ou outro de aceitação."
Para entender melhor a história, o ator diz que voltou ao original algumas vezes e também conversou com Paulo Gorgulho, 62, que fez José Leôncio na primeira fase da versão original —na segunda, ele ainda viveu José Lucas, um dos filhos do personagem. Gorgulho também fará uma participação na nova produção.
"Não tinha por que eu não ir beber nessa fonte", avalia. "O que eu fiz foi me alimentar bastante daquilo e, chegando mais perto da novela, não procurar mais nada. Fiquei com o que eu já tinha, porque já estava embevecido daquele trabalho. Eu só bebi na fonte e fui embora nadar."
Um ano após começar o processo de preparação, ele acredita que a energia das gravações vai se refletir nas telas. "A gente fez essa primeira fase no tempo que se faz uma novela inteira", compara. "Esses 20 capítulos contam poucas histórias, mas histórias que vão desencadear em grandes núcleos, em mais 160 capítulos de história, por isso é muito intenso."
De volta à vida real, Góes avalia que a experiência diferiu das gravações normais de novela, às quais estava acostumado. "É uma obra fechada, quase uma minissérie de 20 capítulos no horário nobre", compara. "Isso dá a oportunidade de saber começo, meio e fim da sua trajetória e trabalhar melhor as nuances do personagem. Por outro lado, quando você acaba de gravar no último dia, você fala: 'Queria fica mais 140 capítulos aqui'."
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