Com volta de 'A Viagem', Guilherme Fontes cita memes: 'Alexandre é o conselheiro do Bolsonaro'
Para ator, vilão deveria ganhar sequência em série ou game, dada sua repercussão
"De tempos em tempos, o ator tem uma oportunidade ou reza para ter essa oportunidade de encontrar um personagem que, digamos assim, é a sua alma gêmea". Foi aos 27 anos que Guilherme Fontes, o autor da frase acima, se deparou com o papel que se tornaria um marco na sua carreira: o inesquecível Alexandre, de "A Viagem", novela de 1994, que será reprisada pela quarta vez, a partir desta segunda (21), no canal Viva.
Não que o ator tenha algo a ver com o diabólico e perturbado vilão da trama que, depois de morto, volta do Vale dos Suicidas para assombrar seus inimigos na terra. O que ele diz é que, apesar de muitas de suas cenas serem dramáticas e com uma carga de energia muito pesada, o clima nas gravações era leve e tudo fluía com facilidade. "Aquilo era tão prazeroso, tão divertido de fazer, que eu saia rindo, no sentido de, puxa, foi muito bom fazer", revela.
O resultado é que até hoje Fontes não passa um dia sem ser reconhecido pelo personagem, o que não o incomoda. "Eu acho absolutamente extraordinário. Fico muito orgulhoso de saber que um trabalho que eu fiz há quase 27 anos, continue sendo reprisado e fazendo sucesso."
Alexandre também entrou para uma seleta e curiosa lista, composta por outros grandes vilões da TV brasileira, como Odete Roitman (Beatriz Segal), Nazaré Tedesco (Renata Sorrah) e Carminha (Adriana Esteves): virou meme. Em muitas das montagens que circulam na internet, uma imagem dele é colocada atrás do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) ou de seus filhos para indicar que os políticos estariam sob a má influência do seu espírito –assim como ele fazia na novela, já depois de morto, para se vingar daqueles que o prejudicaram em vida.
"[Os memes] são divertidíssimo e fazem o maior sentido [...] Alexandre é o grande conselheiro das bobagens que o Bolsonaro fala", afirma. O que não tem graça, ressalta o ator, é a forma como os governantes brasileiros minimizam a pandemia do novo coronavírus no Brasil. "Não conseguem viver sem criar o caos [...] A população precisa de políticos seguros, sem gracinha, sem piada, com atitudes responsáveis", destaca.
Diante de tanta repercussão que o vilão tem até hoje, Fontes diz acreditar que o personagem ainda "tem muito caldo" para dar. Ele vislumbra alguma continuação, seja em série ou até um game com o vilão. No fim de "A Viagem", que segue a doutrina do espiritismo, Alexandre recua da sua vingança e diz querer reencarnar no filho de Lisa (Andrea Beltrão) e Téo (Mauricio Mattar).
Para o ator, esse é o gancho de uma sequência. Só que, avisa ele, o espírito do malvado não conseguiria evoluir não, como foi sugerido na trama. "Tem coisas que não evoluem jamais, infelizmente. Aquilo ali era um truque", diverte-se.
"Acho que ele, o Alexandre, iria tocar o terror, tipo 'Brinquedo Assassino', o legal seria isso", comenta. "E o divertido é ele ser criança. Hoje em dia, com computação gráfica, pode colocar meus olhos no personagem, pode fazer o diabo. Como muitos coisas mudaram na Globo neste ano, espero que em 2021 a gente consiga brincar com algo", acrescenta.
Agnóstico, Fontes afirma que respeita muito a doutrina espírita e que acredita no peso das "energias" no dia a dia das pessoas. Para ele, a reprise da história é uma oportunidade de uma nova geração conhecer o vilão. "Eu brinco que até acabei trabalhando menos, porque a novela é tão presente, acabava que eu fazia menos coisas, e estava sempre na boca do povo."
"A Viagem" foi reapresentada duas vezes na Globo, uma em 1997 e uma 2006; e uma vez no Viva, em 2015 e 2016.
MUDANÇAS NA GLOBO
Neste ano, nomes de peso deixaram a emissora, como Tarcísio Meira, Glória Menezes e Antonio Fagundes, como parte de um projeto de reorganização da Globo. Além disso, Ricardo Waddington assumiu o cargo de Diretor de Entretenimento, no lugar de Carlos Henrique Schroder.
Guilherme Fontes conta que nunca foi contratado por longos períodos na Globo. O seu último trabalho na empresa foi na novela "Órfãos da Terra", de 2019. Para o ator, as mudanças são positivas até mesmo para os artistas, que hoje encontram outras possibilidades no mercado, seja no universo das plataformas de streaming ou até em projetos independentes.
"Ator na prateleira é um desperdício. Ator que se repete por força de contrato é uma tristeza, mas é a nossa realidade. Tem muitos colegas que eu admiro que estão nessa batalha... Eu brinco sempre que eu não sou tão bom para fazer novela toda hora, porque o povo vai perceber e eu vou ficar chateado", contemporiza.
Segundo ele, hoje com um celular na mão, o artista consegue se reinventar. "Você abre uma câmera e pode se tornar um evento nacional, sem nenhuma produção. Você vê o sucesso de Ary Fontoura nas redes. Olha que máximo. O homem chega aos 87 anos, e começa a se comunicar com o público, e passa a se sentir bem, e hoje é um evento extraordinário. Isso que é muito libertador para o ator", diz.
Por outro lado, Fontes, que também é produtor e diretor, se diz muito preocupado com a situação dos cinemas e do teatro. Ele afirma que pretende lançar um estúdio em 2021, que contemple produções cinematográficas e uma companhia de teatro. Estuda também promover um concurso de roteiristas para séries e filmes. "Para novela não que estamos lá na frente, mas para roteiro de filme e série ainda estamos como se estivéssemos engatinhando, acho que vale um investimento."
No fim deste ano, Fontes conta que fez uma participação como ator em um longa, que ainda não pode revelar o nome, mas que tem a atriz Larissa Manoela no elenco. Com as medidas de proteção adotadas para as filmagens, com uso de máscaras, distanciamento e realização de testes constantes na equipe, ele afirma que viu uma luz no fim do túnel. "Fiquei bem satisfeito e vi que é possível, apesar desse caos, filmar e rodar", conclui.
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