Falta adrenalina a 'Tração', filme policial brasileiro ambientado no universo do motocross
Longa de André Luís não consegue empolgar nas sequências de ação
O cinema brasileiro costuma se dar bem em dois gêneros muito diferentes entre si: as comédias populares e os chamados filmes "de arte", dramas de orçamento pequeno e público menor ainda.
As comédias já foram o reino de astros como Paulo Gustavo, Ingrid Guimarães e Leandro Hassum. Mas hoje estão em viés de baixa nas bilheterias, talvez por causa do avanço do streaming.
Já os filmes "cult" permanecem onde sempre estiveram: ganhando prêmios em festivais, conquistando críticas excelentes e atraindo pouca gente às salas. É o caso de títulos recentes como "Marte Um" e "Noites Alienígenas".
Há inúmeros outros gêneros em que o Brasil não tem tradição cinematográfica, como a ficção científica ou as reconstituições históricas. O terror, onde já brilhou Zé do Caixão, vem sendo retomado aos poucos, com resultados díspares. E os filmes de ação ainda são uma seara praticamente virgem para os nossos cineastas.
"Tração", que entra em cartaz no dia 29 de junho, é uma brava tentativa de ocupar esse espaço. O longa de estreia de André Luís, que também integra o elenco, vem sendo anunciado como o primeiro filme nacional ambientado no universo do motocross. Mas as competições são apenas o pontapé inicial da trama, que se diz inspirada pelos "heist movies" (filmes de assalto, em tradução livre) americanos.
O protagonista Ajax (Marcos Pasquim) é o líder de uma equipe de pilotos de motocross, da qual também faz parte sua filha adolescente Isadora (Bruna Altieri). Ambos lidam com a perda recente da mãe da garota.
A trupe é abordada por DiMello, um empresário vivido por Nélson Freitas, que os convida a participar de um torneio cujo prêmio máximo é de US$ 1 milhão, cerca de R$ 5 milhões. Ajax recusa, pois não têm patrocínios, mas o ricaço promete cobrir todas as despesas. A oferta, boa demais para ser verdade, é aceita.
Ajax e sua turma sagram-se campeões, mas, na verdade, caíram numa armadilha. Drogas são plantadas no carro em que viajam e eles vão todos presos. Para se safar, precisarão cometer um grande roubo para DiMello.
A premissa é semelhante à de centenas de filmes que já vimos antes. Mas onde "Tração" derrapa mesmo é na execução. Cenas de luta e perseguição são dirigidas de modo convencional, sem que o pulso do espectador se acelere. Também falta adrenalina à edição, e até mesmo a sonorização deixa a desejar. Socos, tiros e explosões simplesmente não alcançam os decibéis desejáveis.
Os personagens são todos unidimensionais, algo que não chega a ser um problema para esse tipo de filme. Ajax, apesar de atormentado pela morte da esposa, é firme e honesto —e mais nada. Maurício Meirelles encarna Manoel, o suposto alívio cômico. E Nélson, ator de muitos recursos, faz um DiMello tão malvado que só falta roer a unha do dedo mindinho, tal qual o dr. Evil da franquia "Austin Powers".
Salva-se uma cena em que um motoqueiro se lança sobre um precipício, gravada em um cânion de Santa Catarina. Pilotando a moto está o dublê Gabriel Lott, também campeão de wingsuit.
É pouco para quem tiver ido ao cinema em busca de fortes emoções. Por outro lado, "Tração" também é um esforço válido, no sentido de penetrar numa área em que o nosso cinema ainda engatinha. Não foi desta vez que saímos caminhando com altivez, mas um dia chegaremos lá.
Comentários
Ver todos os comentários