Com elenco talentoso e produção pobre, humor de Nóis na Firma não traz novidades
Novo humorístico da Band estreou no último sábado
O humor na TV aberta vive um período esquisito. A Globo deixou de investir no gênero. No lugar do Zorra, extinto em 2020, a emissora vem exibindo episódios antigos de Vai que Cola, produzidos pelo Multishow. Também vêm da TV paga os talk shows Que História É Essa, Porchat?, de Fábio Porchat, e Lady Night, com Tatá Werneck. No entanto, mesmo sem ter programa próprio, um novo talento se impôs no canal: Paulo Vieira, cada vez mais presente no vídeo.
Na concorrência, o riso também anda em baixa. A antediluviana A Praça É Nossa sobrevive no SBT. O Encrenca deixou a RedeTV! pela Band e mudou o nome para Perrengue, mas se manteve praticamente igual. É na Band que também surge a primeira novidade do gênero depois de um certo tempo: Nóis na Firma, que estreou no sábado (3), na faixa das 21h.
Novidade é força de expressão. Nóis na Firma diz buscar inspiração em sitcoms americanas como The Office e Brooklyn Nine-Nine, ambientadas em locais de trabalho, mas suas raízes estão aqui no Brasil mesmo. A rigor, o programa segue a fórmula consagrada da histórico Balança Mas Não Cai, surgida no rádio na década de 1950: um bando de personagens díspares que se cruzam meio que por acaso num mesmo lugar.
O estilo das piadas também é praticamente idêntico: ingênuas, repetitivas, infames. Algumas são tão óbvias que fazem rir só pela cara de pau de existirem.
Há mudanças sutis, é verdade. Pretos, pobres e bichas não são mais o alvo que um dia foram, embora não se possa afirmar que Nóis na Firma adote uma linha progressista. A pegada do programa é tradicional.
A firma do título é a Núcleo de Negócios Familiares, uma empresa de coworking –um pretexto ideal para reunir no mesmo espaço uma galeria de tipos variados. A juntá-los, uma dívida de R$ 10 milhões, assumida depois que todos assinam contratos sem ler e se tornam sócios da NNF.
O elenco conta com pelo menos três lendas do riso brasileiro. No auge de seus 85 anos, Moacyr Franco vive os irmãos Armando e Vando Guerra. O primeiro assume a presidência da NNF, com a missão de salvá-la. O segundo é um vigarista, responsável por atirar a firma no buraco.
Gorete Milagres volta a encarnar a empregada Filó, um dos personagens mais geniais do humor nacional de todos os tempos. E o versátil Marcelo Médici faz o mimado Júnior Filho, o herdeiro da NNF, que age feito criança apesar de já ter passado dos 40 anos.
Mas, no episódio de estreia, quem brilhou foi a cearense Valéria Vitorino, como a espalhafatosa Rossicléa, mulher de Armando. O numeroso elenco fixo ainda conta com a trupe do Café com Bobagem e as ex-panicats Ana Paula Minerato e Arícia Silva.
É uma pena que a produção de Nóis na Firma não esteja à altura de suas estrelas. O cenário é pobrinho: de uma das janelas da firma, vê-se uma grande foto de São Bernardo do Campo, com carros parados. Os figurinos de tons berrantes não alcançam a extravagância pretendida. E a iluminação é chapada, sem sombras nem nuances, dando um clima de 2D às imagens.
Também faltou uma história mais forte. Neste primeiro episódio, o que se viu foi quase um desfile de personagens, em que cada um tentou mostrar a que veio (nem todos conseguiram). Também houve um excesso de ações de merchandising de remédios. Passada esta apresentação, vamos torcer para que cresça a interação entre eles.
Lamentavelmente, ninguém fez graça dos poderosos de plantão. Apesar de não haver mais censura, o humor político desapareceu da TV aberta. Nossos comediantes estão com medo, ou obedecem a ordens de cima?
Apesar dos toques moderninhos, Nóis na Firma segue um estilo antiquíssimo, que cassetas ou portas dos fundos não conseguiram enterrar. Ainda tem quem goste: o programa deu por volta de dois pontos de audiência na estreia, um bom resultado para a Band –ainda mais se levarmos em conta que foi ao ar quase ao mesmo tempo que "Pantanal".
Enquanto isso, a garotada descobre novas formas de ser engraçada na internet e nos shows de stand-up, mas a TV aberta não parece disposta a arriscar. Até quando?
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