'Hoje a gente é mais comentada na sala de jantar', diz Nany People sobre presença trans nas artes
Em espetáculo de humor, atriz ensina público a salvar o casamento e celebra sucesso no palco
Nany People coleciona casos engraçados —e às vezes escatológicos— sobre a vida a dois. Eles são reunidos nas apresentações de "Como Salvar um Casamento", monólogo em cartaz em São Paulo, com meia-entrada para todos. A atriz abre espaço para o público contar histórias ou fazer perguntas, e aí surgem as bizarrices às quais ela reage com humor.
Em um desses casos, a mulher contou que o marido a chamou para um beijo carinhoso no banheiro, após terminar de fazer o número 2, em plena lua de mel. Em outro, o homem usou um sabonete íntimo para lavar o rosto. Há também as típicas disputas de atenção com o futebol e as pequenas implicâncias do dia a dia.
No espetáculo, Nany ri com o público dos altos e baixos da vida a dois. Porém, mantém a crença no amor —e no humor.
"São duas coisas que não saem de moda", diz. "Ou você paga boleto porque está amando alguém, ou paga boleto para o terapeuta porque não está amando ninguém. Já que é para pagar mesmo, que pague tendo", afirma, e acrescenta um palavrão.
"Como Salvar um Casamento" estreou há 16 anos e marcou a volta de Nany ao teatro, após anos de apresentações em casas noturnas LGBTQIA+. Ela encomendou o texto ao comediante Bruno Motta depois de desistir dos espetáculos em boates.
"Quando a droga química entrou na noite, eu vi as pessoas pararem de prestar atenção no show", explica. "Vi que alguma coisa estava acontecendo e não era mais pertinente eu estar ali."
Muita coisa mudou na sociedade entre as primeiras apresentações, há quase duas décadas, e a remontagem, em 2024. A peça foi escrita para um casal heteronormativo e virou monólogo. Nany acrescentou pronomes neutros e, agora, aborda o amor levando em conta as múltiplas possibilidades de relacionamento.
A artista falou com o F5 em Goiânia, horas depois da apresentação de "Como Salvar um Casamento" no Teatro Gazeta, em São Paulo. Viajou sem dormir e teve que arrumar a mala no escuro —em noite de apagão na Bela Vista, região central da capital. No dia seguinte, iria para Brasília para mais uma apresentação.
Ela percorre o país com quatro espetáculos solos —além de "Como Salvar um Casamento", apresenta "Deu no que Deu", "Sob Medida - Nany canta Fafá" e "Nany É Pop". Na TV, participa do Caldeirão do Mion e acabou de gravar mais uma temporada do "Vai que Cola". Também faz cinema e terá apresentações teatrais fora do Brasil.
É dura a vida da bailarina, porém, vale a pena, diz. A atriz conta ser perita em "fazer do limão, uma limonada" e, quando estrelava shows em casas noturnas, chegou a comprar três apartamentos. Na época, realizava até sete apresentações por noite.
Nany é do tipo que faz acontecer. Para viabilizar "Como Salvar um Casamento", por exemplo, conta com o patrocínio de produtos para emagrecer, que divulga no palco. Também vende leques temáticos no saguão dos teatros.
"Não vou esperar a Avon, a Natura, um musical, uma novela me chamar. Amor, se for assim eu não faço nada."
Ela cita um conselho que ouviu de Paulo Gustavo sobre garantir as próprias produções para ter trabalho. E conta ter três grandes inspirações de atrizes-produtoras: Dercy Gonçalves, Bibi Ferreira e Fernanda Montenegro.
Na linha de shows da TV brasileira há 30 anos, Nany foi repórter do Comando da Madrugada, de Goulart de Andrade, na Manchete; trabalhou como Amaury Jr. no programa Flash; e atuou ao lado de Hebe Camargo, também como repórter, no SBT. Além disso, participou da terceira edição de A Fazenda, na Record, e do programa da Xuxa, na mesma emissora, entre outros programas.
Marcos Paulo, personagem na novela "O Sétimo Guardião", da Globo, em 2018, contribuiu para o reconhecimento como atriz. "O fato de ter feito a primeira novela aos 54 anos veio em um momento de reconhecimento de trabalho", destaca. "Eu cheguei sabendo quanto vale o meu passe."
Nany cita artistas como Divina Valéria e Rogéria para falar sobre a presença histórica de mulheres trans na cena artística. Mas admite que, atualmente, a visibilidade é maior. "Hoje a gente é mais comentada na sala de jantar", diz. "Hebe Camargo é uma das responsáveis por isso. Ela me apresentou para a sociedade brasileira", afirma Nany.
Casada há oito anos, ela faz acontecer também no casamento. "Já fiz o boy viajar 300 km para me encontrar em Goiânia", conta. "A pele está em dia, muito obrigada. Sou uma mulher apaixonada."
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