Renato Kramer

Marília Pêra: uma das maiores 'Damas da TV'

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O Canal Viva reprisou na última terça-feira (1º) o depoimento que a grande atriz Marília Pêra (1943-2015) deu para a série "Damas da TV".

Marília contou que começou na televisão com a primeira versão de "A Moreninha" (1965), mas que estourou mesmo para o Brasil quando viveu a Shirley Sexy em "O Cafona" (1971).

"Foi um susto, porque eu andava na rua e tinha uma multidão que vinha atrás. Foi a primeira vez que eu me deparei com o sucesso popular. A Shirley era muito engraçada", lembra a estrela.

E Marília fala sobre fazer televisão: "O ator brasileiro tem que fazer telenovela, tem que estar na teledramaturgia de alguma maneira, porque é uma vitrine enorme e é um exercício também. Aprende-se muito na televisão", afirma.

Mas faz a ressalva: "Não há talvez o espaço para a criatividade que tem no teatro ou no cinema, porque há uma pressa, e tem muita gente que manda, mas é importantíssimo. Eu adoro o veículo televisão, gosto de estar na televisão", diz a grande atriz.

E dá a dica de como construía seus personagens: "Nada acontece se eu não souber como ela anda, como ela senta, qual é a cor do cabelo, como ela gesticula. Para mim, essas coisas são mais importantes do que a psicologia do personagem", explica uma das maiores atrizes que o Brasil teve.

"Depois eu gosto muito quando um diretor bom me preenche com dados sobre a psicologia do personagem. Durante um tempo eu dizia que eu era fútil, porque minhas colegas todas pensavam na importância da psicologia do personagem, como ele se colocava socialmente e tal, e eu: 'como é que ela senta? De que cor é a unha dela?'", conta e dá risada.

Mas explica: "É uma coisa de pintura. Enxergar isso para mim é importantíssimo", repete Marília, que conta por que precisou se afastar um pouco da televisão. "Eu tinha feito três novelas seguidas e veio a 'Supermanoela' (1974), aí eu dei defeito", relembra a super atriz.

"Então pedi muito para sair, para romperem o meu contrato, porque eu precisava descansar. Foram quatro novelas seguidas", relata Marília. "Isso de alguma forma ocasionou o meu afastamento longo da Rede Globo", reflete a estrela.

E conclui: "Tomando distância, agora eu percebo que talvez eles tenham investido em mim como a mocinha (protagonista) daquele começo da Globo. E eu não tive resistência física para suportar quatro novelas seguidas. Foi um afastamento longo que só terminou quando o [diretor] Roberto Talma me convidou pra fazer 'Brega e Chique' (1987)", relembra.

Marília conta que hesitou em aceitar o convite de Talma, e quem muito a incentivou foi Nelson Motta, pai do Nelsinho (Motta Filho), seu ex-marido. "Ele dizia pra mim: 'querida, você precisa renovar o seu público'. E 'Brega e Chique' acabou sendo uma novela que eu adorei fazer", confessa.

E deu a dica: "Você não pode me chamar para protagonizar uma obra e depois querer colocar o nome de outra pessoa na frente do meu. Essas coisas para mim foram ponto de honra a vida toda. Como eu sou sempre protagonista no teatro, porque na televisão eu não seria?", argumenta a atriz que viu seu pai morrer pobre depois de dedicar sua vida inteira ao teatro. "Não tínhamos dinheiro nem para o caixão", diz Marília.

"O ator não tem poder nenhum na televisão. O autor tem que escrever para o seu personagem, o diretor tem que focar o que você está fazendo, senão não importa se você está bem ou não, e o editor ainda pode cortar. É como ganhar na Mega-Sena", diz a estrela com humor.

Marília fala com carinho da sua relação com Miguel Falabella. "Ele tinha uns 18 anos quando foi à minha casa e me intimou a dirigir uma peça da Maria Clara Machado: 'A Menina e o Vento'. Ele é ator, diretor... Ele é mau também, ele é bruto às vezes, ele grita, mas ele é tão doce, tão meigo, tão querido. Acho que eu conheço muito bem o Miguel, e ele me conhece muito bem", declara a diva.

Falando dos seus então 70 anos, a atriz desabafou: "Quando você pensa no número é pesado à beça. É muito tempo 70 anos, mas em cena, quando eu fico correndo para lá e para cá, e o bailarino me leva lá em cima e me traz aqui embaixo, eu penso que sou bailarina, que tenho 20 anos. Nem conheço uma pessoa de 70 anos que trabalhe o que eu trabalho."

Para encerrar, Marília Pêra declara: "Eu não sei nem se eu vou durar mais dez ou quinze anos ou se eu morro amanhã, mas eu como pouco, como cada vez menos quantidade, não como mais carne, como muito grão, soja, vitaminas. Tomo vinho, adoro vinho. Faço exercícios todos os dias, alongamento. Tem que fazer. Eu já fazia quando tinha 11 anos. Eu mais ou menos continuo fazendo tudo o que eu fazia quando eu tinha 11 ou 12 anos e trabalhando muito". E já nos fazendo tanta falta.

Renato Kramer

Natural de Porto Alegre, Renato Kramer formou-se em Estudos Sociais pela PUC/RS. Começou a fazer teatro ainda no sul. Em São Paulo, formou-se como ator na Escola de Arte Dramática (USP). Escreveu, dirigiu e atuou em diversos espetáculos teatrais. Já assinou a coluna "Antena", na "Contigo!", e fez críticas teatrais para o "Jornal da Tarde" e para a rádio Eldorado AM. Na Folha, colaborou com a "Ilustrada" antes de se tornar colunista do site "F5"

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