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X de Sexo Por Bruna Maia

Broxaço: os golpistas e a saudade da dita dura, época em que o pau deles ainda subia

O que vimos em Brasília foi um show de masculinidade decadente

Estrutura falica inflável durante atos na paulista, no 7 de setembro
'Um Míssil para Explodir Brasília', de Frederico Ravioli, Renzo Comolatti, Ingrid Fernandes, Leonardo Zeine e Laura Viana - Divulgação
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Os terroristas que invadiram o congresso têm a alma broxa, e provavelmente o pau também. Tudo bem se seu pau não sobe na hora de trepar, o corpo é todo sexual e dedos e línguas movem montanhas. Mas é que para essas pessoas um pau duro é a única expressão masculina possível. Um vídeo que circulou por aí de um golpista dizendo que havia encontrado um dildo no gabinete de Alexandre de Moraes é representativo dessa fixação.

Vou emprestar termos da psicanálise, um campo que critico muito mas que trouxe bons alguns insights sobre a humanidade (e vários totalmente equivocados). Os fascistas têm pulsão de morte, e não pulsão de vida. São reprimidos que só têm alguma satisfação reprimindo os outros. A libido humana não é apenas sexual – ela é afetiva, artística, lúdica, comunitária e mais um tanto de coisas, inclusive violenta.

E o recalque de todo desejo que não seja a violência leva a cenas como as que vimos essa semana. Uma sociedade que não encara o que sente de frente, nem o amor, nem a origem real da raiva, nem o erotismo, é uma sopa primordial de ressentidos que querem impor seu ressentimento ao resto do mundo.

No que vamos ao assunto da piroca. Já disse aqui que está tudo bem exaltar o próprio pau em um contexto de alegria e comemoração, sem assédio, como no caso do goleiro da Argentina após ser campeão. Mas a centralidade do pau literal* (a piroca física e tangível) e do pau metafórico (símbolo do poder) é um dos elementos desse desespero por autoridade e opressão.

Explico-me. Muitos dos que estão ali são homens brancos que têm nostalgia da ditadura e da dita dura (desculpem o trocadilho). É uma saudade do tempo em que o pau deles ainda levantava, do tempo em que não precisavam de viagra e do tempo em que eles se consideravam protagonistas da história. Eram esses homens que pautavam as políticas públicas, a vida privada e a política sexual. O desejo de todo mundo era construído em torno da satisfação deles.

Não à toa surgiu no Twitter a expressão "broxaço" para se referir ao ataque terrorista recente. Dos 763 fascistas antidemocráticos que foram presos, 494 são homens, 330 deles com mais de 40 anos. Ou seja, nascidos e crescidos num período em que eram o centro de tudo – do mercado de trabalho, do poder, do casamento, do sexo.

Mas esse tempo vem chegando ao fim. O clitóris está sendo cada vez mais exaltado, as pessoas trans e seus corpos que desafiam a norma estão gritando, os veados e as sapatões estão se amando na rua. O falo do homem dominante está perdendo significado simbólico – e ereção. Aquilo ali foi um show de masculinidade decadente. Acontece. Depois de todo movimento revolucionário, vem uma reação daqueles que vão perdendo espaço e é aí que não podemos recuar.

E como explico a presença de 269 mulheres no meio de um espetáculo falocêntrico? Elas viveram a vida nesse mundo, construíram a existência em volta da heteronormatividade, do casamento, da maternidade. Você chuta essas bases e quem se apoia nelas se desequilibra.

É extremamente simbólico que os terroristas fascistas tenham destruído obras de arte. A arte é uma das mais autênticas expressões das pulsões humanas, ela extravasa aquilo que amamos e odiamos. Pode ser lúdica, divertida, perturbadora. A arte não é uma sublimação da libido sexual, a arte é uma manifestação humana que se sustenta em si mesma. Ou melhor, deveria se sustentar. Estou falando da arte que emana de nossa humanidade, e não de qualquer picaretagem feita para lavar dinheiro de rico, como é boa parte do que se convencionou chamar de arte hoje em dia.

Um Portinari é uma força da natureza. Custa milhões, mas poderia custar nada e continuaria tendo um valor incalculável. Portinari é verdade. Djanira é verdade. Tem mais verdade em um Di Cavalcante do que em todas as notícias consumidas por aqueles fascistas nos últimos cinco anos. E essas pessoas odeiam a verdade. Elas odeiam a arte, odeiam o amor e também odeiam o sexo.

Podem até gostar daquele sexo protocolar, mas odeiam o sexo transcendente, que envolve o corpo todo e faz todo mundo feliz. Essas pessoas gozam no desprazer, no ódio, na destruição. Não sou utópica de dizer que nossa atitude quanto a isso tem que ser mais amor, mais prazer. A revolução precisa necessariamente envolver essas coisas, mas também tem que contar com a razão, a lei e o combate. Essa combinação vai nos salvar das trevas, e aí sim vai salvar o gozo.

X de Sexo por Bruna Maia

Bruna Maia é escritora, cartunista e jornalista. É autora dos livros "Parece que Piorou" e "Com Todo o Meu Rancor" e do perfil @dabrunamaia nas redes sociais. Fala de tudo o que pode e do que não pode no sexo.

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