Série sobre a Turma do Balão Mágico enfatiza o alto astral e pega leve com os dramas
Quem for ver esperando escândalos e lavagem de roupa suja vai se decepcionar
O início da década de 1980 foi um momento efervescente para a cultura brasileira. Em seus últimos estertores, a ditadura militar promoveu um processo de abertura, anistiando presos políticos e aliviando a censura. O resultado foi a estreia nos cinemas de filmes até então proibidos, novelas cada vez mais ousadas e a explosão do rock nacional, com dezenas de novas bandas.
A renovação na cena pop inaugurou um novo nicho de mercado: o infantojuvenil. Até então, não existiam artistas voltados especificamente para esse público. Música para crianças eram as tradicionais cantigas de roda e as canções de disquinhos com contos de fadas.
O fenômeno não nasceu no Brasil. Na Europa ocidental, especialmente na Itália e na Espanha, faixas destinadas ao segmento infantil galgavam as paradas de sucesso. Foi então que Tomás Muñoz, o presidente espanhol da filial brasileira da gravadora CBS, quis trazer essa ideia para cá.
Foi assim que surgiu a Turma do Balão Mágico, que durou apenas quatro anos, de 1982 a 1986. Mas o grupo teve um impacto tão grande e marcou de tal maneira toda uma geração que, quatro décadas depois, ele tem sua história contada na minissérie documental "A Superfantástica História do Balão", dirigida por Tatiana Issa, cujos três episódios chegaram nesta quarta (12) à plataforma Star+.
A campanha de lançamento do programa tentou carregar nas tintas, exagerando sua carga dramática. Um promo em que Jair Oliveira, integrante do Balão entre 1984 e 1986, dava a entender que não gostava mais de ser chamado de Jairzinho, foi tirado do ar, a pedido do próprio artista.
O reencontro entre os quatro membros da formação clássica, que incluía também Simony, Mike e Tob, também prometia uma certa lavagem de roupa suja. Mas o que se vê na tela são muitos abraços, algumas lágrimas e demonstrações de afeto genuíno.
O primeiro episódio, "Também Quero Viajar Nesse Balão", conta como os quatro foram recrutados pela CBS. Mike era o único sem um background musical: filho de Ronald Biggs, que fugiu para o Brasil depois de participar no Reino Unido de um grande assalto a um trem, o garoto se destacou por causa dos depoimentos dados à TV em que pedia a libertação do pai, que o governo britânico tentou sequestrar.
Os dois primeiros anos do Balão parecem ter sido realmente mágicos. A princípio um trio, a trupe recebe Jairzinho a partir do segundo álbum, e estoura no país inteiro com "Superfantástico", gravada com Djavan. A venda de milhões de discos atrai a atenção da Globo, que cria um programa matinal e diário para o grupo. Mas o episódio termina sugerindo que vêm problemas por aí, causados pela troca da compreensiva empresária Mônica Neves pelo ganancioso Paulo Ricardo.
Só que esses problemas não são esmiuçados no capítulo seguinte, "Mãe, Me Dá um Dinheirinho". Depoimentos dos integrantes, de executivos da CBS e de grandes nomes da TV como Boni e Nilton Travesso deixam claro que as crianças trabalhavam demais, cumprindo uma exaustiva agenda de shows, mas não eram exatamente exploradas. Todo mundo ganhou bastante dinheiro.
Falta um pouco de drama à série. Problemas com drogas? Mike assume que fumou seu primeiro baseado aos 11 anos de idade, mas jamais se tornou um viciado. Assédio moral? O conceito nem estava em circulação àquela época. Quem for assistir "A Superfantástica História do Balão" esperando escândalos irá se decepcionar.
"Quando Fica Grande", o episódio final, mostra o inevitável fim do grupo. Até tentaram transformar o Balão Mágico numa espécie de Menudo, em que os membros que atingem uma certa idade são substituídos por outros mais jovens, mas a ideia não vingou. Ricardinho, que entrou no lugar de Tob, mal aparece, e não foi entrevistado.
A série também deixa um pouco a desejar quando se propõe a mostrar como estão hoje os quatro membros clássicos do Balão. Não há nenhuma menção à luta contra um câncer que Simony vem travando –talvez por imposição da própria cantora? A carreira atual de Jairzinho, que atualmente vive nos EUA, também é pouco esmiuçada.
Tob e Mike não trabalham mais com música: o primeiro virou artista plástico, o segundo é madeireiro. Mas suas personalidades continuam intactas. Tob –ou Vimerson Canavillas, seu nome de batismo– segue sendo introvertido, enquanto Mike ainda é o mais articulado e desinibido de todos.
Salpicada por depoimentos de fãs famosos como Lázaro Ramos, Rodrigo Fagundes e Wendell Bendelack, "A Superfantástica História do Balão" tem vários momentos emocionantes, e é plenamente bem-sucedida na missão de registrar a importância que o grupo teve, e ainda tem, para milhões de brasileiros. Mas a série também tem algumas lacunas, além de passar a sensação de que detalhes sórdidos acabaram ficando de fora.
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