Condenação de Zeca Camargo pode ter consequências terríveis
Sou amigo de Zeca Camargo há mais de 35 anos. Fomos colegas de faculdade, trabalhamos juntos na televisão e somos próximos até hoje.
Mas não é só como amigo dele que eu escrevo esta coluna. Assim como milhares de pessoas que não conhecem o jornalista pessoalmente, também estou pasmo com a sentença da juíza Rozana Fernandes Camapum, da 17ª Vara Cível de Goiânia, publicada nesta terça (23) no Diário da Justiça de Goiás.
Zeca foi condenado a pagar R$ 30 mil ao pai de Cristiano Araújo e outros R$ 30 mil aos empresários do cantor, que morreu num acidente de carro em junho de 2015, ao lado da namorada, Allana Coelho Pinto de Moraes.
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O apresentador do "É de Casa" (Globo) também foi condenado a pagar as custas do processo e os honorários de todos os advogados. Mas isto foi apenas a primeira instância: Zeca já avisou que irá recorrer da decisão.
Com todo o respeito às partes envolvidas e à Justiça brasileira, discordo frontalmente desse veredicto. Zeca não ofendeu ninguém. Nem manifestou qualquer juízo de valor sobre a obra de Cristiano Araújo no editorial que ele próprio leu na edição do "Jornal das Dez" (GloboNews) do dia 29 de junho de 2015, cinco dias depois do acidente que matou Cristiano Araújo.
Em 25 de junho de 2015, quase todas as emissoras de TV aberta derrubaram suas programações vespertinas para cobrir a repercussão da morte do cantor —inclusive a Globo, calejada pela perda de audiência em eventos anteriores de teor semelhante.
Essa cobertura maciça intrigou muita gente, pois Cristiano Araújo não era um nome de expressão nacional. Ainda estava no começo da carreira e seu repertório, como é comum entre os intérpretes do sertanejo, compartilhava muitas músicas com outros cantores.
Só que, na época, o simples fato de desconhecer quem era o rapaz soou como insulto aos fãs dele e do gênero.
E, pelo jeito soa até hoje, como a própria juíza escreveu em sua decisão: "O momento foi extremamente inadequado, já que não respeitou o luto da família e empresário e lida quatro dias após a data do falecimento, o que provocou uma dor maior e humilhação pública da família pelo desprestígio que impôs a pessoa do falecido cantor, principalmente quando perguntou 'Mas, Cristiano Araújo?' --para o fim de deixar claro que ele não era merecedor da comoção nacional e de grandes funerais públicos".
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Então o Zeca cometeu o crime de errar no timing? Ele pode ter sido inábil ou até mesmo indelicado, mas merece pagar R$ 60 mil por isto?
Este caso pode abrir um precedente gravíssimo. Críticas negativas, que já são chamadas de preconceito e até de incitação ao ódio por quem se sente atingido por elas, agora podem ser passíveis de ações cíveis.
Fora que —reitero mais uma vez— Zeca não criticou em nenhum momento a música ou os fãs de Cristiano Araújo. Apenas questionou o exagero midiático que se seguiu à morte de um artista pouco conhecido. Questionou, inclusive, a postura da própria Globo, a emissora onde trabalha até hoje.
Mas a comoção pelo desaparecimento de um rapaz tão jovem criou um clima de caça às bruxas, como se Zeca Camargo fosse o maior culpado pela tragédia. O apresentador tornou-se um vilão até maior do que o motorista Ronaldo Miranda, finalmente condenado por homicídio culposo (sem intenção de matar) há alguns dias.
O processo ainda não terminou, e pode se arrastar por mais algum tempo. Esperemos que, na próxima instância, haja menos subjetividade envolvida e mais racionalidade. As consequências para a cultura brasileira —e até para a liberdade de expressão— podem ser terríveis.
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Cristiano Araújo morreu em acidente de carro em junho de 2015, e não em julho. Além disso, o correto é ações cíveis, não penais.
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