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Zapping - Cristina Padiglione

'Terra e Paixão' tem 10 motivos para superar 'Travessia'

Conheça os elementos que fazem da nova novela da Globo um alvo mais atraente que sua antecessora

Cauã Reymond, Barbara Reis e Johnny Massaro , em Terra e Paixão
Cauã Reymond, Barbara Reis e Johnny Massaro formam o trio central de 'Terra e Paixão', nova novela das nove da Globo - Reprodução Globo
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São Paulo

"Travessia", de Glória Perez, terminou melhor do que começou, mas era previsível que o público tomasse um banho de água fria após a comoção experimentada em torno de "Pantanal", que fez a Globo voltar ao patamar dos 30 pontos de audiência. A trama de Glória Perez passou a maior parte de sua exibição perto dos 25 pontos, às vezes menos que isso, às vezes mais -principalmente nos últimos dois meses, tanto na Grande São Paulo quanto no PNT, o Painel Nacional de TV que reúne as 15 regiões metropolitanas de maior consumo do país, na medição da Kantar Ibope Media.

A direção da Globo espera no mínimo retomar com "Terra e Paixão", novela que estreia nesta segunda-feira (8), o nível dos 30 pontos alcançados por "Pantanal". Não é à toa a volta do cenário rural ao horário, ainda que agora o tom esteja mais próximo de um agro pop e tec, como diz aquela campanha apoiada há décadas pela emissora.

Entenda, em dez itens, por que "Terra e Paixão", de Walcyr Carrasco, merece mais crédito que "Travessia", considerando o início das duas histórias.

1) Antes de mais nada, a trama de Carrasco exibe uma síntese que a de Glória Perez não tinha. Quando se pergunta sobre o que é a história, era impossível explicar o enredo de "Travessia" em menos de dez linhas ou de uma única linha de raciocínio. Já o diretor artístico Luiz Henrique Rios sintetizou em uma frase a resposta para esta mesma pergunta no caso de "Terra e Paixão": "É uma história sobre a busca de justiça", disse ele durante a festa de lançamento da novela, no Rio.

É isso. Aline, a mocinha que faz de Barbara Reis a segunda negra protagonista de uma novela das nove na Globo [Taís Araújo foi Helena de Manoel Carlos e também uma das principais personagens de 'Amor de Mãe', mas o eixo central ali era mesmo Dona Lurdes, de Regina Casé] brigará para vingar a morte do marido e se revelará uma fazendeira e tanto, papel em que nem ela mesma se reconhecia, com enfrentamento aberto ao seu antagonista, vivido por Tony Ramos.

A simplicidade do script conspira a favor de sua chegada ao coração da audiência.

2) As novelas rurais apresentam risco de fracasso inferior ao de novelas urbanas, como confirmou a esta colunista o diretor da TV Globo, Amauri Soares. O diagnóstico é corroborado por números de audiência.

Além de todo mundo trazer um pouco de barro na sola dos pés, tendo origem ou ancestrais fincados no interior do país, o cenário funciona como um escapismo para um público localizado em grandes centros urbanos, onde são mensurados os índices de audiência.

Imagens bucólicas de gado e o verde a perder de vista das plantações latifundiárias, ou mesmo da agricultura familiar, podem levar para longe o estresse de um telespectador que quer descanso ao fim de sua jornada de trabalho.

3) Embora os dramaturgos defendam, em geral, que a boa ficção é feita da dubiedade de seus personagens e do jogo entre certo e errado com 50 tons de cinza, Carrasco tem provado fôlego com novelas onde mocinho é mocinho e vilão é vilão, preto no branco, sem deixar muita margem para dúvidas.

Não corremos o risco de ver Cauã Reymond, apresentado como o herói injustiçado pela madrasta no começo da história, se tornar malvado em poucos capítulos, como aconteceu com Chay Suede em "Travessia".

O maniqueísmo tem sido forte aliado de Carrasco em seus hits de audiência. Com tamanha polarização política, surpresas e decepções trazidos pelos noticiários sobre a vida real, consta que o grande público quer mais é ver uma novela em que ele saiba exatamente o que esperar de cada personagem.

4) Aliado ao maniqueísmo, Carrasco também dispensa pudores para carregar as tintas em clichês que rapidamente sejam compreendidos pela massa. É hábil na maneira de preparar o espectador para ganhar sua torcida na hora de quebrar tabus, como o beijo gay de "Amor à Vida" e o suicídio de "Verdades Secretas". Mas, para tanto, aposta em diálogos que já chegam mastigados ao espectador, poupando-lhe maior esforço intelectual para entender seu enredo.

5) A rivalidade entre irmãos (Cauã Reymond x Johnny Massaro), ainda que involuntária, aguçada pelo interesse em comum pela mesma mulher, é um clichê até aqui infalível no histórico de folhetins.

6) Oriunda sobretudo do interior e do nordeste, a larga audiência da Grande São Paulo, maior mercado consumidor do país, normalmente se vê melhor representada nesse sotaque caipira vigente em "Terra e Paixão" do que no acento carioca.

7) A química entre Tony Ramos e Glória Pires já foi testada e retestada em novelas e filmes de grande bilheteria, tendo agora a presença de Susana Vieira para aguçar conflitos entre o casal. É uma trinca de medalhões que faltou a "Travessia", onde um dos créditos mais respeitados, Cássia Kis, acabou se destacando mais pelo que fazia fora da novela.

8) Não teremos um(a) influenciador(a) ou ex-BBB caindo de paraquedas no ofício de ator ou atriz, em pleno papel de destaque em uma novela das nove, despertando uma falsa atenção sobre a trama por parte de quem só aparece diante da TV para verificar se o(a) novato(a) tem futuro ou não, como aconteceu com Jade Picon.

Aliás, por falar em fazer justiça, convém sublinhar que a moça tem muito a aprender, evidentemente, mas terminou "Travessia" com dignidade e longe de se enquadrar na categoria Cigano Igor de atuação.

9) Chitãozinho e Xororó na abertura é um convite ao karaokê coletivo, e a parceria com Ana Castela, melhor tradução atual de que o agro é pop, pode ajudar a arrastar para a frente da TV um público jovem que descobriu o prazer em ver novela com "Pantanal". Convém reparar que, como em "Travessia", a abertura se dedica a uma regravação de canção conhecida de décadas atrás, mas o sertanejo tem apelo ainda imbatível nos rankings de rádios e plataformas de streaming.

10) Ao contrário de Glória Perez, que encontrou um público saudoso da novela anterior, e portanto em estado puro de ressaca emocional, Carrasco entra em cena sob o alívio de uma história que enfrentou toda a implicância da crítica e dos noveleiros que movimentam o Twitter.

Zapping - Cristina Padiglione

Cristina Padiglione é jornalista e escreve sobre televisão. Cobre a área desde 1991, quando a TV paga ainda engatinhava. Passou pelas Redações dos jornais Folha da Tarde (1992-1995), Jornal da Tarde (1995-1997), Folha (1997-1999) e O Estado de S. Paulo (2000-2016). Também assina o blog Telepadi (telepadi.folha.com.br).

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