Defesa de atrizes que denunciaram racismo na Globo reage a entrevista de diretor
Advogados de Dani Ornellas e Roberta Rodrigues atribuem a Vinicius Coimbra 'desastrosa' proposta de reparação; OUTRO LADO: diretor nega e diz que iniciativa partiu deles
Onze dias após a publicação de uma entrevista com o diretor de TV e cinema Vinicius Coimbra por esta coluna, os advogados das atrizes Dani Ornellas e Roberta Rodrigues se manifestam sobre episódios citados pelo entrevistado. Mensagem enviada por e-mail na sexta-feira (10), pela assessoria de imprensa da equipe jurídica, reproduz nota que afirma que os profissionais alegam terem sido "surpreendidos com a matéria".
Não é verdade. O advogado Jeff Amadeus foi procurado pela colunista no dia 23 de fevereiro, por orientação das atrizes, consultadas inicialmente, e conversou com esta colunista ao telefone e também por meio de mensagens no WhatsApp, tendo confirmado o recebimento do conteúdo da entrevista, enviado por e-mail, para dar às atrizes o direito de se manifestar a respeito.
Na ocasião, após acenar com a perspectiva de reagir às declarações do diretor, Amadeus pediu que a mesma assessoria de imprensa enviasse uma nota no dia 24 de fevereiro com o seguinte texto: "Medidas Jurídicas estão sendo tomadas e no momento oportuno nos pronunciaremos. Subscrevem esta nota os advogados Djeff Amadeus, Lorena Martins, Gustavo Proença e Carol Bassin."
Coimbra foi alvo de investigações internas na Globo após denúncias de racismo nos bastidores da novela "Nos Tempos do Imperador", da qual era diretor artístico. Ele foi demitido pela emissora sob alegação de ter praticado assédio moral.
Na entrevista, Coimbra reconhece erros como o fato de ter criado um grupo de WhatsApp só com atores negros para debater e ouvir as demandas desses profissionais, tendo depois sido alertado que essa discussão deveria estar ao alcance de todo o elenco e equipe da novela, o que disse ter feito.
O diretor afirmou ainda que muitas das queixas apresentadas pelas atrizes não eram atribuições suas dentro da estrutura da Globo, mas disse que se desculpou pela parte que, na sua percepção, lhe caberia nos danos causados a elas. Coimbra contou que houve uma tentativa de negociar o pagamento de indenização proporcional a sua parcela de culpa na condução das reivindicações das atrizes, mas não houve acordo.
Abaixo, a coluna reproduz o posicionamento enviado na sexta (10) pela assessoria de imprensa dos advogados de Roberta Rodrigues e Dani Ornellas, duas das três atrizes --a terceira foi Cinnara Leal-- que denunciaram ao departamento de compliance da Globo a prática de racismo nos bastidores da novela.
"1. O Sr. Vinicius Coimbra, através do seu advogado, nos procurou no dia 04 de março de 2022.
2. Acreditando nos pilares da justiça colaborativa e restaurativa, preceitos inclusive do CNJ, realizamos, na condição de representantes constituídos, diversas reuniões com o advogado representante do Sr. Vinicius e uma reunião presencial com o próprio Vinicius Coimbra e seu advogado.
3. Em nenhuma das reuniões as nossas clientes, Dani Ornellas e Roberta Rodrigues, estiveram presentes, a pedido das mesmas.
4. Partiu do Sr. Vinicius Coimbra, através de seu advogado, uma proposta de reparação; que, de praxe, inclui cláusula de Confidencialidade para ambas as partes caso haja acordo. Em outras palavras: silêncio.
A referida proposta foi repassada para nossas clientes na época como uma tentativa desastrosa e aviltante de reparação. Diante de todo o contexto vivenciado por Dani e Roberta, cujos efeitos nocivos à saúde emocional e mental ainda se perpetuam.
A proposta, portanto, não foi aceita e não mais foram feitas tratativas. Em realidade a própria tentativa frustrada de acordo diante de tal proposta, tornou-se mais um episódio de dor.
5. O silêncio sobre a proposta foi um ato de respeito motivado pela consciência de que era importante aguardar a assimilação de mais esse episódio traumático vivenciado por nossas clientes que tiveram que reviver toda a dor sem vislumbrar um caminho justo e razoável de reparação.
6. A investigação pelo MPT [Ministério Público do Trabalho, que investiga a conivência da TV Globo com suposto racismo] foi iniciada e segue os seus devidos trâmites e em nada estava vinculada à proposta feita pelo sr. Vinicius Coimbra, ao contrário do que a matéria possa ter deixado a entender.
7. Desde as gravações da novela nossas clientes não mais falaram com o Sr. Vinicius pois estão, ainda, em tratamento psicológico e psiquiátrico em razão de tudo que viveram.
8. Destacamos ainda que desde que tomamos ciência da questão envolvendo nossas clientes Dani Ornellas e Roberta Rodrigues, o Sr. Vinicius em diversas ocasiões buscou contato com nossas clientes, mandando mensagens de texto e áudio, algumas inclusive com teor de pedido de ajuda e até mesmo desculpa.
9. Portanto; a matéria veiculada no dia nos causa estranheza e nos compele a publicar a presente nota, como representantes das atrizes que estão comprometidas com a verdade, e como forma de contribuir com a conscientização e o combate ao racismo estrutural e estruturante."
A reportagem publicada no dia 27 de fevereiro em nenhum momento vincula a investigação do MPT às tentativas de reparação de danos mencionada pelo diretor na entrevista, como afirmam aqui os advogados.
OUTRO LADO
Consultado novamente agora, frente à reação enviada pela assessoria de imprensa dos advogados de Dani Ornellas e Roberta Rodrigues, o diretor Vinicius Coimbra nega que a proposta de indenização tenha partido dele.
"Em resposta à afirmação de que partiu de mim a proposta de reparação financeira, venho dizer que isto não é verdade e está provado pela contraproposta que enviamos em 05 de maio de 2022, em documento timbrado. Nunca contestado.
Nele, citamos o pedido de reparação financeira feito pelos advogados (na ocasião ainda das três atrizes), mais de um mês antes, em reunião presencial no dia 24 de março 2022, com um valor que estava muito acima das minhas possibilidades. O pedido era uma pré-condição para chegarmos a uma conciliação.
Evitamos fazer uma contraproposta, sinalizamos que havia uma discrepância profunda de compreensão dos fatos e danos a mim associados, de sorte que não a apresentaríamos, sob pena de soar até mesmo ofensiva, diante da expectativa inicial.
Mas após algumas conversas e tentativas de aferimento das minhas responsabilidades, separadas das que eram atribuídas à empresa, fizemos uma contraposta que julgamos proporcional, que estava de acordo com a jurisprudência brasileira em casos de danos morais (percebidos por eles como não intencionais), mas que não foi aceita.
Estes são os fatos, corroborados por provas.
Insisto que difamação, fake news e calúnias sem provas, testemunhas ou o devido processo legal, são passíveis de responsabilidade civil por danos, podem devastar pessoas, famílias, e não contribuem, a meu ver, para a reparação das injustiças sociais."
Confira aqui a publicação da entrevista com Vinicius Coimbra em 27 de fevereiro.
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