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Cinema e Séries
Descrição de chapéu The New York Times Televisão

'The Last of Us' encerra primeira temporada consolidando trajetória ascendente de seu criador

Craig Mazin era roteirista de franquias como 'Todo Mundo em Pânico' e 'Se Beber, Não Case!' antes de migrar para o drama e se tornar um dos 'showrunners' mais badalados de Hollywood

Bella Ramsey e Pedro Pascal em cena da 1ª temporada da série 'The Last of Us' - Divulgação/HBO Max
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John Koblin
The New York Times

Craig Mazin estava pronto para uma mudança. Cerca de uma década atrás, ele tinha estabelecido uma carreira sólida como roteirista de comédia. Embora os seus créditos dificilmente conquistassem elogios da crítica –"Todo Mundo em Pânico 3" e "Todo Mundo em Pânico 4", assim como a segunda e terceira partes da trilogia "Se Beber, Não Case!"—, os executivos de Hollywood continuavam a procurá-lo para novos projetos. Era um trabalho estável e lucrativo.

Mas ele sentia falta de alguma coisa. "Muito daquilo que eles me ofereciam eram coisas do tipo ‘precisamos de alguém para consertar isso’", Mazin recordou em uma entrevista no final do mês passado. "Ou, precisamos de alguém para melhorar esse filme de uma nota C+ para um B-."

Por fim, ele chegou à conclusão de que era um profissional "melhor do que o trabalho que estavam me oferecendo", disse. Esse foi o primeiro passo crucial naquilo que se tornaria uma ascensão notável de meio de carreira. Durante os últimos quatro anos, Mazin, 51, comandou duas séries de sucesso da HBO e se transformou, de roteirista de comédia, em um dos "showrunners" mais quentes no plantel das grandes redes de TV a cabo.

O mais recente esforço de Mazin, "The Last of Us", adaptação para a HBO de um videogame que gira em torno do apocalipse, foi um sucesso imediato. A rede anunciou que a primeira temporada do programa, que estreou em janeiro, tem média de cerca de 30 milhões de espectadores por episódio, o que a coloca no mesmo patamar de "House of the Dragon", uma "prequel" do sucesso "Game of Thrones", e eclipsa facilmente as segundas temporadas de outras séries populares como "Euphoria" (19,5 milhões de espectadores) e "The White Lotus" (15,5 milhões de espectadores). O episódio final da primeira temporada será transmitido neste domingo (12).

"The Last of Us" também se tornou a adaptação mais bem-sucedida de um videogame, em forma de entretenimento roteirizado, e rompeu uma série deplorável de precedentes em Hollywood. Embora filmes como "Warcraft - O Primeiro Encontro de Dois Mundos" e os diversos "Sonic" tenham dado muito dinheiro, pouca gente os consideraria como histórias bem contadas (no mês que vem, também entra em cartaz "Super Mario Bros. O Filme").

Para Mazin, tudo começou com aquela epifania, cerca de nove anos atrás. Naquela altura, ele já tinha o respeito de seus pares; muitos dos seus amigos roteiristas, entre os quais os criadores de "Game of Thrones", David Benioff e D.B. Weiss, recorreram à ajuda dele durante anos, pedindo conselhos sobre seus trabalhos (Mazin também é um dos apresentadores de "Scriptnotes", um podcast bastante popular que desconstrói o processo de redação de roteiros). "Havia uma enorme distância entre a maneira pela qual esses amigos me viam e a maneira pela qual a indústria me via", ele disse.

Mazin decidiu que era hora de começar a ouvir os amigos e se arriscar, e por isso começou a desenvolver seu primeiro projeto pessoal. Ele encontrou um texto noticioso sobre os esforços de limpeza continuados na usina nuclear de Chernobyl, local de um grave acidente atômico em 1986. Mazin sabia muito sobre as catástrofes americanas, mas pouco sobre Chernobyl, que hoje fica na Ucrânia mas no momento do acidente era parte da União Soviética. Começou a pesquisar e ficou surpreso com o que descobriu. Ele devorou todo o material que encontrou.

"O que acontece com Craig é que, quando ele se foca em algo, se torna um pouco obsessivo", disse Casey Bloys, que comanda a HBO e a HBO Max.

Ainda assim, propor uma série baseada na dramatização de um desastre nuclear acontecido três décadas antes seria uma parada dificílima. Mazin precisava de ajuda. Ele era amigo de Carolyn Strauss, respeitada executiva de programação que tinha deixado a HBO em 2008 e iniciado uma carreira como produtora; seu primeiro crédito na nova função foi "Game of Thrones". Strauss sabia o quanto Benioff e Weiss confiavam em Mazin, profissionalmente.

"Era um cara a quem eles recorriam para pedir comentários, pela sua habilidade em estruturar roteiros e por seu conhecimento histórico", ela disse. "Toda aquela equipe respeitava muito o ponto de vista dele sobre a série."

Strauss uniu-se ao projeto sobre Chernobyl como produtora e trouxe a ideia à HBO, sabendo muito bem que seria uma venda difícil. Kary Antholis, que na época comandava o departamento de minisséries na empresa, aceitou a reunião porque o convite veio de Strauss. E, de fato, ele tinha suas dúvidas —tanto sobre os créditos nada impressionantes de Mazin até ali quanto sobre a vontade da rede de investir em uma história que parecia unicamente russa. Mas então ele ouviu a proposta de Mazin.

"Foi a melhor apresentação de proposta que ouvi nos 25 anos que dediquei a ouvir propostas. Nada mais chega nem perto", ele disse. Antholis convenceu a Sky a coproduzir a minissérie, diminuindo a carga financeira para a HBO. As expectativas eram baixas, e o horário escolhido para a série foram as noites de segunda-feira.

Mazin disse que ouviu de muita gente que "ninguém vai querer assistir". Em lugar disso, o programa foi um sucesso de público e crítica, e ganhou muitos prêmios. "Chernobyl", exibida pela HBO em 2019, ganhou 10 Emmys e dois Globos de Ouro, entre os quais o prêmio de melhor minissérie em ambas as premiações.

Isso essencialmente deu carta-branca a Mazin para tudo o que ele quisesse fazer em seguida na HBO. Mazin recorda que Bloys o incentivou a buscar aquilo que mais o inspirasse, perguntando: "O que o faz levitar?".

Mazin era um gamer dedicado, desde o final da década de 1970, quando seu pai comprou um Atari 2600 para a casa da família em Staten Island, Nova York. Quando "The Last of Us" se tornou o videogame mais vendido no ano de 2013, Mazin comprou uma console PlayStation para jogá-lo. Ele ficou hipnotizado, particularmente pela relação entre os dois personagens principais: Joel, um sujeito de meia-idade, sobrevivente endurecido de um holocausto, e uma menina de 14 anos chamada Ellie, que é imune à infecção que transformou a maioria das pessoas do planeta em zumbis.

Um mês depois de "Chernobyl" encerrar sua passagem pela rede, Mazin se reuniu com o criador do jogo, Neil Druckmann, e os dois deram os passos iniciais para uma adaptação. A ideia foi apresentada à HBO em julho de 2019. "Casey, encontrei a coisa que me faz levitar", disse Mazin a Bloys. "Por favor, por favor, por favor comprem os direitos disso para mim."

Bloys não jogava videogames, e estava muito familiarizado com o histórico nada positivo de Hollywood ao adaptá-los. Mas havia uma tradição na HBO de que roteiristas que criaram um projeto de sucesso estavam autorizados a fazer o que quisessem como seu próximo esforço, por mais diferente que fosse: Alan Ball passou de "Six Feet Under" para "True Blood"; Mike White de "Enlightened" para "The White Lotus"; Michael Patrick King de "Sex and the City" para "The Comeback".

"Você está apostando em alguém, o que requer confiança de ambos os lados", disse Bloys. "Vai ser sempre um salto de fé, até que você possa ver os resultados."

"The Last of Us" foi também uma aposta cara para a rede, ao contrário de "Chernobyl", que tinha um custo previsto de cerca de US$ 40 milhões (pouco mais de R$ 208 milhões no câmbio atual), dos quais apenas US$ 15 milhões (R$ 78 milhões) vieram do orçamento de programação da HBO, disse Antholis.

"The Last of Us" custaria à HBO mais de US$ 150 milhões (R$ 780 milhões), um orçamento não muito inferior ao de "House of the Dragon". Também teria de ocupar o horário nobre da HBO na noite de domingo, ocupando a brecha entre o final da segunda temporada de "The White Lotus", que terminou em dezembro, e a chegada da temporada final de "Succession", que estreia no final de março. A HBO e a sua empresa controladora, a endividada Warner Bros. Discovery, precisavam desesperadamente de um suprimento de novos sucessos, para evitar que as pessoas cancelassem o serviço de streaming HBO Max. Havia muita coisa em jogo.

Primeiro, chegaram as críticas: os críticos pareciam extasiados, tal como tinha acontecido com "Chernobyl" quatro anos antes. E depois entraram os números de audiência: um enorme sucesso.

O terceiro episódio despertou ainda mais interesse pelo programa. A mídia social celebrou a história do episódio, que não se encaixa na trama principal da série; escrito por Mazin, o episódio fala do casamento e sobrevivência de duas personagens periféricas, Bill e Frank, interpretados por Nick Offerman e Murray Bartlett.

"O que me impressionou sobre Bill e Frank e o potencial dessa história foi poder mostrar um tipo de amor a que não damos muita atenção: o amor entre adultos comprometidos, e que não estão ficando mais jovens", disse Mazin.

"The Last of Us" já teve seu contrato renovado para uma nova temporada, e Mazin está a semanas de começar a escrever roteiros para a temporada dois, com Druckmann.

Em retrospecto, a oportunidade de fazer tudo isso surgiu quando Mazin decidiu que estava cansado de ser rotulado pelos executivos de Hollywood.

"A indústria não compreende quem as pessoas são; só compreende aquilo que escreveram hoje", ele disse. "Uma das armadilhas em que alguém pode cair como escritor de comédia é a insistência deles em que você continue fazendo só aquilo, porque não há muitas pessoas confiáveis que eles possam contratar para esse tipo de trabalho. E, assim, vão tentar segurá-lo lá."

"Foi arriscado", ele prosseguiu, "mas também estimulante dizer a mim mesmo que eu enfim me permitiria a liberdade de fazer outra coisa."

Tradução de Paulo Migliacci

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