Francisgleydisson (Edmilson Filho) quer manter viva a chama da sétima arte quando a televisão chega ao interior do nordeste e ameaça acabar com o seu reinado. É o mote de "Cine Holliúdy", com roteiro e direção de Halder Gomes, que o "Supercine" (Globo) apresentou na madrugada deste domingo (22).

No ano de 1970, o cantor Márcio Greyck despontava nas paradas de sucesso, onde permaneceu por mais de seis meses com a sua bela canção romântica "Impossível Acreditar Que Perdi Você" e tema executado no filme em regravação do próprio cantor.

A chegada da telinha é avassaladora, então "Francis" pega a sua mulher "Graciosa" (Miriam Freeland) e o filho "Francin" (Joel Gomes), arrumam as trouxas e aprontam a Wanderléa para botar o pé na estrada em direção à pacata Pacatuba (CE) e lá montar um cinema popular.

Mas muita calma nessa hora. A Wanderléa que eles aprontam não é a maninha do Roberto, a sempre querida Ternurinha. É uma perua Veraneio amarela que recebeu o nome da cantora por lembrar a sua vasta cabeleira loura.

E a "musa da Jovem Guarda" não foi a primeira "perua" da família. Num momento de reflexão antes de partir de vez, Graciosa chama a atenção de Francis sobre a necessidade deles arranjarem um lugar fixo para morar e colocar o menino para estudar. "Nós já moramos dentro da Vanusa, dentro da Wanderléa, dentro da Cláudia Barroso, isso é o de menos", argumenta Graciosa. "Mas pense, a gente era sozinho. Agora tem o menino".

Personagens coadjuvantes, ricos em diversidade e humanidade, apesar de alguns por vezes carregarem um pouco na caricatura, enriquecem a saga de Farncisgleydsson Peixoto da Silveira que, com muito custo, consegue implantar o seu "Cine Holliúdy".

Não sem antes ter que se desfazer de sua querida Wanderléa, que acaba vendendo para o cantor Márcio Greyck que faz uma participação mais do que especial no filme. Sempre carismático, o cantor negocia a Veraneio e ainda dá o seu recado: "Deixa comigo que de loura eu entendo". Ao ver Márcio Greyck se afastando com a sua Wanderléa, Francis parodia o título do hit do cantor, que se ouve ao fundo: "Impossível acreditar que 'vendi' você", queixa-se Francis abatido.

O cantor Falcão está à vontade como o cego Isaías e aproveita bem o papel. Há tipos muito bem resolvidos, como a mãe do moleque que joga futebol e o chama desesperadamente para tomar o seu Toddy gelado –que na verdade era um caldo de feijão. O cabra no cinema que tudo comenta, tudo repete e ninguém lhe dá atenção.

As cenas que envolvem o futebol das crianças são carregadas de ingenuidade e leveza, tanto quanto o sonho de Francis em não deixar a televisão tomar definitivamente o lugar do cinema em sua Pacatuba. Mas o seu esforço não é em vão. Ele consegue criar uma espécie de distribuidora, a Francisplex, com a qual continua a por em prática o seu sonho até então quase impossível.

Roberto Bontempo e Miriam Freeland tem boas participações, mas o foco é mesmo o "Francis" de Edmilson Filho. Numa sequência final do filme, o ator faz um show solo ao ter que improvisar uma performance no palco enquanto a esposa tenta arrumar o projetor que falhou. Ele mesmo narra, ele mesmo age, ele mesmo bate, ele mesmo apanha. Um misto de Jackie Chan com Jerry Lewis, que ganha a atenção de todos.

"Cine Holliúdy" não arranca arroubos de emoção. Mas diverte e encanta.

Renato Kramer

Natural de Porto Alegre, Renato Kramer formou-se em Estudos Sociais pela PUC/RS. Começou a fazer teatro ainda no sul. Em São Paulo, formou-se como ator na Escola de Arte Dramática (USP). Escreveu, dirigiu e atuou em diversos espetáculos teatrais. Já assinou a coluna "Antena", na "Contigo!", e fez críticas teatrais para o "Jornal da Tarde" e para a rádio Eldorado AM. Na Folha, colaborou com a "Ilustrada" antes de se tornar colunista do site "F5"