Em 'Éramos Seis', casamento de Lola e Afonso conecta trama aos dias atuais
Força e final feliz da matriarca é a principal diferença da versão atual para anteriores
Força e final feliz da matriarca é a principal diferença da versão atual para anteriores
"Éramos Seis" (Globo) terá final diferente do que o seu próprio título sugere, do livro de nome homônimo que inspirou a novela e das outras versões da trama. Nesta quinta adaptação para a TV, a protagonista Lola, vivida por Gloria Pires, não vai terminar triste, sozinha e abandonada em um asilo.
Nos últimos capítulos da novela, que acaba nesta sexta (27), a matriarca da família Lemos se casa com Afonso (Cássio Gabus Mendes) e, ao que tudo indica, eles vivem felizes para sempre. Essa é a maior diferença da versão atual para a de 1994, do SBT, de Silvio de Abreu e Rubens Ewald Filho (1945-2019), e na qual se baseia a história escrita por Angela Chaves.
A Lola de 26 anos atrás, interpretada por Irene Ravache, já teve um final um pouco menos melancólico do que o escrito por Maria José Dupré, na obra literária publicada em 1943. Ela termina em um asilo de freiras, mas cuidando das crianças da creche. Na cena final, ela tem uma visão do marido morto, Júlio (Othon Bastos), e reclama que ele a abandonou. Júlio responde que, mesmo morto, estava ao lado dela o tempo todo.
Agora, depois de vender a própria casa, ir morar com o filho no Rio e ser humilhada pela nora, a Lola de Gloria Pires chega a se hospedar com a filha, Isabel (Giullia Buscacio), e o genro, Felício (Paulo Rocha), mas para não atrapalhar, decide ir para um asilo.
Lá, aliás, vai acontecer um encontro inédito e uma homenagem: a protagonista da história vai encontrar as Lolas do passado, Nicette Bruno, que fez a personagem na versão da Tupi de 1977, e Irene Ravache. Nicette Bruno dá vida a madre Joana, e Ravache interpreta Tereza, uma senhora que também mora no lugar.
Segundo o diretor artístico, Carlos Araújo, as três se tornam amigas e refletem sobre a vida. "Parte do texto delas [da Nicette e da Irene Ravache] é o que foi falado nas outras versões", antecipa ele.
Diferentemente do destino trágico de ambas, a Lola de Gloria vai sair do asilo e viver o romance com Afonso. Na verdade, é ele que vai até o asilo, se declara e a pede em casamento. A cerimônia vai acontecer em Itapetininga e Isabel será a única filha de Lola presente, já que Alfredo (Nicolas Prattes) continua fora do país e Julinho não aceita a união da mãe com Afonso.
Embora o texto base da novela seja o de 1994, a autora Angela Chaves diz que havia liberdade para mudar. "A ideia desde a sinopse foi dar um sopro de esperança, um final mais feliz para dona Lola."
O início do romance entre os personagens, aliás, começou antes do programado, atendendo a um pedido do público, que queria ver o casal junto. Como dito desde antes da estreia por Chaves, a Lola da atual versão é menos submissa e tem mais voz e força na casa, ainda que seja uma mulher típica dos anos 1920. "Essa Lola tem um diferencial. Só esse casamento dela dá uma potência muito grande para ela", complementa o diretor Araújo.
Para a professora de literatura brasileira Bianca Ribeiro Manfrini, a inclusão do casamento de Lola e Afonso no final da trama mostra como o gênero da telenovela é vivo e está conectado à atualidade, ainda que a história se passe há cerca de 80 anos.
"O livro 'Éramos Seis' é um elogio a mulher que abre mão da sua própria vida pela família. É um elogio a mulher virtuosa dos anos 1940", afirma ela, que escreveu “A Mulher e a Cidade: Imagens da Modernidade Brasileira em Quatro Escritoras Paulistas” (Edusp), trabalho que inclui análise sobre Dupré.
A mudança do final da matriarca faz parte da torcida do público, segundo ela, porque hoje há um entendimento diferente dessa mulher. "É a ideia que ela merece ser feliz pelo tanto que ela já sofreu", diz.
Na visão de Manfrini, a própria Lola da novela de 1994 era muito mais resignada e sofrida do que a atual. Para Gloria Pires, a autora soube ressignificar a trajetória de Lola sem deixar de levá-la pelos caminhos tortuosos, mas com a possibilidade de um novo olhar. "Acho que o público vai amar [o final]! Eu adorei e me emocionei muito."
Na versão de 1994, a principal diferença em relação às outras adaptações foi o final feliz de Clotilde (Jussara Freire) e Almeida (Paulo Figueiredo), que se manteve no remake de agora pelo casal vivido pelos atores Simone Spoladore e Ricardo Pereira.
Curioso é que o personagem Almeida não existe no livro, assim como muitos outros, que foram criados por Silvio de Abreu e Rubens Ewald Filho na versão que escreveram em 1977, a terceira adaptação do romance (as duas primeiras da Record, em 1958 e em 1968, eram mais simples e com poucos personagens).
A morte de Carlos (Danilo Mesquita) durante a Revolução Constitucionalista de 1932 foi definida em 1977 e por um motivo peculiar. Na obra de Dupré, o primogênito de Lola morre só no final, e da mesma doença de estômago que vitimou o seu pai.
Só que na época da trama, o ator Carlos Augusto Strazzer (1946-1993), que interpretava Carlos, precisava ser liberado no meio da novela porque seria o protagonista da outra produção, "O Profeta". Por isso, foi inventada a morte trágica para ele.
Na atual versão, o diretor Araújo e a autora contam que receberam muitos pedidos do público para que Carlos não morresse. Na visão deles, porém, a morte era fundamental para a história. "A tragédia transforma a vida dos irmãos e da mãe ", afirma Chaves.
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