A exemplo de Taís Araújo e Maju Coutinho, Miss Brasil deve denunciar 'racistas da internet'
Depois de ser coroada Miss Brasil Be Emotion 2017, a piauiense Monalysa Alcântara, alvo de ataques racistas nas redes sociais, já pensa em acionar judicialmente responsáveis por postagens discriminatórias.
A jovem de 18 anos, que afirmou ter se inspirado ao longo dos anos em personalidades brasileiras como Taís Araújo e Raíssa Santana para enfrentar o preconceito, aceitar seu biotipo e suas características, também deve seguir o exemplo das ídolas ao pedir a punição dos responsáveis por posts ofensivos.
Em entrevista à Folha, ela comentou os ataques sofridos e comparou com o que já foi vivenciado por outras personalidades negras, como a própria Taís Araújo e a jornalista Maju Coutinho.
Em 2016, ambas foram vítimas de ataques raciais na internet, denunciaram e conseguiram identificar os autores das injúrias raciais.
"Estou muito feliz e ainda estou comemorando o resultado do concurso", disse Monalysa, que venceu a disputa entre outras 26 representantes de Estados brasileiros. "Mas, com certeza vou acionar a Justiça. Existe uma lei que combate o racismo, e essas pessoas que a desrespeitaram precisam pagar pelo que fizeram", afirmou.
No país em que 54% da população é negra ou parda, segundo o IBGE, a recém-eleita Miss Brasil foi a terceira negra na história do concurso a conquistar o título. No ano passado, Raíssa Santana quebrou um jejum de 30 anos e foi a segunda negra a levar o coroa.
Nesta edição, realizada em Ilhabela, no litoral de São Paulo, a representante do Piauí viu seu perfil nas redes sociais crescer de forma vertiginosa. Até a semana que antecedeu sua coroação, tinha 20 mil seguidores numa das redes. Hoje, são mais de 270 mil. O problema foi que, além do reconhecimento e do apoio de milhares, vieram também comentários que, de maneira ofensiva, chegaram a questionar o resultado da disputa.
De origem simples, a brasileira mais bonita de 2017 diz que não foi fácil chegar até este ponto. Também afirmou não ser a primeira vez que sofreu preconceito por ser mulher, negra e nordestina.
"Eu já sofri bullying na adolescência. Mas a cada problema que enfrentei, ganhei mais forças para batalhar, para enfrentar as dificuldades. Acho tudo que já vivi tem me dado suporte para enfrentar os desafios desse momento", contou.
ORIGEM SIMPLES
Lembrar a infância e a adolescência, para ela, é rever tempos de uma vida simples, cheia de desafios, mas com muito apoio familiar. Do pai, que morreu quando ela tinha cinco anos, carrega boas lembranças.
"Eu era pequena quando ele morreu, mas lembro muito dele porque era um pai presente", disse. Hoje ela o considera um anjo, que está sempre presente em sua vida e dá apoio nos momentos mais difíceis.
A morte do pai, que era policial civil, representou mudanças para a família que vivia num bairro do Piauí com a presença de duas realidades: de um lado, casas de alto padrão; de outro, uma favela. Ela diz que sua família era bastante humilde.
Como a mãe precisou trabalhar fora, Monalysa, que tem mais dois irmãos, foi morar com a avó materna. "Foi ela quem me criou, que sempre fez tudo por mim."
A avó Maria José, 83, já estava aposentava e cuidava de toda a família.
"Houve vezes que fui com uma sacola na cabeça para a escola, para me proteger da chuva, mas minha avó fazia o que podia por nós. Lembro que ela encapava nossos cadernos com sacola de supermercado, era o que tínhamos", recordou.
Desde que começou a participar das competições de miss, já foram vários resultados positivos.
ESTILO E INSPIRAÇÃO
Um dos tempos mais difíceis vivenciado pela jovem miss ocorreu no ensino fundamental. Na sexta série, ela deixou a escola pública onde estudava para frequentar uma particular.
Na época era a única negra na turma, e não demorou para virar alvo de chacotas dos colegas, que também faziam uma pressão grande que ela mudasse o estilo. "Eu pedi para minha tia alisar meu cabelo, porque eles tiravam barato de mim. Falavam que era feio, que tinha cabelo de bombril, que era magrela, que tinha a boca grande e que ninguém nunca olharia para mim", lembrou.
Para ela, era uma tortura diária ir para a escola. Pediu inúmeras vezes para sair e voltar para a escola pública de antes. Nesse meio tempo, tentou mudar o estilo para tentar ganhar aceitação no grupo.
Tempos mais tarde, foi então que veio a inspiração que mudou o modo dela se ver. "Vi a Taís Araújo usando o cabelo de modo natural, então percebi que eu tinha minha beleza e podia ser eu mesma. Comecei a pesquisar na internet e encontrei a Raíssa, que ainda não era miss e que dava dicas para cuidados com o cabelo. Aprendi a me cuidar, do jeito que eu sou, foi libertador", afirmou.
CARREIRA
Dos dez aos 12 anos, Monalysa fez aulas de balé e teatro. Aos 14, pisou pela primeira vez numa passarela. Magra, com uma altura acima da média entre colegas de escola, gostou da experiência e decidiu que seria modelo.
A firmeza e a dedicação da jovem fizeram com que o primeiro convite para participar do Miss Brasil viesse dois anos mais tarde. Como ainda era menor de idade, teve que recusar.
"Eu gosto de entrar na passarela, com um público que não conheço, amo ser miss", disse. Ela considera que sua paixão pelo que faz que resultou na faixa da disputa este ano.
"As pessoas falam do meu estilo e da Raíssa, que venceu o ano passado. Fazem um monte de especulação e comparações, mas não entendem que o resultado do Miss Brasil foi independente de cor ou raça. Ele premiou quem foi considerada a melhor num conjunto."
A eleita disse que apenas mostrou sua personalidade. "Eu estava tranquila, fui eu mesma, e isso pesou bastante. Eu não estava entre as favoritas, então foi uma surpresa o resultado", avalia. Ela lembrou que apenas sua assessora e seu namorado estavam confiantes de que ela levaria o título.
A Miss Brasil havia se matriculado no curso de administração, mas por conta dos compromissos e da preparação para o concurso mundial, precisou trancar.
"Os planos a partir da agora são positivos. As expectativas são as melhores possíveis. Sou capaz de estar aqui. Mesmo que duvidassem, pude mostrar quem eu sou e agora quero representar o Brasil da melhor maneira possível."
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