BBB 23: Globo tenta ser ética ao expulsar Guimê e Sapato, mas aproveita para turbinar audiência
Emissora foi criticada por exibir Prova do Líder e Lady Night com Lexa
Foram dois dias atípicos na história do BBB 23 (Globo), programa que, ao longo de duas décadas, já produziu muito momentos memoráveis. Em pouco mais de 24 horas, a chegada da modelo e influenciadora Dania Mendez, vinda diretamente de La Casa de Los Famosos, versão com celebridades latinas do Big Brother, resultou na expulsão de Cara de Sapato e MC Guimê.
Dito assim, parece até que a moça teve alguma culpa pelo que aconteceu. Não teve. Os culpados foram os próprios expulsos, que, mesmo devidamente alertados pelos colegas, avançaram o sinal sem medo.
MC Guimê vinha se destacando como o jogador mais estratégico desta edição e já era apontado pelas enquetes online como o favorito ao prêmio final. Ganhou várias provas do líder e do anjo, atendeu o Big Fone algumas vezes, sabia quem colocar e tirar do paredão –e tudo isso sem criar nenhum grande inimigo na casa.
Toda essa habilidade foi desperdiçada com um único gesto: uma mão boba no bumbum de Dania. Durante a Festa do Líder, que era em sua homenagem, Guimê se sentiu empoderado o suficiente para enlaçar a modelo pelos quadris e depois deslizar a mão, assim como não quer nada, sobre as nádegas dela. Não deu muito certo: Dania removeu a mão do rapper, talvez até num gesto inconsciente. Mas foi tudo registrado pelas câmeras.
Cara de Sapato foi ainda mais inconveniente. E apressado: era óbvio que estava pitando um clima entre ele e a mexicana, que não parava de elogiar a beleza do lutador e chamá-lo de "Sapatito". Ali pode ter rolado um certo choque cultural. Só no Brasil é que existe essa cultura de sair beijando desconhecidos na boca, estimulada pelo Carnaval. No resto da América Latina, as coisas evoluem um pouco mais devagar. Mesmo que a atração seja mútua, raramente rola um beijo no primeiro encontro. Dania parecia, sim, estar interessada no "Sapatito", mas não a ponto de ir com ele para baixo do edredom logo no primeiro dia.
Quando as cenas foram exibidas pelo Globoplay, a internet entrou em erupção. A demanda pela expulsão dos assediadores se tornou ensurdecedora. Mas a Globo não agiu de bate-pronto.
Talvez receosa de eliminar dois concorrentes fortes faltando mais de um mês para o final da temporada, a emissora resolveu ouvir Dania. Chamada ao confessionário, a moça confirmou que não se incomodou com absolutamente nada e que estavam todos muito "borrachos". Admitiu que Sapato lhe roubara um beijo, quase um selinho, e sequer se lembrava da mão boba de Guimê.
No final da tarde, patrocinadores do programa começaram a postar que não concordavam com nenhum tipo de assédio sexual. A pressão sobre a Globo aumentou ainda mais. Então, a emissora decidiu pela expulsão dos rapazes.
Mas, ao contrário de outras expulsões, que ocorriam durante a tarde e de forma bem discreta, esta foi ao vivo, diante de todos os participantes. Comercialmente é uma decisão compreensível: o BBB 23 vem alcançando índices de audiência inferiores aos das edições anteriores, e um drama desses se desenrolando em tempo real no horário nobre é um chamariz irresistível para o público.
Mesmo assim, a coisa foi mal conduzida. O apresentador Tadeu Schmidt fez um discurso duro, mas não deu maiores esclarecimentos. Não foram exibidos para os brothers as cenas de assédio. Resultado: Sapato e Guimê ficaram pasmos, sem entender o que fizeram de tão mal, e Dania desatou num choro convulso, sentindo-se culpada pela eliminação dos dois.
Esse pranto também é reflexo do machismo reinante na sociedade, que condiciona a mulher a se sentir responsável por tudo de ruim que acontece. Dania foi a vítima, e fez o que pode para repelir seus assediadores. No confessionário, admitiu que não estava incomodada e que queria continuar no BBB. Mas só este depoimento não vale: Guimê e Sapato realmente cometeram assédio sexual, e não há pano que apague esse delito.
Depois que os dois saíram, o restante da casa estava arrasado, sem a menor disposição para nada. Mesmo assim, Tadeu insistiu que fosse disputada a Prova do Líder. O patrocinador deve ter experimentado emoções opostas. Por um lado, sua ação de merchandising foi ao ar numa noite de grande audiência. Por outro, o desânimo contagiante contrastava com as promessas de felicidade material prometidas pela marca. Bruna Griphao, a vencedora, sequer vibrou ao receber um cheque de R$ 100 mil.
A Globo fez bem em realizar essa prova num momento de grande tensão? Por um lado, há o contrato assinado com o anunciante, com multas previstas. Por outro, o desgaste de imagem para a emissora, que também respinga nos patrocinadores. A sensação que passou para muita gente foi a de uma ganância insaciável, aliada à condução atabalhoada de uma situação gravíssima.
Para completar, o episódio do Lady Night exibido logo em seguida tinha entre suas convidadas ninguém menos que a cantora Lexa, mulher de Guimê. Pegou mal nas redes sociais, a ponto de Tatá Werneck garantir no Twitter que perguntou a Lexa e à mãe desta se elas gostariam que fossem cortadas as menções a Guimê de seu talk show. Como elas deram sinal verde, o Lady Night foi ao ar em sua versão intacta. Bom para a audiência, ruim para a imagem da Globo.
Há que se elogiar a firmeza com que dois jogadores que descumpriram as regas do programa (e da vida...) foram sumariamente defenestrados. A sociedade está balada por casos como os dos jogadores Robinho e Daniel Alves, também ocorridos em ocasiões em que o álcool rolava solto, e não tem mais paciência para esses "meninos", mesmo com mais de 40 anos, que agem como se as mulheres estivessem aí para serem desfrutadas.
O mundo mudou e o BBB corre atrás. Aos trancos e barrancos, aos erros e acertos. Juntando as expulsões desta quinta (16) à bronca que o já eliminado Gabriel Fop levou logo no início da temporada, agora ficou claro qual é o grande tema dessa 23ª edição: o combate ao assédio sexual.
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