Campanha do SBT contra a homofobia é admirável, mas será que é para valer?
Emissora surpreendeu com vídeo que vai contra sua postura habitual
Na década de 1980, o Programa Silvio Santos foi a primeira atração da TV brasileira a dar espaço para travestis mostrarem seus talentos, no quadro Show de Calouros. Naquela época ainda não se usava o termo "drag queen". O dono do SBT chamava essas candidatas de "transformistas", uma palavra que hoje está meio fora de moda.
Em 2011, o SBT exibiu o primeiro beijo entre pessoas do mesmo sexo da teledramaturgia brasileira. Durante longos 40 segundos, as atrizes Giselle Tigre e Luciana Vendramini se beijaram na boca, durante um capítulo da novela "Amor e Revolução", de Tiago Santiago. A Globo só faria algo parecido quase dois anos depois, em "Amor à Vida".
Apesar desse pioneirismo, a emissora de Silvio Santos retrocedeu na representatividade de pessoas LGBTQIA+. De lá para cá, o SBT fez coisas vexaminosas, como alterar os diálogos de personagens gays da novela mexicana "Sortilégio" para que eles parecessem héteros, em 2014. Ou simplesmente sumir com o casal gay de outro folhetim mexicano, "Que Ricos Tão Pobres", exibido em 2017.
Em junho de 2021, no programa Vem Pra Cá, Patrícia Abravanel pediu que os gays "compreendessem" quem não os respeita, e que é difícil falar sobre diversidade com as crianças. Também ironizou a sigla LGBTQIA+, pronunciando-a como LGBTYH. Naquela mesma edição, o fotógrafo Gabriel Cardoso explicou para a apresentadora o significado de cada letra da sigla.
Patrícia, que também é filha de Silvio Santos, recebeu uma avalanche de críticas por sua postura equivocada. Inclusive de seu sobrinho Tiago Abravanel, que é gay assumido. Ela então se mostrou disposta a aprender e a evoluir, e esta intenção acaba de gerar um primeiro fruto: um vídeo em que artistas e funcionários do SBT se posicionam contra a homofobia.
A campanha é digna de aplausos, e surpreendeu muita gente. Mas será que é mesmo para valer? Convém lembrar que Patrícia é casada com Fábio Faria, ministro das Comunicações do governo Bolsonaro, e o atual presidente é conhecido por suas declarações homofóbicas.
Silvio Santos costuma dizer que Bolsonaro é seu "patrão", como se a concessão de sua emissora de TV fosse propriedade pessoal do mandatário. Mas o fato é que qualquer canal comercial também responde a uma outra força muito poderosa: o mercado publicitário.
O SBT não atravessa uma boa fase. Quase todos os programas de sua grade perderam audiência e, por conseguinte, anunciantes. Para reconquistá-los, a emissora precisa se reposicionar. Precisa eliminar a imagem de antiquada e se conectar aos tempos que correm.
A propaganda brasileira já fez este movimento. Hoje são cada vez mais comuns os comerciais protagonizados por negros, ou que mostram famílias não-tradicionais. Vale ressaltar que os publicitários não fazem isso por idealismo. Propaganda não é arte, porque ela não pode correr o risco de não ser entendida, e tampouco é ativismo político. Ela apenas reflete as mudanças que já ocorreram na sociedade.
O SBT tem que refletir também. Até porque tem eleição presidencial no final deste ano, e são grandes as chances de que Silvio Santos mude de "patrão".
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