Aviso
Este conteúdo é para maiores de 18 anos. Se tem menos de 18 anos, é inapropriado para você. Clique aqui para continuar.

Tony Goes

Minissérie repara injustiça da Globo com Gilberto Braga, mas só parcialmente

'Gilberto Braga - Meu Nome É Novela' está disponível no Globoplay

Gilberto Braga - TV Globo/ Márcio de Souza
  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Na terça passada (21), a Globo exibiu o especial "70 Anos Esta Noite", para celebrar o 70º aniversário da estreia da primeira telenovela brasileira. Com uma hora de duração, o programa mostrou astros famosos lembrando algumas de suas cenas mais icônicas, e mexeu com a memória afetiva do espectador.

Mas também houvesse quem pedisse –como eu, por exemplo, aqui no F5– uma abordagem mais profunda, que iluminasse a história da manifestação artística de maior sucesso do país. Talvez uma minissérie?

Um dia antes, na segunda-feira (20), a própria Globo já havia apontado um possível caminho. Foi neste dia que chegou à plataforma Globoplay a minissérie documental "Gilberto Braga – Meu Nome é Novela", cujos três episódios revisitam, em ordem cronológica, a obra de um dos nossos maiores autores do gênero.

Gilberto Braga morreu inesperadamente no dia 26 de outubro, a poucos dias de completar 76 anos. A minissérie a seu respeito estreou menos de dois meses depois, numa demonstração de agilidade da Globo. Grande parte do material usado já estava gravado há tempos: entrevistas que Braga e muitos de seus atores e diretores foram dando ao longo dos anos, a programas da emissora e ao projeto Memória Globo.

A captação de novas imagens foi mínima. "Meu Nome É Novela" traz depoimentos inéditos de, entre outros, Malu Mader e Glória Pires, as duas atrizes favoritas de Braga, e Denis Carvalho, diretor-geral de quase todas as obras do autor.

O formato adotado se revelou ágil e envolvente. A cronologia é seguida à risca, desde o primeiro "Caso Especial" que Braga assinou em 1972 –ainda com o sobrenome Tumscitz, com que já era conhecido como crítico de teatro– até "Babilônia", sua última novela, exibida em 2015.

A Globo poderia fazer algo parecido com todos seus autores importantes. E até melhor, se incluir, por exemplo, testemunhos de jornalistas e estudiosos das novelas. Um olhar vindo de fora da emissora seria muito interessante.

"Meu Nome É Novela" impressiona pela quantidade de obras de altíssimo nível assinadas por Gilberto Braga. Foi dele a adaptação de "A Escrava Isaura", o primeiro grande sucesso internacional da Globo. Na sequência, Braga escreveu novelas incríveis como "Dancin’ Days", "Água Viva", "Corpo a Corpo", "Vale Tudo" e as sensacionais minisséries "Anos Dourados" e "Anos Rebeldes".

Nem tudo foi um sucesso retumbante, é verdade. "Brilhante" foi retalhada pela censura. "Louco Amor" só empolgou com uma de suas tramas paralelas, o romance entre os personagens de José Lewgoy e Lady Francisco. O público rejeitou "O Dono do Mundo".

Mas fracasso para valer só veio com "Babilônia", que amarga até hoje o título de novela de menor audiência da faixa das 21h da Globo. A trama tinha problemas latentes –era pífia a motivação da vilã vivida por Adriana Esteves, obcecada pela outra vilã da história, papel de Glória Pires– mas também enfrentou a concorrência de "Os Dez Mandamentos", da Record, num momento em que ventos conservadores começavam a soprar pelo país.

Esse fiasco condenou Braga à geladeira da Globo, de onde ele não saiu mais. De tempos em tempos, corriam notícias de seus novos projetos. Como, por exemplo, uma adaptação do livro "Feira das Vaidades", de William Makepeace Thackeray, que marcaria a volta de Malu Mader ao canal. Ou uma minissérie que ele teria deixado totalmente escrita, pronta para ser produzida.

A Globo não deu seguimento a nenhuma dessas ideias. Sei muito bem, é óbvio, que não é só a busca pela qualidade que motiva qualquer emissora de TV. Mas será mesmo possível que o autor de tantos sucessos retumbantes tenha perdido totalmente o dom de encantar as massas no final de sua vida?

Gilberto Braga não queria que "Babilônia" fosse sua última obra levada ao ar. Morreu sem ter seu sonho realizado, e deixou no ar a sensação de ter sido injustiçado pela Globo, uma potência que ele ajudou a construir.

"Gilberto Braga – Meu Nome É Novela" repara, em parte, a dívida que a emissora tem com um de seus maiores autores. É uma bonita homenagem e uma confirmação do talento avassalador de Braga.

"Antes do Gilberto, as novelas eram apenas um passatempo", diz Glória Pires na primeiríssima cena da minissérie. "Ele colocou a novela como o lugar de discussão. Isso foi muito importante para a gente como sociedade".

É verdade: a novela brasileira mudou de patamar graças a ele. Existe um antes e um depois de Gilberto Braga. O que só atiça a minha curiosidade: como seriam seus projetos engavetados pela Globo? Posso estar muito enganado, mas duvido que qualquer um deles fosse pior do que, por exemplo, "Verdades Secretas 2".

Tony Goes

Tony Goes (1960-2024) nasceu no Rio de Janeiro, mas viveu em São Paulo desde pequeno. Escreveu para várias séries de humor e programas de variedades, além de alguns longas-metragens. Ele também atualizava diariamente o blog que levava seu nome: tonygoes.com.br.

Final do conteúdo
  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Comentários

Ver todos os comentários Comentar esta reportagem