Apesar dos avanços, negros ainda são raros na TV brasileira
O Dia da Consciência Negra é comemorado nesta segunda (20). Com o perdão pelo trocadilho óbvio, vale a constatação: estamos todos mais conscientes da persistência do racismo no Brasil. Mesmo assim, apesar do papel fundamental que teve e tem na formação da nossa cultura, o negro ainda é subrepresentado na televisão brasileira.
É só passar os olhos pelos elencos das novelas, qualquer novela. Nenhuma, em emissora alguma, reflete a proporção de negros e pardos na sociedade. Quase todas contam com atores negros, mas, geralmente, em papéis coadjuvantes. Pelo menos, dirão os otimistas, não mais (apenas) como empregados domésticos e outros serviçais com poucas falas.
Já os pessimistas perceberão que, há pelo menos dez anos, apenas três negros assumiram o posto de protagonistas na TV: Camila Pitanga, Lázaro Ramos e Taís Araújo. Existem muitos outros nomes que parecem prontos para encabeçar produções --tais como Sheron Menezzes, Fabrício Boliveira ou Érika Januza-- mas o fato é que nenhum deles ainda chegou lá.
No jornalismo os exemplos também são poucos, embora mais visíveis. Mas também chama a atenção que, apesar da comprovada competência, nenhum tenha o comando de um telejornal. Heraldo Pereira, Maju Coutinho ou Zileide Silva só vão às bancadas para cobrir as folgas dos titulares, todos brancos.
E tudo isto se passa na Globo - que, apesar de ser o alvo mais frequente das críticas, ainda é a emissora que mais promove a igualdade. Na Record, no SBT e na Band, os negros são ainda mais raros, com uma ou outra exceção que confirma a regra.
Claro que esta subrepresentação não se restringe à TV. Negros e pardos ainda são poucos na política, nas grandes empresas e nas artes plásticas. O apartheid informal que vigora no Brasil pode ter perdido força, mas ainda existe. É só perguntar a um negro, qualquer negro, quando foi a última vez em que ele se sentiu discriminado. A resposta provável será hoje.
Nos Estados Unidos, com racismo escancarado e tudo, os negros adquiriram um poder econômico com que nem sonham aqui no Brasil. Lá eles formam um segmento do mercado com força suficiente para lançar tendências e alterar estratégias de marketing. Por aqui, foram relegados às margens da sociedade desde os tempos da escravidão, e só agora alguns vêm conseguindo armas e recursos para chegar ao centro.
A televisão parece um veículo de resposta rápida, mas a verdade é que ela demora bastante em refletir o mundo exterior. Há até pouco tempo, não havia sequer roteiristas negros nas equipes que escrevem novelas e programas de variedades. Hoje eles já existem - no entanto, novamente, desconheço quem seja o autor principal ou o diretor-geral de alguma produção.
É questão de tempo que alguns cheguem a cargos de liderança, mas não se pode contar apenas com a evolução natural das coisas. É preciso cobrar, reclamar, apontar os absurdos. Pois é só com uma maior presença negra - na frente e atrás das câmeras, nas tramas da ficção, na propaganda - é que a nossa televisão vai poder realmente ser chamada de brasileira.
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