Marcelo Arantes

Falta alguém para se torcer em 'Babilônia'

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Uma obra pra agradar o público precisa necessariamente servir de descarga emocional para suas forças psíquicas.

Em outras palavras, a audiência precisa se identificar com a maioria das personagens que acompanha numa novela. Isto permite liberar sentimentos que não possuem condutos próprios em suas vidas reais, e explica também a necessidade de se torcer por certas personagens.

Na novela "Babilônia" (Globo), o amor de Beatriz (Glória Pires) por Diogo (Thiago Martins) humanizou a psicopata ninfomaníaca, mas o público efetivamente ainda não sabe quem é bom e quem é mau, ou melhor, para quem deve torcer na disputa entre Beatriz e Inês (Adriana Esteves).

A mudança de cenário trouxe leveza a "Babilônia". Ainda que seja tendência mostrar o dia-a-dia das favelas brasileiras, o assunto havia se tornado repetitivo, especialmente quando exibido depois de "I Love Paraisópolis", a novela com o mesmo cenário do horário anterior.

Regina, a sofredora incansável, 'gourmetizou-se' e ascendeu socialmente de patinho feio a cisne. A personagem de Camila Pitanga trocou a vida de barraqueira pelas altas castas sociais cariocas, e agora fala um tom mais baixo, simples e sofisticada.


Até o personagem impopular Luís Fernando (Gabriel Braga Nunes) parece ter encontrado seu lugar no mundo ao lado de Consuelo (Arlete Salles). Mãe do prefeito evangélico corrupto, a porta-voz da 'tradicional família brasileira' é um espetáculo à parte com suas expressões preconceituosas hilariantes, como "ateuzinho lésbico" e "sapatosas, as lésbicas idosas".

Mas é um pesar que o possível trunfo de "Babilônia", sua crítica social, tenha soado tão agressiva para o público conservador. Além da homofobia e corrupção dos políticos (incluído os ditos evangélicos), a novela retrata o domínio cruel das milícias nas comunidades, e até chacina de menores teve.

A questão da maioridade penal também de alguma forma é abordada, já que um dos maiores bandidos da trama, Wolnei (Peter Brandão), é menor de idade. Ao se discutir a necessidade de responsabilizá-lo, os autores parecem querer agradar a fatia conservadora.

Mas pra quem o público vai torcer agora? "Babilônia" é prova de que não basta juntar bons autores e atores às custas de uma produção cara para colher os frutos da boa audiência. Desde "Insensato Coração", não se via tanta crítica à dupla Gilberto Braga (autor) e Dênis Carvalho (diretor) nas redes sociais.

Melhor que a própria novela tem sido as participações de duas de suas atrizes nas redes sociais: Camila Pitanga no Twitter e Maíra Charken (a delegada Vera) no Snapchat.

Bem-humoradas e interativas, elas têm colecionado uma legião de admiradores que se surpreendem com seu cotidiano, identificam-se com seus problemas e de fato torcem para que o dia de amanhã seja melhor que onde hoje.

Quanto à torcida em "Babilônia", definitivamente parece ser apenas para que acabe logo.

Marcelo Arantes

Marcelo de Oliveira Arantes (@dr_marcelo_) é psiquiatra, mora em São Paulo e comenta o "BBB" há dez anos, desde que participou do "Big Brother Brasil 8". É autor de “A Antietiqueta dos Novos Famosos”.

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