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Zapping - Cristina Padiglione

'Vai na Fé': autora adianta virada que marca o capítulo 100

Rosane Svartman conta como alcança audiência abordando etarismo, importunação sexual e racismo na novela das sete

Atormentada pelo malvado Theo (Emílio Dantas) e amada pelo herói Lui Lorenzo (José Loreto), a mocinha Sol (Sheron Menezzes) voltará a sofrer após breve respiro - Globo
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São Paulo

Em novela que se preze, mocinha só fica realmente feliz no final da história. Mas como ninguém é de ferro, a autora Rosane Svartman resolveu dar um respiro a Sol (Sheron Menezzes) em "Vai na Fé". No momento, o folhetim das sete da Globo tem audiência praticamente empatada com a da trama das nove, "Terra e Paixão", de Walcyr Carrasco, na casa dos 24 a 25 pontos de média na Grande São Paulo (cada ponto corresponde a 206.674 telespectadores, segundo a Kantar Ibope Media).

Orgânica o suficiente para propor temas relevantes sem perder público, a história chega nesta quinta-feira (11) ao capítulo 100, pronta para fazer a heroína voltar a sofrer. Sol terá de refazer o exame de DNA que acusa a identidade da paternidade de sua filha, Jenifer (Bella Campos). A ideia de família de comercial de margarina pode desmoronar diante da revelação de que o vilão Theo (Emílio Dantas), e não o bonzinho Ben (Samuel de Assis), é o pai da menina.

Mas como ainda faltam mais uns 80 episódios até o fim da trama, a autora não descarta novas reviravoltas e se diverte com os vários segredos ainda guardados por Sol. Um deles também se desmanchará nessa virada da história, quando será a revelada a cláusula contratual em que a mocinha concordava em não se envolver afetivamente com o patrão, o ídolo pop Lui (José Loreto).

O termo foi acordado com Wilma (Renata Sorrah), a mãe do rapaz. Ele mesmo desconhecia o fato e há de se revoltar contra ela, provocando discussões sobre as regras que hoje regem os departamentos de compliance das empresas e os riscos vigentes nas relações entre chefes e subordinados que se envolvem afetivamente, como acontece inclusive nos bastidores da Globo.

Svartman sabe como sacar assuntos sociais relevantes da manga sem afastar o público e ferir suscetibilidades. Em "Bom Sucesso", sua última novela, levava textos literários à boca dos atores e mantinha a plateia atenta. "Vai na Fé" já trouxe à tona na primeira semana cenas que abordam o sistema de cotas nas universidades e o racismo estrutural, com atos de segregação que na maioria das vezes demoram a ser percebidos até pelas vítimas.

A novela também teve a felicidade de mencionar importunação sexual bem na semana em que esse mesmo termo era amplamente discutido em função do BBB 23, quando Cara de Sapato e MC Guimê foram expulsos do programa da Globo.

"A gente tem uma frente ampla de capítulos escritos, maior do que eu tive em 'Bom Sucesso' e 'Totalmente Demais'. Eu me surpreendo quando existe uma sincronia entre o que está acontecendo no ar e a realidade. Essa novela ia estrear em janeiro do ano passado e acabou estreando em janeiro deste ano, e por enquanto a gente está seguindo muito a sinopse", conta.

Entre as poucas sequências que teve de refazer com sua equipe, esteve uma que pereceu após o STF ter derrubado a prisão especial para quem tem diploma universitário. "A gente teve que pedir para regravar algumas cenas em que fazíamos debates sobre o assunto, mas é muito raro acontecer isso", diz.

O que a autora faz para dar mais temperatura à novela é muitas vezes inserir novos elementos no texto sem que isso afete as previsões de locações e a escolha do elenco escalado para gravar em datas já determinadas.

Outro ponto que Svartman promove fora da curva das produções do gênero na emissora é aproximar os roteiristas entre si e também do elenco. A sala de roteiro, reunião de trabalho entre os escritores, acontece presencialmente por duas ou três vezes por semana, na sede dos Estúdios Globo mesmo, onde a novela é gravada, em Curicica, bairro distante da zona oeste do Rio de Janeiro.

"A sala de roteiro é na Globo, justamente para aproximar o texto da produção. A gente aprendeu que as salas podem ser híbridas [remotas e presenciais], e quando a gente vem para os estúdios, isso muda a relação com a produção e a relação da minha equipe com os atores. O Mario [Viana], que escreve para a Renata [Sorrah], poder vir aqui e conhecer a Renata dá outro resultado ao trabalho. Tenho uma equipe tão talentosa, que essa troca é muito boa. Acho importante que os atores conheçam as pessoas que estão por trás daquelas palavras."

Além de Viana, o texto é assinado também por Renata Corrêa, Pedro Alvarenga, Renata Sofia, Fabrício Santiago e Sabrina Rosa. A direção artística é de Paulo Silvestrini.

A personagem de Sorrah, aliás, ex-atriz agora dedicada aos negócios do filho, é um dos grandes hits da história. É pela voz dela que os autores mencionam e homenageiam outras novelas, séries e filmes. Esta semana, Wilma declamou texto da peça "Medeia" em uma cena onde aparecia no meio de um restaurante, sendo aplaudida pelos demais. Outro dia, em breve texto, falou com propriedade sobre as vantagens de envelhecer e os preconceitos à idade, trecho que viralizou em redes sociais.

Atenta ao retorno que a novela encontra nas ruas, Svartman conta que foi dar uma aula na PUC há poucos dias. "Adoro essa troca e voltar para a universidade, vou sempre que posso. Segundo a [pesquisadora] Eneida Nogueira, uma autora tem que fazer não o que está acontecendo agora, mas o que vão querer discutir dali a um ano. Isso tem a ver também com o fato de a novela tratar de temas tão atuais, como foi o caso dessa votação [no STF], tem a ver com o que é fazer uma novela e a sensibilidade de prever sobre o que as pessoas vão falar."

Mesmo estando em sua terceira novela, sem contar duas temporadas de "Malhação", Svartman ainda se espanta ao ver seus diálogos realizados na tela, com toda a moldura que um texto ganha após sair do papel e ocupar estúdios, com atores, iluminação, maquiagem, cenografia e trilha sonora. "Ainda me espanto com isso."

Zapping - Cristina Padiglione

Cristina Padiglione é jornalista e escreve sobre televisão. Cobre a área desde 1991, quando a TV paga ainda engatinhava. Passou pelas Redações dos jornais Folha da Tarde (1992-1995), Jornal da Tarde (1995-1997), Folha (1997-1999) e O Estado de S. Paulo (2000-2016). Também assina o blog Telepadi (telepadi.folha.com.br).

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