'Amor de Mãe' termina bem, apesar dos muitos furos e exageros
Estreia da Manuela Dias na faixa das 21 horas ficou um pouco aquém do esperado
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Ao longo das quatro semanas em que esteve no ar, "Amor de Mãe" foi, por diversas vezes, a novela errada na hora errada. O primeiro folhetim da Globo a voltar com cenas inéditas depois de um ano de reprises passou longe de ser o entretenimento que os brasileiros precisavam no pior momento da pandemia.
Por considerar sua obra realista, a autora Manuela Dias resolveu incorporar o chamado “novo normal” ao texto. Seus personagens passaram a circular de máscara, usar álcool gel nas mãos e até a limpar as compras, algo que na vida real já não fazemos há meses.
Pior: Betina (Ísis Valverde) contraiu o novo coronavírus e precisou ser internada. Nenhum refresco para o espectador que sai do Jornal Nacional abalado com a curva ascendente de mortos pela Covid.
"Amor de Mãe", apesar do título enternecedor, também foi pródiga em violência. Os cadáveres foram se empilhando logo nos primeiros dias da reta final. Aos buracos de bala, somaram-se os furos no roteiro. Mesmo com tempo extra para burilar sua trama, Manuela Dias cometeu deslizes quase imperdoáveis.
Por que Vitória (Taís Araújo) entrou sozinha no covil do vilão Álvaro (Irandhir Santos), sem esperar pela polícia? Por que Davi (Vladimir Brichta) saiu desarmado de seu carro, pedindo calma ao atirador que o ameaçava? Por que Lurdes (Regina Casé) demorou dois meses para perceber um rombo no teto da casa onde estava presa por Thelma (Adriana Esteves)?
Foram inúmeras forçadas de barra, em uma novela já cheia de coincidências demais. Mas, em sua semana derradeira, "Amor de Mãe" se redimiu.
O reencontro entre Lourdes e Danilo/Domênico (Chay Suede), o filho que ela procurava há quase 30 anos, foi um momento antológico da TV brasileira. Diálogos, direção e atores entregaram tudo o que se esperava deles: uma descarga de emoção. Foi impossível conter as lágrimas.
Depois desse pico, os dois últimos capítulos não trouxeram maiores surpresas. Houve um sequestro, coisa obrigatória no final das novelas atuais –aqui, o do bebê Caio, filho de Danilo e Camila (Jéssica Ellen) por sua avó Thelma. Houve a morte do vilão Álvaro e alguns desfechos felizes.
Houve também muito tempo perdido com Durval (Enrique Diaz), um personagem simpático e totalmente dispensável. Única explicação plausível para tamanha enrolação: alongar os episódios, para cavar mais intervalos comerciais.
Houve, por fim, o reencontro de Thelma, em seu leito de morte, com Danilo. Os dois não chegaram a se reconciliar. O máximo que o rapaz concedeu à sua mãe de criação foi essa última visita, sem direito a beijo nem perdão.
"Amor de Mãe" será lembrada como uma boa novela, talvez a melhor de sua faixa nos últimos cinco ou seis anos. Também teve uma produção atribulada, marcada por interrupções e adiamentos.
Muito se esperava da estreia de Manuela Dias como autora principal de novela, e justamente no horário mais nobre da nossa TV. A expectativa era alta, por causa do excelente trabalho que ela apresentou na minissérie “Justiça” (2016). Injustamente alta, aliás, porque as limitações do formato novela são grandes, e as cobranças, maiores ainda.
"Amor de Mãe" não foi um fenômeno de audiência como "Avenida Brasil", muito menos um divisor de águas na nossa teledramaturgia. Mesmo assim, trata-se de um produto admirável, realizado em condições adversas por uma equipe talentosíssima. Com apenas 43 anos de idade, Manuela Dias já foi bem longe. Se evitar crateras em seus próximos enredos, tem tudo para ir muito mais.