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Tony Goes

Novela 'Amor de Mãe' fez bem em incorporar a pandemia à trama?

Novela busca conscientizar, mas também traz informações ultrapassadas

Lurdes (Regina Casé) em cena com Thelma (Adriana Esteves) em "Amor de Mãe" - João Miguel Júnior/Globo
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Manuela Dias deu um azar histórico. Sua primeira novela como autora titular, e justamente no horário mais nobre de todos, foi abatida em pleno voo pela pandemia do novo coronavírus. Com pouco mais de três meses no ar, “Amor de Mãe” teve suas gravações interrompidas em março do ano passado.

“Na hora que eu entendi que isso não iria acabar tão cedo, percebi que não tinha como seguir sem o coronavírus”, disse ela a Leonardo Sanchez, em entrevista para a Folha. “A gente não podia nem ter figurante, não dá para fazer uma cidade cenográfica fantasma como se tudo estivesse normal. E a novela é um gênero muito realista, quase documental, como eu iria manter a Covid fora dela?”

Há quem discorde. Daniel Ortiz, por exemplo, resolveu prosseguir “Salve-se Quem Puder”, também interrompida, sem nenhuma menção ao vírus. Mas o tom de sua trama, que volta nesta segunda (22) à faixa das 19h na Globo, é bem mais leve e escapista do que o do folhetim de Manuela Dias. Os dois autores têm boas razões para as decisões distintas que tomaram.

“Amor de Mãe” estreou sua fase final na segunda passada (15), e a pandemia deu as caras logo nas primeiras cenas. Os personagens estão usando máscaras na rua e, em alguns casos, até dentro de casa.

Também passam álcool gel nas mãos o tempo todo e ainda fazem algo que agora sabemos que é desnecessário: limpam as compras de supermercado. Quando esses últimos capítulos foram gravados, entre agosto e novembro de 2020, a prática ainda era comum.

Todos esses aspectos são louváveis e educativos ainda mais num país onde o próprio presidente da República é negacionista. Mas o retorno de “Amor de Mãe” também teve um lado negativo. Um ano depois estamos fartos da pandemia, mas justamente a novela de maior audiência não nos deixa pensar em outra coisa.

Vindo logo após o Jornal Nacional, que encerra cada edição com o número de brasileiros mortos pela Covid-19, ela cai como um soco no estômago quando deveria ser um agradinho.

Também por ter tido suas gravações encerradas há meses, “Amor de Mãe” ainda cometeu um pecadilho na semana passada. Magno (Juliano Cazarré) e Lídia (Malu Galli) se beijaram intensamente, sob a alegação de que ambos já haviam caído doentes e se curado.

Agora sabemos que a reinfecção é possível, ainda mais com as novas cepas do vírus ainda mais mortais e contagiosas que estão em circulação. A Globo se viu obrigada a veicular um aviso depois de cada capítulo, quase pedindo desculpas.

Mas também há um lado que, se não é exatamente divertido, servirá como registro histórico. “Amor de Mãe” está refletindo o baixo astral que tomou conta do Brasil. Estamos num dos momentos mais tristes da nossa história, e o programa de maior importância da nossa TV conseguiu captar esse clima de desolação.

Será, provavelmente, a única novela a incorporar a pandemia à sua trama. No futuro, “Amor de Mãe” poderá ser estudada como uma cápsula do tempo: uma amostra, registrada no calor da hora, das angústias dos brasileiros em 2020 e 2021.

Tony Goes

Tony Goes (1960-2024) nasceu no Rio de Janeiro, mas viveu em São Paulo desde pequeno. Escreveu para várias séries de humor e programas de variedades, além de alguns longas-metragens. Ele também atualizava diariamente o blog que levava seu nome: tonygoes.com.br.

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