Zapping - Cristina Padiglione
Descrição de chapéu Três Perguntas Para...

João Côrtes: 'Num país tão machucado como o nosso, mais do que nunca precisamos do lúdico'

No ar em 'Passaporte para a Liberdade', ator participa da seção 'Três Perguntas Para...'

O ator João Cortes em entrevista ao 'Três Perguntas Para...' da coluna Zapping - Marcos Duarte

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Campinas

Conhecido nacionalmente por protagonizar os comerciais da Vivo sob a direção de Fernando Meirelles, João Côrtes, 26 anos, começou sua carreira anos antes do estouro. Aos 14 anos, ele estrelou sua primeira peça de teatro com "O Pequeno Príncipe", quando se apaixonou pela arte.

Já em 2013, com 16 para 17 anos, o ator passou a fazer testes para publicidade, além da televisão e do cinema, e foi nesse ano que começou a gravar as campanhas da empresa de telefonia, em paralelo à série "3 Teresas", do GNT. No mesmo ano, Côrtes gravou seu primeiro longa, "Lascados".

Segundo o ator, o personagem "ruivo" deu tão certo que lhe rendeu mais campanhas do que o previsto inicialmente. Os comerciais foram exibidos por anos em horários de maior audiência de canais de televisão aberta e fechada, trazendo a visibilidade de que o artista precisava para colocar em ação projetos pessoais e ter novas portas abertas.

Em 2021, Côrtes estreou como roteirista e diretor, com o filme "Nas mãos de quem me leva", lançado em diferentes plataformas digitais. O longa foi premiado nas categorias de "Melhor Diretor", "Melhor Filme", "Melhor Atriz", "Melhor Direção de Fotografia" e "Melhor Roteiro" em três festivais de cinema: em Portugal, na Alemanha e na Coreia do Sul.

Além disso, João faz dublagem de animações. Ele dá voz ao personagem Orm, em "O Reino Gelado - A Terra dos Espelhos", e a Lou ,em "Uglydolls". Neste ano, o ator estreou em "Passaporte para a Liberdade" e no Álbum Visual de Manu Gavassi, "Gracinha", disponíveis na Globo e na Disney+, respectivamente.

O ator é o entrevistado do "Três Perguntas Para..." seção da coluna que já conversou com Day Mesquita, Helio de La Penã e Claudia Raia. Confira:

Meses depois de assumir sua homossexualidade, no ano passado, você lançou o curta-metragem "Flush", filme em que aborda as diferentes identidades sexuais e de gênero por meio das personagens. Você acredita que se posicionar mudou a forma de se relacionar com seu trabalho?

Não diria que mudou a forma de me relacionar com o trabalho, afinal, em cena, nunca é o João... é o Giuseppe, o Wilfried, e por aí vai. Já na preparação, se começa todo um trabalho para viver aquela nova pessoa, seja ela como for. E, para um ator, quanto mais diversos os personagens que a gente tem pela frente, melhor.

Mas, em resumo, sempre estive disponível e absolutamente entregue pros personagens da mesma forma. Desde que comecei, o que me move nessa profissão, entre outras coisas, é poder contar boas histórias e passar o máximo de verdade em cena.

Especificamente sobre os roteiros que venho desenvolvendo, aí pode-se dizer que sim, tem a ver com a minha vivência a escolha de olhar para a representatividade como temática extremamente necessária.

Acredito que, como roteirista e diretor (quando em projetos autorais), por mais que muitas vezes eu escreva histórias que não têm nada a ver com o que vivi, outras frutos de observação, e outras que são 100% ficção, elas calham num ponto em comum: são histórias que me movem de alguma forma, ou mesmo lutas que me movem.

Embora cada vez mais artistas estejam se posicionando, você enxerga alguma resistência ou preconceitos no mercado cinematográfico?

Na minha visão o meio artístico, e em especial o cinematográfico, sempre pareceu estar alguns passos à frente, de forma geral, no entendimento de que as pessoas deveriam ter a liberdade de ser quem são.

A resistência que existe hoje para as mais diversas temáticas não acontece por parte do nosso mercado audiovisual, considerando quem de fato trabalha nele. Mas sim, por exemplo, por quem deveria apoiar a cultura e a arte e faz o oposto de tudo isso: o governo federal.

Importante dizer que quando digo isso, não me refiro aos meus filmes que, pontualmente, não tiveram qualquer problema em sua realização, já que eram independentes e foram lançados diretamente no streaming.

Mas é notório que vivemos num tempo em que, infelizmente, é evidente a tentativa de atrapalhar a realização de projetos que não dizem o que "eles" gostariam... Quer melhor exemplo disso do que 'Marighella'? O filme foi lançado nos cinemas por pura persistência e raça do Wagner [Moura] e equipe.

Mas no fim, mesmo com toda a resistência [externa] à diversidade —de personalidades, de gênero, de pensamentos—, nós que seremos (e somos) a resistência.

Recentemente você participou do Álbum Visual da Manu Gavassi. O que a magia de "Gracinha" tinha que outras produções, menos lúdicas, não têm?

Foi muito, muito, especial fazer parte desse projeto. Ali existia um cuidado e uma atenção aos detalhes como poucas vezes vi em um trabalho. A direção de arte, o figurino, a maquiagem, o cenário como um todo, cada objeto... Tudo foi extremamente pensado e repensado para contar a história. E fez absolutamente toda a diferença.

"Gracinha", em minha opinião, é uma obra-prima. Belíssima. A Manu sabia exatamente como contar essa história e em que universo ela estava adentrando. Todos nós nos sentimos dentro de um filme da Disney.

Acredito que em um momento tão duro como o que estamos vivendo, num país tão machucado como o nosso, mais do que nunca precisamos do lúdico. Do fantástico. Da magia. De acreditar nos contos, de poesia, de arte, de dança, de música... É um projeto lindo, feito para acalentar nossos corações. Nos fazer suspirar. É o carnaval em forma de imagem e som que tanto almejamos.