O cipó do pajé
Sabemos todos que, como diz aquela máxima antiga, "gosto não se discute". É verdade. As vezes, se lamenta.
Numa pretensa luta entre a liberdade de expressão e o politicamente correto, muitos programas de humor dos canais abertos de televisão têm exagerado na dose. Grosserias e humilhações têm sido vistas como se liberdade fosse debochar de tudo, de qualquer jeito e a qualquer preço.
Outra máxima não menos antiga é aquela que diz que "quantidade não é qualidade". Também é verdade. A única eventual vantagem da "quantidade" é a diversidade de "gostos" que pode atingir. Cada espectador pode escolher, em meio à abundante diversidade de opções, aquele tipo de humor que o faz rir.
Do que tenho visto por aí, nada melhor do que "Tapas & Beijos", que vai ao ar às terças-feiras, na Rede Globo.
A começar pela escolha das protagonistas. A "química" que flui da parceria das atrizes Andréa Beltrão (Sueli) e Fernanda Torres (Fátima) é impagável. As personagens, duas vendedoras de uma loja de vestidos de noivas (Djalma Noivas), demonstram com maestria uma natural e imensa intimidade. Num piscar de olhos, tem-se a sensação de que já se fizeram entender, como se fossem mesmo as amigas que trabalham e moram juntas há muito.
A veia cômica de Andréa Beltrão e Fernanda Torres todos já conhecíamos de outras produções, sem dúvida. Mas parece que a junção de ambas fez crescer e transbordar telinha afora o talento dessas duas excelentes atrizes. E o elenco inteiro é feliz em seu desempenho na série.
Criações primorosas como o Djalma, dono da loja, vivido pelo ator Otávio Muller; "Seu Chalita", o sempre presente Flávio Migliaccio. A participação não menos acertada de Wladimir Brichta (Armane, amante de Fátima), Érico Brás (Jurandir, ex-marido de Sueli) e Fernanda de Freitas (Flavinha, esposa de Djalma) --dão à "Tapas & Beijos" uma graça e um frescor do verdadeiro "bom humor" que tem feito muita falta na televisão brasileira.
A direção de Daniela Braga, sob a batuta de Maurício Farias, é ágil e precisa, dando movimento e naturalidade às cenas. No roteiro de Cláudio Paiva, que tem a colaboração de Nilton Braga, não há 'forçação de barra' nem apelações para que o espectador se divirta. Os textos brotam da boca dos atores em situações divertidíssimas, interpretadas e conduzidas com a genialidade do simples.
No episódio da última terça, Fátima e Sueli resolveram fazer uso do "cipó do pajé". Uma espécie de chá alucinógeno, mal sabiam as duas o quanto. Hilário. Andréa Beltrão e Fernanda Torres "chapadas" se superaram. Genial.
"Tapas & Beijos" é daquelas séries que faz a gente ficar torcendo para que chegue logo a próxima terça, para sabermos em que tipo de situação Fátima e Sueli vão se envolver desta vez. Que bom.
Em tempos de grosserias, muita desgraça e violência estampadas na telinha quase que 24 horas por dia, um toque de classe num entretenimento de bom gosto e de humor genuíno. O atual exercício de humor mais inteligente da televisão brasileira.
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