Renato Kramer

'O fracasso traz pra gente uma visão humilde', diz Herson Capri na série 'Grandes Atores'

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"Desde que comecei com 15 anos na escolinha de arte em Curitiba (PR) eu não parei: fiz teatro colegial, amador e até experimental", disse Herson Capri no episódio de "Grandes Atores" (Viva) desta quinta-feira (26).

"Desde então, já tinha a meta de ir para São Paulo, porque lá o movimento cultural é muito maior", acrescentou. Mas aí tinha a velha questão: os amigos e a família diziam que "teatro não dá nada para ninguém, ser ator não sustenta ninguém", e criticaram quando Capri resolveu ingressar no grupo de teatro da PUC (Pontifícia Universidade Católica) ao mesmo tempo em que fazia Economia na USP (Universidade de São Paulo).

"Naquela época, eu tava topando qualquer coisa, eu queria entrar no mercado, queria conhecer as pessoas. E eu tive o privilégio de entrar no mercado profissional com o diretor Antunes Filho, ao lado de pessoas fantásticas como Lélia Abramo, Juca de Oliveira, Edwin Luisi. Numa peça que é um 'classicão', 'Ricardo II' [de William Shakespeare], embora meu papel fosse pequeno, eu engolia tudo aquilo que estava acontecendo nos ensaios, no palco, as discussões teóricas sobre Shakespeare. Foi uma escola pra mim, pra minha vida toda!", diz Capri.

Na sequência, o ator resolveu fazer testes na televisão para sobreviver, já que o teatro não rendia o suficiente. "Larguei meu emprego de economia, onde estava até ganhando bem – embora estivesse cursando apenas o segundo ano, já era chefe de seção", relembra Herson. "Aí foi que larguei tudo para seguir só com o teatro profissionalmente".

Em 1975, Capri passou em um teste na extinta TV Tupi e participou como Costa, um dono de bar, na novela "Vila do Arco" (Sérgio Jockyman). "Era bem pequeno, mas foi meu primeiro papel com fala na televisão". Foi por causa desse pequeno papel que o diretor Walter Avancini (1935 - 2001) o chamou para fazer um personagem importante na novela "Os Imigrantes", de Benedito Ruy Barbosa.

Crédito: Zanone Fraissat - 12.nov.2012/Folhapress Herson Capri na estreia para convidados da peça "A Entrevista"
Herson Capri na estreia para convidados da peça "A Entrevista"

Avancini até comprou uma briga para que fosse Herson quem realizasse o papel, que precisava saber falar italiano. "Mas eu não sei falar italiano!", objetou o ator. "Se vira!", determinou o diretor. "Se vira, de agora em diante fala só italiano. vai procurar!". "E eu fui procurar", conta Capri que viveu o Antonio Di Salvio em "Os Imigrantes" (Band).

O ator conta que fazia teatro em São Paulo quando foi diversas vezes convidado para fazer novela na Globo, mas sempre esbarrava no fato de estar em cartaz. Até que a agenda abriu espaço e ele foi para o Rio de Janeiro gravar a novela "Elas Por Elas" (1982) do Cassiano Gabus Mendes, vivendo o galã Carlos.

Na sequência veio o Fábio Marino de "Guerra dos Sexos" (1983), "para o qual eu levei um tempo pra me adaptar. Eu queria fazer comédia e me pediam para ser o certinho, o conquistador". "A coisa do galã se transforma numa pecha. Existe alguma coisa que carrega a palavra galã que lembra um mau ator e lembra um cara sem inteligência. Eu tinha um certo medo de cair nesses dois estereótipos", confessa Herson.

E explica como tirou isso da cabeça: "Mas com o tempo eu fui tirando isso de mim e fui aproveitando: se é esse papel que me dão, eu vou assumir esse papel! É galã? Tá okay, vamos lá. Se é um vilão bonitão, okay, vamos fazer! Quando eu parei de questionar esse tipo de coisa eu comecei a curtir mais. É gostoso fazer um vilão, é gostoso fazer um galã. Você tem que fazer um treinamento pra não repetir o mesmo galã que já fez, é difícil. O vilão também, não pode repetir senão fica tudo igual. E acabou se tornando um grande desafio", declara Capri.

"O fracasso traz pra gente toda uma visão humilde. Porque o ator se coloca no centro do mundo. A gente tem um lado ególatra e o ator muito mais. Quando você faz um fracasso você percebe que não é bem assim que a banda toca", observa Capri. "Você pode errar, você pode errar profundamente. O trabalho que você está fazendo é um trabalho midiático, que move tanta gente, tantos milhares de pessoas te assistindo, mas não significa exatamente que você seja maior do que apenas um ser humano. Eu acho que o exercício do fracasso e do sucesso são muito interessantes", diz Herson.

Sobre o sucesso? "É gostoso, é bom, é alegria – embora o sucesso seja uma coisa que trabalha o ego, o exercício 'sucesso e fracasso' traz uma melhor administração para o sucesso. Quando você já teve a experiência do fracasso, do mais ou menos, aí o sucesso a gente bebe com mais gosto, com mais prazer. Porque a gente sabe que ele é fugaz, que ele é temporário, ele não é pra sempre – por mais que você estabeleça uma carreira sólida, que tenha uma continuidade bacana, você pode cair de novo num fracasso, porque não depende só de você", comenta o ator.

Em "Partido Alto" (1984), trama escrita pelos feras Aguinaldo Silva e Glória Peres, Herson Capri teve a oportunidade de viver um grande vilão, o Sérgio Mota. "Ele marcou muito. Eu era parado na rua, me chamavam de assassino, ladrão! Meu filho pequeno Pedro, que agora está com 34 anos, me perguntava: pai, você é ladrão?, enquanto eu o levava para a escola".

Em 1990, foi convidado pelo então diretor Paulo Ubiratan para viver o Carlos em "Riacho Doce". Já em "Felicidade" (1991), Mário Silvano (Herson) disputava o amor da bela Helena (Maitê Proença) com Álvaro Peixoto (Tony Ramos).

Em 2006, encontrou Marília Pêra no set de "Cobras e Lagartos". "É muito bom contracenar com a Marília. Ela é muito empenhada, ela sabe tudo do personagem e da cena. Isso faz com que a gente tenha uma auto-exigência muito grande – com Marília eu tentava dar o melhor de mim, e isso é muito bom, sobe o nível da cena – ela puxa a cena pra cima. É tudo de bom!", conclui.

"Em 'Insensato Coração' (2011) eu voltei ao vilão com Gilberto Braga, que é um dos nossos mestres", declara Capri. "Em 'Sangue Bom' (2013) eu tive o prazer e o privilégio de trabalhar com uma garotada muito boa – uma nova geração de televisão: Humberto Carrão, Marco Pigossi, Fernanda Vasconcellos, Sophie Charlotte...". "Me empenhei muito para fazer um cara muito do bem em 'Em Família' (2014)", declara o ator.

O ator conta também que escapou de um câncer de pulmão, descoberto pela própria esposa e médica Susana Garcia. "Ela que cuida de mim!", anuncia Herson. "Susana é minha companheira, minha parceira, minha paixão, minha amiga, minha esposa!". "Depois desse susto me senti mais maduro em relação a tudo, fiquei até mais amoroso", declara o ator, que tem cinco filhos – Laura, 36, bióloga; Pedro, 35, diretor de cinema; Lucas, 17, terminando o ensino médio; Luiza, 13, atriz desde os 6 e o xodó da casa que é a caçula Sofia, ainda um bebê.

"Eu me acho realizado pessoalmente e profissionalmente. Eu estou muito satisfeito com a minha vida", encerra Herson Capri.

Renato Kramer

Natural de Porto Alegre, Renato Kramer formou-se em Estudos Sociais pela PUC/RS. Começou a fazer teatro ainda no sul. Em São Paulo, formou-se como ator na Escola de Arte Dramática (USP). Escreveu, dirigiu e atuou em diversos espetáculos teatrais. Já assinou a coluna "Antena", na "Contigo!", e fez críticas teatrais para o "Jornal da Tarde" e para a rádio Eldorado AM. Na Folha, colaborou com a "Ilustrada" antes de se tornar colunista do site "F5"

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