Renato Kramer

"Os Seus, Os Meus e Os Nossos" retoma o espírito do Natal

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Um filme clássico de 1968, baseado em fatos reais, trouxe uma multidão para dentro de casa nesta madrugada de domingo. "Os Seus, Os Meus e Os Nossos" ("Yours, Mine and Ours"), de Melville Shavelson, baseado no livro auto biográfico "Who Gets the Drumsticks?", de Helen Eillen Beardsley. Em 2005 foi feito um remake, protagonizado por René Russo e Dennis Quaid.

Helen (a grande comediante Lucille Ball) é uma enfermeira viúva com oito filhos. Frank Beardsley (o grande Henry Fonda, pai de Peter e Jane Fonda), um oficial da marinha, também viúvo, com dez. Eles retomam um namoro de juventude e resolvem se casar. Têm então que contar a novidade para os seus filhos, driblar as reações adversas e, por fim, arranjar uma casa que caiba essa gente toda. Para complementar, na noite do primeiro Natal que passam juntos, Helen fica sabendo que está grávida de Frank.

Não fosse baseado numa história verídica, o roteiro pareceria totalmente fantasioso. Mas é curioso observar como Helen vai dando um jeito de conquistar toda essa grande família.

"Como você consegue? Minha mulher com dois filhos e um poodle não dá conta!", comenta o juiz na hora de formalizarem os papéis. "Muito amor, um pouco de disciplina...e meu marido não reclama!", responde Helen, com o seu então décimo nono filho recém nascido no colo.

Natal é uma festa da família. Os laços são reforçados, mesmo que por uma formalidade no início, mas reforçados de qualquer maneira. E, muitas das vezes, reavaliados. Muitos são contra a eventual hipocrisia da reaproximação nas festas de fim de ano. Mas somos assim mesmo, sem um estímulo externo, dificilmente tomamos uma iniciativa desse tipo. Não temos tempo, não temos espírito, não temos coragem.

Com a maturidade vamos perceber que, por vezes, mesmo que meio forçados, esses reencontros familiares em datas especiais como o Natal são importantes. Mesmo tendo que aturar aquelas piadinhas infames do cunhado. Mesmo tendo que engolir em seco aquele pavê enjoativo que é a especialidade daquela distante tia avó.

A essência do Natal está no quesito básico utilizado por Helen Eillen em sua história tão peculiar com os seus dezenove filhos: amor. Respeito ao próximo. Compreensão. Fazer aos outros o que queremos que façam conosco. Tudo o que já sabemos há muito mais de dois mil anos, mas que temos tanta dificuldade em realizar em nosso dia a dia.

Sim, os descolados consideram tudo isso uma babaquice, claro. Da boca pra fora. Nenhum deles vive sem amor. Talvez nunca confessem para não parecerem piegas. Ora, não é incrível como os valores ficam às avessas? Quem dera todo o "mal" do mundo atual fosse a pieguice, e não a violência.

Nem tanto ao mar, nem tanto à terra. O equilíbrio é sempre bem-vindo. Podemos "lutar por um mundo melhor" - para usar uma frase já bastante desgastada, para os nossos filhos, os nossos netos, mas também, para nós mesmos. Aí, mais uma vez, está o espírito do Natal: a velha e boa "fraternidade".

Outro dia um funcionário de uma TV a cabo esteve em casa para um rápido conserto. Percebi que estava com calor e cansado. Disse-lhe que se sentasse um pouco e que lhe traria um suco gelado. "Não, eu não posso... aqui o senhor manda sentar, mas por aí não deixam... pensam que são melhores que os outros... não sabem que vamos todos pro mesmo buraco", desabafou o rapaz, que tomou o suco numa virada só.

Simples assim. Enquanto não nos dermos conta de que "vamos todos pro mesmo buraco", não haverá confraternização de Natal que chegue! Pois não foi uma das declarações essenciais do "iluminado aniversariante do dia": "Paz na Terra aos homens de boa vontade"? Será que temos andado de má vontade?!

Assim sendo, aproveitemos bem "os seus, os meus e os nossos", que é o que realmente vale nesta vida. Podemos virar o jogo. Sem medo de ser piegas... sem medo de ser feliz. Feliz Natal.

Renato Kramer

Natural de Porto Alegre, Renato Kramer formou-se em Estudos Sociais pela PUC/RS. Começou a fazer teatro ainda no sul. Em São Paulo, formou-se como ator na Escola de Arte Dramática (USP). Escreveu, dirigiu e atuou em diversos espetáculos teatrais. Já assinou a coluna "Antena", na "Contigo!", e fez críticas teatrais para o "Jornal da Tarde" e para a rádio Eldorado AM. Na Folha, colaborou com a "Ilustrada" antes de se tornar colunista do site "F5"

Final do conteúdo
  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Comentários

Ver todos os comentários Comentar esta reportagem

Últimas Notícias