Aviso
Este conteúdo é para maiores de 18 anos. Se tem menos de 18 anos, é inapropriado para você. Clique aqui para continuar.

X de Sexo Por Bruna Maia
Descrição de chapéu Todas Twitter

Ninguém aguenta mais histórias de date ruim

Impossível dar um passo na internet sem ver uma narrativa insalubre da vida afetiva e sexual

A imagem mostra uma captura de tela de uma rede social, onde um usuário compartilhou um meme com texto humorístico sobre experiências de encontros amorosos, comparando as reações de mulheres e gays. Acompanhando o texto, há uma foto de uma mulher sentada, com uma expressão facial que parece misturar desconforto e resignação
Será mesmo que ninguém aguenta mais histórias de date ruim? - @macedonna_ no X
  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Mentira. O meu título talvez tenha roubado sua atenção, mas a verdade é que as pessoas adoram histórias de encontros que deram errado. Amam contar, para dividir seu desespero de forma cômica; amam ouvir, para sentir que não estão tão sozinhas assim na precariedade afetiva e sexual.

Na verdade, quem não aguenta mais essas histórias sou eu. Sim, justo eu. "Logo você Bruna, que tanto hitou na internet falando mal de homem?" Pois é, logo eu, que acredito na importância da experiência compartilhada como forma de nomear sentimentos, elaborar trauma, fazer sociologia. Logo eu.

Veja, passo uma quantidade enfermiça de tempo da minha vida no Twitter, rede que oficialmente agora se chama X. E lá, volta e meia, aparece uma postagem em busca de engajamento que pergunta "qual foi o pior date da sua vida" ou algo similar.

Funciona, os usuários se jogam como porquinhos num chiqueiro e relatam as mais asquerosas situações. Essa semana foi assim, e eu, que já tinha silenciado os termos "date ruim" e "pior date", fui mais extrema e pus no mudo a palavra "date" de uma vez. Não que tenha funcionado. Depoimentos tão vívidos que fazem as palavras terem cheiro (ruim) seguem pulando na minha frente, alguns com fotos de provocar ânsia de vômito.

As narrativas em geral giram em torno de pão-durice, chatice ou falta de higiene –quando não englobam os três. Os protagonistas quase sempre são uma mulher heterossexual ou um homem gay que queriam transar ou, quiçá, encontrar o amor. Chegando no local, se depararam com uma pessoa enfadonha, falando mal de ex, chorando a falta de afeto materno ou paterno, reclamando do trabalho, em um monólogo com pouco interesse no que o ouvinte poderia ter para contar.

Mesmo assim, as heroínas e heróis dessa jornada decidiram que era uma boa ideia dar uma chance e ir pra casa do chatonildo. No cativeiro que o algoz chama de casa, se depararam com um cenário apocalíptico, pelos de gatos vagando em grandes bolas no chão, louça suja em cantos improváveis, privadas que nunca viram água sanitária ou mesmo aquela escovinha de limpar os restos, colchões enegrecidos por suor e poeira, lençóis que não entram na máquina de lavar nem por um decreto.

Em alguns casos, os incautos são subitamente dotados de cautela e vão embora. Em outros, decidem transar mesmo assim e constatam que a mesma sujeira da casa se aplica ao corpo. Não raro, no dia seguinte, são surpreendidos por uma cobrança. Sabe aquele suco de caixinha ultraprocessado que você tomou? Aquela bolachinha recheada que eu ofereci em que você não deu mais de uma mordida porque teve nojo? Então, dividido por dois, fica R$ 13,78 pra cada um, e mais R$ 12,15 do Uber que eu paguei, tá?

Um motivo pelo qual eu já estou farta desse tipo de história é que elas são demasiado repetitivas. Outro é que elas corroem minha libido. Mas, principalmente, elas me deixam muito triste ao constatar que sentir atração sexual por homem nos deixa sempre com medo de morrer –seja pela violência deles contra nós, seja de sepse.

Isso me faz recordar de um cara com quem tive um date ruim dizendo que nunca havia tido um date ruim. Fiquei com raiva, que é um sentimento bem assentado no meu estômago, e mandei mensagem pra ele falando que nosso date tinha sido péssimo e que era incrível que ele tivesse achado aquilo bom –e olha que, sendo justa, ele era bem asseado e cheiroso.

Ele ficou espantado, disse que havia curtido. Foi aí que eu tomei a decisão: jamais deixar de deixar muito claro todas as formas pelas quais um date foi péssimo. Então bora parar de reclamar no Twitter e começar a xingar a pessoa que fez da sua noite um filme de terror sanitário (mas xingue da segurança do seu lar, pelo zap).

Acredito piamente que uma grande corrente de pessoas mandando a real diretamente para os homens pode ter algum efeito positivo, mesmo que seja o simples fato de eles começarem a trocar lençóis.

PS: Agora vamos focar num date bom. Acredite ou não, é simples: ir em um bar em que dê para conversar, falar sobre coisas interessantes que estão rolando, demonstrar interesse pela outra pessoa; a divisão da conta vocês que sabem, mas se alguém pagar a conta inteira que não pense que isso é sinônimo de sexo garantido; lençóis limpos, privada desinfetada; camisinha sem discussão; se o parceiro tiver vulva, achar o clitóris.

X de Sexo por Bruna Maia

Bruna Maia é escritora, cartunista e jornalista. Autora dos livros 'Parece que Piorou', 'Com Todo o Meu Rancor' e 'Não Quero Ter Filhos', fala de tudo o que pode e do que não pode no sexo.

Final do conteúdo
  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Comentários

Ver todos os comentários Comentar esta reportagem