Tony Goes

Aos 89 anos, Silvio Santos persiste em ilusão de imortalidade que ameaça futuro do SBT

Suas seis filhas estão envolvidas nos negócios, mas é o apresentador quem define tudo

Silvio Santos com a plateia, em 2008

Silvio Santos comanda seu Programa do SBT ao lado de plateia feminina, em 2008 Roberto Nemanis/SBT

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​Antes de mais nada: parabéns, Silvio Santos! Chegar aos 89 anos com muito dinheiro no bolso e a admiração de milhões de brasileiros é uma façanha e tanto.

Agora vamos ao resto do texto, que não é só de aplausos ao apresentador. Porque até mesmo sua incrível resiliência e sua recusa em se aposentar podem acarretar, a médio prazo, problemas sérios para sua emissora, o SBT.

Explico. Ao longo de sua carreira, Silvio Santos construiu um império, do qual é o epicentro indiscutível. Nada funciona sem a sua permissão. Nada vai ao ar sem o seu aval.

Esta centralização exagerada já produz efeitos negativos há algum tempo. A grade do SBT, por exemplo, está quase petrificada. A emissora lançou apenas duas atrações de peso em 2019: o “Programa da Maisa” e a competição culinária “Famílias Frente a Frente”, comandada por Tiago Abravanel. Enquanto isto, na Globo, é rara a semana sem alguma novidade.

Para piorar, muito do que o SBT exibe já acumula décadas de existência, dos formatos antediluvianos aos filmes eternamente reprisados. Sem falar no tom politicamente incorreto de diversos programas da casa, passando pelo humor preconceituoso de alguns quadros de “A Praça É Nossa” e culminando no próprio Silvio, que protagoniza um festival de grosserias de tempos para cá.

Mas não é só isso. Nos últimos dias, abalado pela morte de Gugu Liberato e por uma gripe fortíssima, Silvio Santos cancelou diversas gravações. Ainda não se sabe se ele conseguirá deixar programas inéditos para o fim do ano, antes de embarcar para suas habituais férias nos Estados Unidos.

Em qualquer outra emissora, o sinal amarelo já estaria se avermelhando. Mas o SBT funciona em um outro planeta, onde a era dos animadores de auditório não terminou e a TV paga ainda não foi inventada, muito menos a internet.

Como será o SBT pós-Silvio? É impossível saber. O apresentador tem seis filhas. Todas, em maior ou menor grau, já estão envolvidas na administração de seu grupo empresarial. Alguma delas irá prevalecer no comando? 

E diante das câmeras? Patrícia Abravanel vem se firmando como uma das estrelas da casa, e seu sobrinho Tiago é uma aposta sólida para um futuro próximo. Mas nenhum deles será o próximo Silvio – até porque, como já dito, a era dos animadores de auditório acabou.

Em alguns pontos, Silvio Santos lembra um ditador (ou mesmo um líder partidário) que, sedento pelo poder, não o compartilha com ninguém. Tampouco prepara um herdeiro para substituí-lo, na ilusão da imortalidade.

O problema é que, do lado de fora, o futuro já começou. E o SBT está mal preparado para enfrentá-lo, por mais que bajule o governo de plantão.

Sem dúvidas que há espaço no Brasil para uma TV de apelo popular. Em que até a falta de apuro técnico seja compensada por uma comunicação direta com o espectador. O SBT cumpriu este papel durante muito tempo, mas corre o risco de ser deixado para trás.

Para concluir: parabéns, Silvio, mais uma vez. Vida (ainda mais) longa para você. E também para o SBT – que, um dia, terá que caminhar por conta própria.

Tony Goes

Tony Goes (1960-2024) nasceu no Rio de Janeiro, mas viveu em São Paulo desde pequeno. Escreveu para várias séries de humor e programas de variedades, além de alguns longas-metragens. Ele também atualizava diariamente o blog que levava seu nome: tonygoes.com.br.

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