Tony Goes

De menino assustadiço a mulher exuberante: Nany People conta trajetória em livro

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"Ser Mulher Não é Para Qualquer Um" é a autobiografia de Nany People, escrita em parceria com Flavio Queiroz. Talvez seja mais preciso dizer "anotada por": Flavio conseguiu captar a voz de Nany, que quase salta da página impressa.

Digo isto porque convivi um pouco com ela no primeiro semestre deste ano, durante as gravações de "Partiu Shopping" —a série do Multishow estrelada por Nany e Tom Cavalcante, para a qual eu escrevi alguns roteiros. Aliás, qualquer um que a conheça, da TV ou da vida real, vai ter a nítida sensação de escutá-la ao ler o livro. O ritmo da fala, os bordões, as exclamações, está tudo lá.

Também estão todos os episódios marcantes de uma vida movimentadíssima, que começou de maneira simples no interior de Minas Gerais e chegou ao estrelato em nível nacional. Mais do que merecido, porque Nany People é um dínamo: transborda energia e bom humor.

Também é uma das atrizes mais profissionais com quem eu já trabalhei. Disciplinada e pontual, chega sempre com o texto decorado —o mesmo texto que ela irá pontilhar de improvisos engraçadíssimos, todos pertinentes à intenção original.

Crédito: Ze Carlos Barretta - 13.abr.2015/Folhapress Nany People
Nany People

Mas sua trajetória não foi fácil. A de nenhum transexual é: mesmo com o talento com que nasceu e as oportunidades que soube aproveitar, Nany enfrentou toda a gama de obstáculos que atazanam as meninas que nascem com corpo de menino, ou vice-versa.

O maior desses problemas foi, provavelmente, com ela mesma. Apesar de desmunhecar desde criancinha, Jorge —seu nome de batismo— demorou para se aceitar como uma mulher trans. Nem mesmo a criação da "persona" Nany People, há cerca de vinte anos, acelerou este processo. Durante muito tempo, os dois conviveram: Jorge de dia, com roupas masculinas, e Nany à noite, "montada" como uma das drag queens mais espalhafatosas que este país já viu.

Hoje Nany não é mais drag. É mulher 24 horas por dia: colocou peito, colocou bunda, não sai de casa sem um mínimo de produção (a bem da verdade, nem sozinha em casa ela fica sem um realcezinho que seja). Conseguiu usar o nome social em alguns documentos e cartões de crédito. E tornou-se não uma atriz transgênero, mas simplesmente uma atriz. E das boas.

Este foi o pulo do gato de Nany. Ela conseguiu romper a barreira que prende a maioria de suas colegas ao universo LGBT, fazendo shows em boates e vivendo meio à margem do resto do showbiz. Graças às suas aparições na TV e ao apoio de padrinhos como Goulart de Andrade e Hebe Camargo, Nany People saiu da noite e virou a trans da família brasileira. Aquela que a sua mãe conhece, e adora.

O livro fala disso tudo, e muito mais. Inclusive dos casos que Nany teve com jogadores de futebol e de suas três grandes paixões, a quem ela chama de "Huguinho", "Zezinho" e "Luisinho". Tão elegante que nem cita o nome de ninguém...

Fofocas à parte, o que realmente interessa é sua trajetória de menino assustadiço a mulher exuberante. Mas a história de Nany People vai além da conquista da feminilidade. "Ser Mulher Não é para Qualquer Um", na verdade, conta como ela se tornou não uma mulher —mas, como seu próprio nome sugere, uma pessoa. Plena, inteira e dona de si mesma.

Tony Goes

Tony Goes (1960-2024) nasceu no Rio de Janeiro, mas viveu em São Paulo desde pequeno. Escreveu para várias séries de humor e programas de variedades, além de alguns longas-metragens. Ele também atualizava diariamente o blog que levava seu nome: tonygoes.com.br.

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