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Thiago Stivaletti

Há 25 anos, o brasileiro procura a famigerada pergunta do milhão

Enquanto Luciano Huck faz perguntas que assustam até o povo de Harvard, Patrícia Abravanel herdou o dom do pai para o suspense e a tortura

A imagem mostra dois apresentadores de televisão. À esquerda, uma mulher com cabelo longo e castanho, vestindo um blazer branco, sorrindo e com as mãos unidas na frente. Ao fundo, há outras pessoas e um cenário azul. À direita, um homem com cabelo curto e grisalho, usando uma camisa branca e um colete cinza, segurando uma caixa com notas de dinheiro. O fundo é decorado com elementos gráficos coloridos.
No SBT, perguntas são mais básicas; a Globo tem questões elaboradas em sua prova de conhecimentos gerais - SBT/Globo
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Há 25 anos, o brasileiro adquiriu um vício que já era moeda corrente no mundo: os programas de perguntas e respostas. No dia 7 de novembro de 1999, Silvio Santos estreava no SBT o Show do Milhão, programa que teve algumas temporadas irregulares e voltou este ano comandado por sua filha, Patrícia Abravanel.

A oferta anda redobrada porque, ao mesmo tempo, Luciano Huck voltou com seu quadro "Quem quer ser um milionário?" no Domingão. Para quem acompanha a programação de QI abaixo da média na TV aberta, especialmente aos domingos, não dá pra reclamar das duas atrações.

Elas têm um quê de TV Cultura, espalhando conhecimento e informações relevantes ao espectador. E também são muito mais inocentes do que as bets que andam devorando o bolso até dos cidadãos do Bolsa Família.

Minha brincadeira da semana foi assistir alguns episódios dos dois formatos para encontrar diferenças. Os programas não negam o DNA de cada emissora. No SBT, as primeiras perguntas do Show do Milhão são bem mais básicas do que no concorrente, do nível "Complete o ditado: cão que late não..." ou "Qual destes itens não é usado por uma costureira?" (Resposta: anzol). A emissora sabe que fala com um público um pouco menos escolarizado que o da concorrente.

Já a Globo ostenta o seu padrão de produção: um estúdio bem mais bonito e descolado, câmeras dando belas panorâmicas em torno de Huck e do concorrente da vez. Mas não é preciso nem estar perto do milhão para encarar umas perguntas que deixariam em dúvida até os doutorandos de Harvard. Exemplo: "Qual contribuição de Albert Einstein deu a ele o Nobel de Física em 1921?" (Resposta: Lei do efeito fotoelétrico. Usando uma bela intuição, não é que o garoto de 19 anos acertou?)

No quadro do Huck, também tenho um fetiche mórbido: ver homens héteros cultíssimos, advogados e engenheiros, que sabem absolutamente tudo de futebol, rodarem nas perguntas de... novela. "Em qual novela Claudia Raia viveu a personagem Jaqueline Maldonado?", e o pobre rapaz tem que ligar para a avó, a única detentora de tamanho saber na família. (Resposta: o remake de "Ti-Ti-Ti").

Mas vamos ao que interessa: falar dos nossos queridos apresentadores. Luciano Huck treinou por anos a simpatia televisiva de conversar com seus competidores e tirar deles algumas histórias interessantes, daquelas que nos dão mais vontade de torcer pela pessoa.

Mas Patrícia Abravanel herdou algo mais importante do pai, que por sua vez tomou emprestado do grande Alfred Hitchcock: o domínio do suspense.

Assim como fazia o grande Silvio, que eternizou o bordão "Está certo disso?" enquanto a trilha de alta tensão bombava ao fundo, Patrícia sabe esticar a corda por quase cinco minutos nas perguntas mais delicadas. "Tem certeza? Eu acho que a resposta certa é a C. Mas acho que você não tem que ir na minha... tem que ir na sua", diz ela, com requintes de tortura. Impossível mudar de canal enquanto a resposta não sai.

No mais puro suco de SBT, também é um prazer ver Patrícia empolgada na abertura de cada programa exclamar: "Será que alguém hoje vai vencer esse desafio?!", sendo que a única vez que alguém ganhou o famigerado milhão foi em 2003: Sidiney de Moraes, funcionário público aposentado de Mato Grosso do Sul, acertou em que dia nasceu e em que dia foi registrado o presidente Lula, ainda em seu primeiro ano de mandato (resposta: 6 e 27 de outubro).

A prova da superioridade moral do SBT nessa seara pode ser traduzida em apenas um nome: Casimiro. O youtuber e influenciador ama postar vídeos comentando o Show do Milhão do início ao fim, como a galera mais jovem costuma fazer com seus games.

Se você está solitário em casa, Casimiro faz o papel daquela sua vó que comenta cada detalhe, do cabelo ao jeito de falar da competidora, chuta alto cada resposta e urra de alegria cada vez que um cidadão de inteligência mediana acerta uma pergunta cabeluda. Se depender dele, o Show do Milhão voltou para ficar.

Thiago Stivaletti

Thiago Stivaletti é jornalista e crítico de cinema, TV e streaming. Foi repórter na Folha de S.Paulo e colunista do UOL. Como roteirista, escreveu para o Vídeo Show (Globo) e o TVZ (Multishow).

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