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Thiago Stivaletti

Rodrigo Faro brilha acima dos defeitos de 'Silvio'

Ator e apresentador se sai bem ao retratar um Silvio Santos que não conhecemos na TV: angustiado, arrependido e cheio de dúvidas

Cena do filme 'Silvio' com Rodrigo Faro - Divulgação
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São Paulo

Para entrar em "Silvio", o filme, é preciso superar a primeira cena em que Rodrigo Faro aparece de peruca acaju e muita maquiagem na pele de Silvio Santos. O choque é inevitável: Faro também é apresentador e conhecido do grande público, e vê-lo representando outro apresentador, muito mais conhecido que ele, provoca uma rejeição imediata.

Basta uma segunda cena para Faro nos lembrar que já foi ator de TV, presente em ao menos 11 novelas, na Globo e na Record. Ele rapidamente expulsa qualquer ridículo ou patético de uma imitação pura e simples do dono do SBT, morto no último dia 17 de agosto.

Prefere investir numa maneira assertiva de falar, um jeito de comunicador que impunha autoridade a qualquer interlocutor, até mesmo um sequestrador. As mãos se movimentam como Silvio fazia em seu programa, mas num modo econômico.

"Silvio" poderia ser uma celebração feliz do maior apresentador de TV do Brasil, mas prefere se concentrar num dos episódios mais surreais das páginas policiais brasileiras: Fernando Dutra Pinto, um jovem de 22 anos, sequestrou uma das filhas de Silvio, Patricia, na porta da mansão da família no Morumbi, em agosto de 2001. Soltou-a depois de uma semana. Perseguido pela polícia, matou dois policiais e voltou à casa de Silvio, dessa vez para fazer o apresentador de refém. Ficou sete horas com ele.

O desafio de Faro não é pequeno: pegar um ícone da TV do qual o público conhece o lado solar, a alegria, a confiança, o carisma, e imaginar um outro lado, que nunca foi mostrado: o da angústia, da dúvida, do medo da morte, da rejeição familiar.

O filme começa com Patricia sendo solta. Passa rapidamente pela perseguição policial a Fernando. E se concentra nas sete horas que Silvio passou ao lado do sequestrador. Imagina tudo aquilo que podem ter conversado, enquanto do lado de fora rola uma negociação tensa envolvendo Polícia Civil, Polícia Militar e o governo do estado, à época nas mãos de Geraldo Alckmin.

Ao longo dessa conversa, Silvio relembra a Fernando toda a sua história, do início como camelô na Lapa carioca, o primeiro emprego como locutor na Rádio Guanabara até a criação do SBT. E a idolatria pelo apresentador Manoel da Nóbrega, de quem herdou (e salvou) o Baú da Felicidade.

O filme até que vai bem no "presente", nesse tenso diálogo entre Silvio e Fernando, mas perde bastante força nos flashbacks, tendo mais dois atores à frente –um para o Silvio adolescente e outro na casa dos 30, quando começa a aumentar sua fama. O esforço em resumir uma história tão longa num punhado de cenas torna os diálogos muito explicativos, e a direção, sem muito ritmo, assume um tom de série ruim.

É nesse flashback que uma das histórias ganha tom de melodrama: a da primeira mulher de Silvio, Cidinha, que morreu de câncer de estômago aos 39 anos, deixando as duas primeiras filhas do apresentador, Cíntia e Silvia. Silvio aparece arrependido de como era imaturo nesse primeiro casamento, escondendo a mulher do público para reforçar a imagem de galã. Também sonha em conseguir o perdão de Cíntia, que se afastou dele depois do casamento com a segunda mulher, Iris.

Na parte do sequestro, o único real problema é a insistência em reforçar a imagem do Silvio herói, que faz de tudo para proteger e poupar a vida do sequestrador, numa série de atitudes que parecem bem distantes do que ocorreu. Esse mesmo herói sem defeitos aparece na saída da Globo e na criação do canal 11, futuro SBT.

Silvio, o personagem, chega a dizer que nem queria ser dono da própria emissora, mas "os homens gananciosos fecharam as portas pra mim" –como se um empresário bem-sucedido tivesse brotado sem querer da alma de um artista injustiçado pelos patrões. Já a presença de Alckmin no local do sequestro, que envolveu até a secretária de gabinete do governador, fã ardorosa de Silvio, rende um dos melhores momentos do filme.

Em resumo: "Silvio" não chega a ser um bom filme, e só deve agradar quem for com as expectativas muito baixas –ou aos fãs incondicionais de Silvio Santos. Mas o trabalho de Rodrigo Faro, fugindo dos clichês mais evidentes, eleva nuns tantos degraus o resultado final.


"Silvio"
Direção: Marcelo Antunez. Com Rodrigo Faro, Johnnas Oliva, Paulo Gorgulho
Estreia nessa quinta (12) nos cinemas

Thiago Stivaletti

Thiago Stivaletti é jornalista e crítico de cinema, TV e streaming. Começou a carreira como repórter na Folha de S. Paulo e foi colunista do portal UOL. Como roteirista, escreveu para o Vídeo Show (Globo) e o TVZ (Multishow).

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