Aviso
Este conteúdo é para maiores de 18 anos. Se tem menos de 18 anos, é inapropriado para você. Clique aqui para continuar.

Thiago Stivaletti

Prêmio da Música Brasileira: improviso de Tony Tornado compensa overdose de Regina Casé

Apresentadora cansou ao não sair do palco por três horas; expoente da soul music mostrou energia e voz intacta aos 94 anos

A imagem mostra um cantor negro e vestido com uma roupa branca, com microfone na mão em um palco
Tony Tornado no Prêmio da Música Brasileira - premiomusicabr no Instagram
  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Todo ano, o Prêmio da Música Brasileira, que acontece há 31 anos no Rio de Janeiro, vai melhor no quesito "música" do que no quesito "prêmio". A cerimônia começou com quase uma hora de atraso, foi arrastada ao extremo, e seus problemas fariam arrepiar os produtores do Oscar ou do Grammy.

Neste ano, foi a vez de Regina Casé esgotar todo o seu carisma como mestre de cerimônia, sem sair do palco nem por um minuto para tomar um copo d’água, contando histórias longuíssimas sobre o homenageado Tim Maia e anunciando quase todos os premiados da noite. Cansativo para ela e para quem assistiu.

Em outras palavras: esta é uma cerimônia cheia de sobras que ficaria muito melhor com uma hora a menos –e gordura é o que não falta pra queimar. Mas dê-se o desconto: talvez a sensação de tédio seja maior em quem assiste pela TV do que à plateia do Municipal do Rio, que é recompensada com a presença ao vivo dos artistas no palco. Nem o silêncio dos vencedores, que jamais têm direito a discurso de agradecimento, torna a coisa mais ágil.

Os roteiristas do Grammy ainda ficariam chocados com uma invenção brasileira: o palco para o patrocinador. O diretor de um grande aplicativo de entrega entregou prêmio e contou como Tim Maia marcou a história da sua família, enquanto bailarinos de palco rebolavam com caixas de entrega com a marca do patrocinador. Foi o momento "meu Deus, onde é que isso vai parar?".

Mas vamos ao que interessa: a música. Se o prêmio de José Maurício Machline tem um mérito, é o de fazer artistas jovens e veteranos criarem com pouco tempo de ensaio uma nova versão para os sucessos do homenageado da vez. Com poucas exceções, as novas versões de Tim Maia mostraram que sua grandeza permanece intacta mais de 25 anos depois da sua morte em 1998, apesar da personalidade controversa e politicamente incorreta para tempos millennials. E foram os artistas pretos que comandaram o show, honrando a herança do Síndico.

Grávida de cinco meses, com barrigão à mostra, Iza mostrou por que é uma das maiores vozes do Brasil ao renovar "Imunização Racional" numa versão soul suave, ao lado de duas revelações baianas, Melly e Rachel Reis. De chapéu, óculos de sol, calça e terno de veludo vermelho, num estilo Ozzy Osbourne, Marisa Monte aumentou a aposta da orquestra de sopros para "Você", sem medo de exagerar nos agudos, fazendo a plateia cantar à capela no final. Foi arrebatador. Num dos duetos mais aguardados da noite, Simone e Ney Matogrosso não arriscaram muito, mas também não fizeram feio com "Azul da Cor do Mar" e "É Primavera (Vai Chuva)". E Xamã, o boy do momento, cantou com a voz idêntica a Tim Maia no dueto de "Eu Amo Você" ao lado de Céu, mais pro final do evento.

Mas o grande momento da noite veio de um amigo de Tim Maia, hoje com 94 anos e vozeirão intacto. Tony Tornado subiu pra apresentar "Sossego" ao lado de Sandra de Sá, Negra Li e Sued Nunes e não precisou de nenhuma ajuda para cantar no mesmo nível delas. Aplaudido de pé, ele improvisou, quebrou o protocolo e cantou seu maior sucesso, "BR-3", fazendo as colegas de backing vocals de luxo. Foi a prova de que o prêmio ganha mais em homenagear os artistas vivos do que os mortos.

Como não dá para todo mundo brilhar, houve também os números flopados da noite. Silva e Zélia Duncan baixaram a energia de "Dia de Domingo" ao piano. Sem voz, Cida Moreira massacrou "Me Dê Motivo" ao piano ao lado do rapper Rico Dalasam. Mas o pior ficou para o encerramento. Sempre sem noção, Pedro Sampaio mandou uma versão timbalada pavorosa de "Não Quero Dinheiro (Só Quero Amar)" com Xande de Pilares e Márcio Victor do Psirico. Foi de tirar o sono.

Prometidos pelos produtores, Seu Jorge e Gloria Groove não deram as caras no palco. E Margareth Menezes, que deveria cantar ao lado de Sandra de Sá e Tony Tornado, preferiu subir só pra dar uma saudação rápida na pele de ministra. Será que achou que ia pegar mal? Bobagem.

E quanto ao Prêmio em si... não importa muito quem ganha. Pode ser um fantasma dos anos 90, como Falamansa ou É o Tchan, algum artista mais erudito como Rosa Passos ou uma dupla pop como Maiara e Maraísa. O importante é valorizar todos os talentos e mostrar que a música brasileira vale a festa. Mesmo com toda a enrolação da festa, ela nunca é perda de tempo.

Thiago Stivaletti

Thiago Stivaletti é jornalista e crítico de cinema, TV e streaming. Começou a carreira como repórter na Folha de S. Paulo e foi colunista do portal UOL. Como roteirista, escreveu para o Vídeo Show (Globo) e o TVZ (Multishow).

Final do conteúdo
  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Comentários

Ver todos os comentários Comentar esta reportagem