Galvão Bueno: 'Não tenho por que pedir desculpas ao Neymar'
Cafu sugere que narrador peça perdão por ter criticado craque, que se recusou a participar do documentário sobre o locutor
Neymar Jr. é um dos quatro convidados a participar do documentário Olha o Que Ele Fez, sobre a trajetória de Galvão Bueno, que se recusou a dar seu depoimento à produção disponível no GloboPlay.
Os demais foram Renato Maurício Prado, com quem Galvão discutiu diante das câmeras do Bem Amigos, no SporTV, Nelson Piquet, que nunca foi gentil ao falar sobre o narrador, e Luís Felipe Scolari, o Felipão, que não conversa com Galvão desde a edição do Jornal Nacional em que ele resumiu a vergonha do placar de 7 x 1 para a Alemanha, na derrota que tirou o Brasil da Copa de 2014.
Daí porque a recusa de Neymar em participar do documentário é a mais surpreendente entre as quatro. Ao comentar as críticas que já fez a vários atletas durante as transmissões, Galvão pede para se desculpar pessoalmente com Zinho, com quem acredita ter sido injusto no passado.
O encontro entre os dois é um dos pontos altos do documentário, ainda no primeiro episódio. No quinto e último capítulo, disponibilizado pelo GloboPlay nesta quinta-feira (25), Cafu diz que Neymar foi duramente criticado por Galvão, "de maneira brutal, que não deveria acontecer". "Às vezes", segue Cafu, "a gente fala coisas pro Brasil inteiro ver, e quando pede desculpas, pede desculpas individualmente. Pede desculpas pro Brasil inteiro ver também, Galvão", sugere o ex-jogador.
Corta para Galvão, que fala sobre o assunto em outro cenário, longe de Cafu: "Vou pedir desculpas pro Neymar por quê?", reage o narrador. "O que é que eu fiz pro Neymar que não tenha sido criticar a situação dele dentro de campo em algum momento? Muito mais do que a atuação dele como jogador, o comportamento dele dentro de campo, e pra mim só interessa o comportamento do jogador dentro de campo, eu não tenho nada a ver com a vida particular de ninguém. Agora, que ele teve comportamentos infantis, às vezes discussões desnecessárias, exposição desnecessárias... Eu não acho que eu tenha que pedir desculpas pro Neymar, Cafu."
O assunto começa quando Caio Ribeiro questiona se a relação de Galvão com Neymar poderia ser diferente, em uma conversa gravada, segundo o documentário, na véspera do jogo entre Brasil e Croácia na Copa do Qatar.
"Eu até gostaria que fosse diferente", começa Galvão, enumerando que narrou 53 partidas da seleção brasileira e 94 gols desde 1990. "Ele não deve ter gostado de alguma coisa, mas ele nunca foi pra rede social pra me responder nada, porque eu nunca ataquei ele, nunca ofendi, às vezes passa, [alguém] a família escreve uma bobagem, eu acho ele um grande jogador."
A edição então mostra uma série de lances em que Galvão criticou a atuação do craque em campo, incluindo as vezes em que Neymar era acusado de simular queda para garantir a cobrança de faltas aos adversários ou pênaltis. "O Neymar não está no equilíbrio normal dele", diz o narrador em uma das ocasiões. "Eu não vou dizer que nós brasileiros esperávamos muito, mas muito, mas muito mais do Neymar nesses dois primeiros jogos; o mundo esperava", fala em outra situação.
"Não aceitar uma opinião diversa da tua é um problema mundial, não é um problema do Neymar ou do Galvão", opinou Ronaldo Nazário. "Eu sou de uma criação onde aprendi muito apanhando, e cada vez que eu apanhava, aquilo me criava uma casca cada vez mais grossa pra eu poder me defender, mas nunca tive essa intolerância de opinião a ponto de romper uma relação de amizade ou de trabalho", concluiu.
Também ouvido pela produção, o jornalista Flávio Gomes diz que "Neymar não é amigo do Galvão porque o Neymar é bobo, porque o Neymar não sabe receber críticas".
VALE A PENA VER
Em cinco episódios, o documentário Olha o Que Ele Faz vale a pena ser visto. A edição não omite as explosões --por vezes grosseiras, justificadas pela busca da perfeição--, que norteiam o ritmo e adrenalina de Galvão nos bastidores da cabine de transmissão de tantos eventos esportivos. Naquele backstage, palavrões, celulares e até monitor de TV voam livremente, e quem não quiser ser contagiado pela tensão dele, que saia de perto.
Arnaldo Cézar Coelho conta que quando o via muito calmo, procurava um motivo para discutir.
O doc focaliza ainda o alcance que sua voz teve, ao longo de quatro décadas, para enaltecer e derrubar ânimos, a depender do que dizia, e o pedido de desculpas a Zinho exemplifica de modo visceral o tamanho e a importância de sua voz para formar uma opinião nacional diante da imagem de cada um.
A edição tampouco se esquiva de lembrar daquele momento em que estádios inteiros gritavam "Cala boca, Galvão" ou "Hei, Galvão, vai tomar no c...", incluindo uma ocasião em que ele tentava reportar algo ao vivo, na tela da Globo, enquanto o coro de xingamento era ouvido ao fundo, desconcertando seu discurso.
Evidentemente, os depoimentos falam muito sobre sua amizade com Ayrton Senna, que para alguns ultrapassou de modo inadequado os limites das boas relações profissionais. Ex-parceiro de microfone, Reginaldo Leme lembra como Galvão perdeu um pouco os pés do chão ao se relacionar de modo mais próximo com o universo grandioso e milionário de Senna.
O acidente em San Marino, na Itália, e a notícia da morte, dada por Roberto Cabrini, completará 30 anos em 2024, sendo ali relembrado em detalhes, com testemunho de Rubens Barrichello, que se acidentou na mesma pista, na véspera da morte do tricampeão.
A direção de Sidney Garambone e Gustavo Gomes se livra, dessa forma, de ser acusada de chapa branca, expondo um profissional sem pares na arte de levar emoção ao público nas narrações esportivas, sem omitir seus constantes ataques de fúria, sua vaidade e um ego à altura de tanta fama, o que batiza até um dos episódios.
Para quem vive e aprecia fortes emoções, é um programa e tanto, acrescido das vitórias e derrotas que ajudam a contar parte da história do país nos últimos 40 anos.
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