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Zapping - Cristina Padiglione
Descrição de chapéu pantanal

'Pantanal': estupro de Alcides só ficará claro nos próximos capítulos

Apontada como violenta no Twitter, sequência mal sugeriu agressão sexual e sublinhou o trauma da tortura

Murilo Benício em cena com Juliano Cazarré
Murilo Benício e Juliano Cazarré na tão esperada cena de estupro de Alcides por Tenório - Reprodução Globo
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São Paulo

Boa parte da percepção de choque difundida pelos espectadores da novela "Pantanal" via Twitter sobre a cena em que Tenório (Murilo Benício) estupra Alcides (Juliano Cazarré) veio na esteira da informação de sites e jornais sobre o que realmente aconteceria naquela tapera em que o vilão amarrou o peão antes de jogar Maria (Isabel Teixeira) para o lado de fora da porta da cabana.

A não ser por uma frase sarcástica de Tenório --"agora eu que tô namorando"--, não houve qualquer evidência da violência sexual praticada na ocasião. Tampouco Maria consegue perceber o que realmente aconteceu.

O que se mostrou foi um pedaço de madeira aquecido na fogueira, com o qual Tenório bateu em Alcides. Ele grita uma vez, e grita de novo quando supostamente é penetrado, mas ninguém vê o que de fato ocorreu.

A violência que assombrou parte da plateia nas redes sociais esteve muito mais no processo de tortura psicológica a que Tenório submete a ex-mulher e seu atual companheiro, sendo mais verbal do que física. Quem não leu nada sobre o assunto antes de dar de cara com a cena mal entendeu o que ocorreu.

O que vimos foi um cano de revolver ameaçando ambos, o porrete que agride Alcides e a imobilização do casal por meio de cordas (que sempre aparecem em cabanas e taperas aparentemente abandonadas nessa hora, pelo menos na ficção).

Nos poucos capítulos que restam a seguir, antes que Alcides dê fim em Tenório, alguns diálogos deixarão mais claros o que de fato ocorreu na tapera, principalmente em conversas entre o peão e Zaquieu (Silvero Pereira).

Para a vítima e seu algoz, o estupro foi uma solução pior do que a ameaçada castração, o que só traduz a visão de dois homens moldados pelos valores do machismo vigente na cultura mundial, com ênfase para o universo rural brasileiro. Uma mutilação física, afinal, deixaria marcas irreversíveis e de maior profundidade do que um ato circunstancial como o que ocorreu, em que as cicatrizes são de ordem exclusivamente psicológica.

E como acontece com qualquer estupro ou abuso sexual, o agressor aposta na vergonha da vítima em denunciá-lo, o que só motiva reflexão em um público que sentiu o peso do desconforto da sequência que, a meu ver, e na contramão de muitas críticas, não foi em vão nem desnecessário, especialmente em um país onde a tortura é tantas vezes relativizada.

Zapping - Cristina Padiglione

Cristina Padiglione é jornalista e escreve sobre televisão. Cobre a área desde 1991, quando a TV paga ainda engatinhava. Passou pelas Redações dos jornais Folha da Tarde (1992-1995), Jornal da Tarde (1995-1997), Folha (1997-1999) e O Estado de S. Paulo (2000-2016). Também assina o blog Telepadi (telepadi.folha.com.br).

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