A incômoda pergunta 'você não vai ter filho?'
Cobranças sobre maternidade recaem só sobre as mulheres
Ter ou não ter filhos é uma das questões que mais mexe com a sociedade e atinge diretamente as mulheres. Há quem siga o caminho da maternidade, mas há também aquelas que pensam exaustivamente sobre o tema, decidem por não ser mãe e são extremamente felizes, como é o caso da apresentadora Ana Paula Padrão, cuja postagem em redes sociais no Dia da Criança acalorou os debates na última semana.
Ela diz que não teve filhos, conta sua história em busca da maternidade e afirma que é feliz, completa, o que muita gente pensa não ser possível. Ana Paula é uma exceção, que vem crescendo.
Há ainda muitas mulheres que optam pela não maternidade, ou porque escolheram este caminho sem fazer reflexões muito profundas ou porque realmente não conseguem engravidar, desistem e acabam entristecidas.
Nos dois casos —e até mesmo no de quem já teve filho— a cobrança da sociedade em torno da maternidade compulsória incomoda demais as mulheres.
A pergunta: “Você não vai ter filhos?” não é fácil ou agradável de ser ouvida em nenhuma das situações já citadas. Ter ou não ter filhos é uma questão totalmente íntima, que deve ser definida por um casal e, especialmente, pela mulher dona do corpo que vai ser modificado, e não na mesa do jantar dos pais, dos sogros ou na casa de parentes curiosos. É um debate a ser feito consigo, na terapia ou com quem se confie.
É incompreensível que, em pleno século 21, mulheres ainda tenham que ouvir coisas do tipo. Devemos combater essa cobrança, além de despertar nas mais jovens a reflexão profunda sobre a coragem de ser ou não ser mãe.
No entanto, o debate para por aí. Quando se começa a lamentação sobre o quanto é difícil ser cobrada pela maternidade, esquece-se de quem já é mãe e sofre, diariamente, o peso de ter que criar um filho —amado e escolhido— em um mundo cada vez mais difícil.
Ouvir a infame pergunta sobre a futura gravidez não é nada se comparada às mudanças de corpo e humor, privação de sono, perda de amizades, abandono, solidão e responsabilidade que só a maternidade traz a quem escolheu este caminho.
Não há mão estendida, não há compreensão, não há companheirismo —nem do companheiro neste momento, que dura muito. Dura uma vida.
Eu já estive do outro lado e já fui cobrada sobre quando o bebê viria. Também fui cobrada sobre quando teria o segundo filho.
Em todos os casos, ouvi e respondi pacientemente. A vida era minha, a decisão era minha. A reflexão e a coragem sobre a maternidade também eram minhas. E eu tinha certezas. Penso sobre maternidade desde que tenho 17 anos e sou extremamente feliz com minhas duas meninas.
Com isso, posso dizer com toda convicção do mundo: ser mãe em meio a uma sociedade ainda machista e patriarcal, que não respeita direitos de mulheres e crianças, que nos reduz a reprodutoras e defende a maternidade compulsória é que é extremamente difícil.
Ainda mais no Brasil e em meio a uma pandemia. O resto é pergunta retórica. Dá para ouvir.
Comentários
Ver todos os comentários