Taís Araújo: 'Em 25 anos de TV Globo, nunca tive uma troca como agora'
Atores negros de 'Cara e Coragem' celebram espaço de colaboração com autora e diretora
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Uma das protagonistas de "Cara e Coragem", novela de Cláudia Souto que estreia no dia 30, Taís Araújo endossou e ampliou um desabafo feito pela atriz Cláudia Di Moura, que estará no mesmo folhetim, sobre o avanço da representatividade negra no audiovisual. As duas falaram sobre a disposição da autora e da diretora, Natália Grimberg, ambas brancas, em escutar o que os atores negros do elenco têm a dizer sobre vivência negra, permitindo que cenas, figurinos e outros itens sejam acrescentados à produção.
"Sou fruto de uma dramaturgia que eu assisti desde pequena, do patriarcado branco", reconheceu a autora da novela das sete. "Eu abro o espaço, mas eu não entendo [sobre as laces/apliques usadas por Taís Araújo em cena]. É tudo muito novo para mim. E eu agradeço muito a Cláudia Di Moura, Taís, Ícaro [Silva]", afirmou Souto, desculpando-se por ter se emocionado neste momento.
A conversa aconteceu durante uma entrevista coletiva virtual promovida pela Globo na manhã desta segunda-feira (16) com parte do elenco e a presença da autora e da diretora.
"Estou tendo a oportunidade de vocês me ensinarem, porque a gente está construindo isso junto. Todos nós achamos absurdo isso. É absurdo a gente olhar para o nosso país e eu ainda estar aprendendo com vocês, eu não ter aprendido antes. O bom é que é obra aberta e eu posso voltar em algumas coisas. Ícaro tem me trazido coisas incríveis. Taís tá me ajudando bastante. A gente espera mudar um pouco essa visão, não é revolucionar nada, mas dar um passo adiante."
Para Taís Araújo, o fato de a novela ser comandada por duas mulheres conspira a favor de uma escuta que, para ela, nunca foi tão grande. "Eu tenho 25 anos de TV Globo, e é muito bom ver uma autora com essa disponibilidade de entender que os atores também são autores, a diretora também é autora, a figurinista também é, todo mundo está na composição", disse Taís.
"Cláudia [Souto] é uma mulher que está vivendo o seu tempo plenamente. Em 25 anos de TV Globo, nunca tive, nesse nível, uma troca como agora, de dizer: 'isso ou aquilo não é minha vivência'. Isso é um grande passo na dramaturgia, um grande passo na nossa história, e acho que isso é possível porque são duas mulheres no comando", completou.
NA CONTRAMÃO DO ESTEREÓTIPO
A conversa sobre representatividade negra começou a partir de uma descrição de Cláudia di Moura sobre sua personagem, Martha, uma mulher rica, o que por si já representa um marco nos figurinos da atriz, habituada à opressão normalmente reservada aos papéis entregues a atores negros.
"A gente tá sendo ouvido, é uma mulher branca escrevendo uma narrativa, mas esse núcleo preto tem palavra e nós estamos sedo ouvidos, isso pra mim é um marco histórico no audiovisual brasileiro", disse a atriz, que emocionou elenco e equipe com a descrição de Martha:
"A Martha é um aperitivo do que o povo preto tem de direito negado ao longo desses séculos. Ela tem riqueza material, empoderamento emocional, é uma mulher que leva uma vida sem medo. Obrigada, Claudia", disse a atriz, em agradecimento à autora, sua xará.
Di Moura continua: "Que bom que essa narrativa chegou pelas mãos de uma mulher. Essa família Gusmão é rica de nascença. [...] 56% do meu povo preto vai dizer: 'eu quero estar refletido nessa mulher'. A família Gusmão é a encarnação de uma justiça social que a gente não vê, mas vem reivindicando. A sensação que tenho é que estamos vivendo um novo tempo. Obrigada a essas mulheres que estão com a escuta. Esse é um acolhimento que nos faz sentir que está existindo uma troca. A gente está sendo ouvido. Ela não está escrevendo só. Esse núcleo preto tem palavra e nós estamos sendo ouvidos. Isso é um marco no audiovisual brasileiro."
A atriz lembra que o fato dessa família da ficção viver sem aflição "é o sonho de todos nós". "Essa família usufrui das benesses do capital. A família Gusmão não precisa acordar às 4h da manhã pra ligar as máquinas. A gente dorme o sono dos justos, sem culpa."
A novela tem o núcleo de atores negros representando os mais ricos da trama, a família Gusmão, dona da Siderúrgica Gusmão, composta por Clarice (Taís Araujo), Leonardo (Ícaro Silva) e a mãe deles, Martha (Cláudia Di Moura). O elenco conta ainda com Paulo Lessa entre os protagonistas.