Renato Kramer

A estrela é o entrevistado

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Outro dia o humorista Murilo Couto foi até o teatro Cultura Artística do Itaim, em São Paulo, para ver se entrevistava nada mais, nada menos do que Jô Soares. Ele estava em busca de boas dicas para se fazer um talk-show bacana, "porque o nosso não é legal!" - queixava-se Murilo.

"O nosso" seria o "Agora é tarde", todas as terças, quartas e quintas às 23:45 h, na Band. O programa é comandado pelo humorista Danilo Gentili (CQC), e conta com a presença dos comediantes Marcelo Mansfield, Léo Lins e Murilo Couto.

Logo após o término do espetáculo de estréia de "O Libertino" (Eric-Emmanuel Schmitt), sob a direção de Jô Soares, Murilo chegou até o famoso apresentador mas não pode ouvir senão um "não quero ser deselegante, mas eu tenho um contrato de exclusividade" (com a Globo).

Claro que fazia parte de um quadro de humor do programa. Mas não deixou de nos fazer refletir em qual deve ser o segredo de um bom talk-show. Parece simples. Além de um entrevistador inteligente, culto e ágil com as palavras, um bom talk-show depende muito de "bons entrevistados". Ora, de pessoas que tenham uma boa história para contar, ou estejam realizando algo especialmente interessante no momento.

Outro dia a competente jornalista Marília Gabriela entrevistou em seu "Marília Gabriela Entrevista" (GNT), o jovem ator Tiago Abravanel (neto do apresentador Silvio Santos), que está fazendo sucesso no Rio de Janeiro com o espetáculo "Tim Maia, Vale Tudo" - o Musical. Excelente entrevista.

A experiente jornalista sabe como envolver cada um de seus entrevistados e fazer com que acabem contando muito além do óbvio e do 'editável'. Tiago Abravanel, energético e carismático, se expôs com graça, de coração aberto, mesmo que em alguns momentos preferisse uma maior reserva. Feliz com tudo o que está acontecendo com o seu trabalho no teatro e de, aos 23 anos, poder estar se dedicando e sobrevivendo só disso.

Ontem, no "Agora é Tarde", Danilo Gentili recebeu José Mojica Marins, o "Zé do Caixão". Uma lenda viva do cinema nacional. Gentili confessou ser seu fã. Eu tenho que ser sincero - nunca assisti um filme seu. Mas tenho consciência da importância do seu trabalho, dentro do seu gênero, no universo cinematográfico.

Zé do Caixão passou pelo teste de "para quem você rogaria uma praga". Entre outras figuras, lhe apareceram Rubens Ewald filho (crítico de cinema) - ao qual Zé não só não rogou a praga como o encheu de elogios. Foi colocada a imagem de uma 'operadora de telemarketing'. Também não foi amaldiçoada. Até que foi a vez de Justin Bieber! Ainda assim, Zé do Caixão não o amaldiçoaria. Danilo Gentili pediu então por favor que o mestre das trevas o ensinasse uma maldição que ele mesmo a endereçaria para o jovem cantor pop!

Mudando de canal, o próprio Jô Soares ainda tinha dois convidados. O músico Oswaldo Montenegro e o ator Nando Cunha. Totalmente diferentes em suas histórias, mas tão interessantes quanto.

Oswaldo Montenegro cantou a sua bela canção "Bandolins" para matar um pouco as saudades. Depois contou o quanto é atrapalhado e desligado. "Eu acho que é genético. Minha mãe é assim! Uma vez ela estava no elevador, achando que estava de mãos dadas com o meu pai e sentiu que ele estava frio e distante, sua mão estava gelada... até que o elevador parou e ela ouviu a voz do seu marido em seu ouvido: "meu bem, larga a mão do ascensorista que ele precisa abrir a porta!".

Logo depois veio o super-simpático Nando Cunha. Já chegou cheio de dentes! Muito sorriso, muita história engraçada do início de sua carreira. A começar pela primeira figuração na televisão, quando só precisava atravessar a cena quieto, passando pelo ator Reginaldo Farias e pronto. Mas olhou para a câmera. E a pessoa pode qualquer coisa numa situação dessas, menos olhar para a câmera. Na terceira vez, queriam mandá-lo embora e o Reginaldo o ajudou. Na hora de gravar, o ator passou quase de costas para a câmera, só pra não cair na tentação!

Os entrevistadores só tem que ter o cuidado de não querer fazer uma palestra no meio da entrevista do outro. Demonstrar que sabe muito mais que o entrevistado, contar histórias que superem as do entrevistado e, o pior, ironizar qualquer que seja o assunto que levou o entrevistado à TV - não só é de mau gosto, como totalmente contraproducente.

Ah, e às vezes é bom deixar o entrevistado falar!

Renato Kramer

Natural de Porto Alegre, Renato Kramer formou-se em Estudos Sociais pela PUC/RS. Começou a fazer teatro ainda no sul. Em São Paulo, formou-se como ator na Escola de Arte Dramática (USP). Escreveu, dirigiu e atuou em diversos espetáculos teatrais. Já assinou a coluna "Antena", na "Contigo!", e fez críticas teatrais para o "Jornal da Tarde" e para a rádio Eldorado AM. Na Folha, colaborou com a "Ilustrada" antes de se tornar colunista do site "F5"

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