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BBB24
Descrição de chapéu Opinião - Gilson Rodrigues

BBB 24: Quem são os Davis do Brasil?

Reconheço os olhares, as críticas e o deboche, todos carregados de preconceito, de alguns participantes do programa da Globo

Em foto colorida, dois homens são colocados lado a lado em uma montagem
Gilson Rodrigues (@gilsonrodriguesbr), presidente do G10 Favelas, e Davi Brito, do BBB 24 - Divulgação/Reprodução
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Gilson Rodrigues

Líder comunitário de Paraisópolis, na cidade de São Paulo, é presidente do G10 Favelas

Homens negros, pobres, vindos de favelas, muitas vezes aprisionados nos estereótipos criados pela sociedade. Sim, estou me referindo a Davi Brito, participante do BBB 24, mas também estou falando de mim mesmo. Nossas narrativas compartilham semelhanças profundas, porém, nossos sucessos raramente são destacados.

As histórias dos Davis brasileiros têm sido sistematicamente contadas através da lente do sensacionalismo dos noticiários policiais. É crucial que se adote uma nova perspectiva, uma visão de empoderamento, transformação e não violência, para que tenhamos a chance de sermos reconhecidos.

Um dos desafios mais urgentes é mudar a percepção estigmatizada e associada à violência que envolve a população das periferias. Como membro do G10 Favelas, busco substituir essa imagem marginalizada e violenta por uma visão de comunidade autônoma, empreendedora e capaz de solucionar problemas.

Enquanto crianças de famílias ricas com perfil de posicionamento, como o Davi, com opinião, desejo de vencer, são tratadas como criativas e promissoras, aquelas oriundas das favelas são rotuladas como potenciais infratoras, marginalizadas por uma sociedade que as rotulam como violentas.

Nós não somos violentos, somos violentados e marginalizados pela ausência do Estado. Somos constantemente vítimas de violência estrutural perpetrada por aqueles que nos negam oportunidades e por um Estado que nos priva de direitos básicos.

A rejeição que alguns participantes do BBB24 demonstram em relação a Davi evoca em mim sentimentos negativos, pois reconheço os olhares, as críticas e o deboche, todos carregados de preconceito, que muitas vezes são velados ou enraizados na estrutura social. Eu reconheço exatamente o que está por trás do olhar de Davi, seja ele triste, reflexivo ou resiliente.

Muitas vezes, me vi refletido nesse mesmo olhar e ainda o reconheço quando me sinto confrontado por questionamentos preconceituosos sobre minhas conquistas e os sucessos de nossos projetos. Afinal, o que se podia esperar de um menino baiano, morador da favela Paraisópolis, filho de uma mulher surda com quatorze filhos morando em cima de um córrego numa região chamada Pé Inchado?

Quanto ao recente episódio que resultou na expulsão de uma participante, questiono: e se a situação tivesse se desenrolado de outra forma? E se Davi tivesse sido o agressor? Seria aplicada a Lei Maria da Penha? Seria ele imediatamente expulso e cancelado?

Agora, outra participante é alvo, indicada por Davi para o "paredão" e deseja "cancelar" o participante por tê-la considerado "inútil no jogo". Vale a pena observar como ela se referiu a Davi ao longo do programa: psicopata, maldoso, perigoso, tóxico, manipulador, violento, agressivo, cínico, mentiroso, ruim, subterrâneo, fraco, burro, desonesto, moleque, mal-educado. Talvez agora ele tenha percebido a necessidade de reagir.

Eu, assim como Davi, sou negro, baiano, cresci em uma favela e ainda vivo nela. Contudo, jamais me acomodei ou me deixei intimidar pelos desafios, especialmente pelo preconceito. Este preconceito é uma realidade que muitas vezes é acompanhada por discursos demagógicos e promessas vazias.

A favela ainda não venceu. Continuo orgulhoso de ter vivido e superado os obstáculos neste mundo chamado favela. No entanto, desde cedo, compreendi o chamado e continuo lutando para mudar essa realidade, sempre sugerindo uma nova perspectiva sobre as favelas do Brasil, uma perspectiva transformadora.

Somente essa visão será capaz de promover a mudança tão necessária, criando um mundo mais justo, digno e humano.

Nós, homens e mulheres negros, muitas vezes somos nossas próprias referências.

Os Davis do Brasil, antes considerados destinados ao fracasso, hoje são inevitáveis e serão nossos futuros campeões. Quero inspirar uma legião de Davis a acreditar que são capazes de muito mais do que imaginam, tornando seus sonhos realidade.

Assim, continuo escrevendo minha própria história, que se transforma a cada Davi que vence na vida. Todos nós, homens e mulheres negros e das periferias, somos Davi. Somos a cara do Brasil!

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