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Com ex-redator de discursos de Obama, nova temporada de Survivor terá espaço para política?

Jon Lovett entrou no reality com a pretensão de não mentir sobre o passado, mas evitou falar de seu tempo na Casa Branca para não levar votos de possíveis detratores do ex-presidente

Jon Lovett, ex-redator de discursos de Obama e participante do Survivor - Robert Voets/CBS
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Kellen Browning Alexandra Berzon
The New York Times

No verão de 2016, enquanto Donald Trump assegurava a nomeação republicana para presidente, Sarah Lacina brilhava em sua segunda aparição no reality show Survivor (que no Brasil foi adaptado pela Globo como No Limite).

A jovem policial de Cedar Rapids, no Iowa, manobrou estrategicamente o jogo, eliminando sua oposição e formando alianças para ganhar os votos da maioria dos outros competidores em uma ilha em Fiji e ficar com o prêmio de US$ 1 milhão (mais de R$ 5,5 milhões no câmbio atual).

Então, de volta ao acampamento base após as câmeras pararem de gravar, Lacina colocou um boné vermelho com a frase Make America Great Again —uma ação que para alguns dos competidores mais liberais foi um lembrete chocante do mundo real.

"Eu fiquei chocada", disse Andrea Boehlke, uma colega jogadora que votou para Lacina vencer. "Eu pensei: ‘Espera, isso é uma piada, certo?’."

Foi um dos raros momentos em que a política eleitoral perfurou a bolha em torno de um programa que já dura 25 anos e 46 temporadas.

Na quarta-feira passada (18), em meio a outro ano eleitoral acirrado com Trump na cédula, a 47ª temporada de Survivor estreu na CBS americana. Um dos competidores é conhecido pela política: Jon Lovett, apresentador de 42 anos do popular podcast liberal Pod Save America e ex-redator de discursos de Barack Obama. Mas não há indicação de que sua presença na ilha levará a uma temporada mais política do que o habitual.

O reality show envolve deixar de 16 a 20 competidores em um local remoto por semanas com suprimentos mínimos, dividindo-os em grupos —conhecidos como tribos— e submetendo-os a desafios físicos extenuantes. Mas a principal característica é um jogo social intricado em que os jogadores formam essencialmente sua própria sociedade e sistema político, votando periodicamente uns nos outros para deixarem a ilha em uma cerimônia chamada conselho tribal.

O Survivor já abordou uma ampla variedade de tópicos pesados ao longo dos anos, incluindo preconceito de gênero, representação LGBTQ+, diferenças intergeracionais, má conduta sexual e racismo. Uma vez, o programa dividiu os jogadores em tribos com base na raça, como um experimento e uma resposta às críticas de que o programa escalava poucos competidores não brancos. Os produtores há muito sugerem que o jogo é um microcosmo da sociedade, onde questões presentes na vida real muitas vezes surgem organicamente no programa também.

Muito raramente, porém, o gigante da televisão de realidade se desviou para qualquer discussão robusta sobre campanhas, candidatos presidenciais ou questões políticas divisivas —mesmo quando essas conversas dominaram cada vez mais os locais de trabalho, reuniões familiares e até a cultura pop e os esportes.

Entrevistas com uma dúzia de ex-competidores de várias temporadas, bem como membros de longa data da produção, ofereceram várias explicações para isso.

Jeff Probst, o apresentador e produtor executivo do programa, disse em uma entrevista que estava "fascinado" que a política raramente surgisse. Ele sugeriu que a natureza primitiva do programa, onde os competidores estão longe das redes sociais e focados em necessidades básicas como comida e abrigo, pode fazer o tópico parecer irrelevante.

"Acho que tem a ver com não estar por perto disso o tempo todo, e estar em um grupo de pessoas que estão tremendo de frio e tentando encontrar algo para comer", disse Probst. "Simplesmente perde sua importância."

Sophie Clarke, uma administradora de saúde de 35 anos que venceu uma temporada do programa filmada em 2011, acrescentou: "Quando você está morrendo de fome em uma ilha, a última coisa com que se importa é Donald Trump ou Hillary Clinton".

Outro fator, disseram ex-competidores, é o estado constante de paranoia que existe durante o jogo. Os jogadores estão procurando qualquer desculpa para formar uma aliança ou encontrar alguém para isolar e votar fora.

"Se alguém apenas sentir que você tem crenças diferentes ou se você disser algo sobre um assunto sensível para alguém e meter os pés pelas mãos, você pode ter sua tocha apagada," disse Parvati Shallow, uma ex-vencedora de Survivor de 41 anos e coach que jogou o jogo quatro vezes, referindo-se ao método cerimonial do programa de encerrar o tempo de um jogador no jogo.

A única vez que Shallow lembrou que a política surgiu foi durante a temporada com todos os vencedores, filmada em 2019. Um competidor chamado Nick Wilson —que mais tarde se tornou senador estadual republicano no Kentucky— mencionou brevemente suas crenças conservadoras. Shallow, uma liberal, lembrou-se de rapidamente direcionar a conversa de volta para um terreno mais seguro.

Wilson, um advogado, disse que tomou a decisão consciente de evitar falar sobre política enquanto estava no programa, mesmo enquanto ponderava uma carreira política. "Você não quer dar a ninguém uma razão para olhar para você de forma negativa de jeito nenhum", disse Wilson, 34, cuja primeira temporada foi em 2018.

Tiffany Nicole Ervin, artista de 33 anos que vive em Los Angeles e competiu na temporada mais recente do programa, disse que tentou evitar conversas políticas liberais, uma parte frequente de sua vida normal, em um esforço para se encaixar no programa.

"Seu principal objetivo é descobrir como fazer essas pessoas sentirem que você é igual a elas", disse Ervin.

QUANDO ESTAR ISOLADO AINDA É UM ESCAPE

À medida que a política dos EUA se tornou mais cáustica, ex-jogadores disseram que tanto os competidores quanto os espectadores veem Survivor como um escape, em vez de uma oportunidade para testemunhar mais conflitos.

E o próprio programa mudou, evoluindo de um exame de como pessoas de origens diferentes podem entrar em conflito para um de crescimento pessoal e estratégia.

"No ano 2000, você olhava para o Survivor para ver pessoas se comportando mal e olhava para a política para ver pessoas agindo de maneira civilizada," disse Rob Cesternino, que participou duas vezes do Survivor e agora dirige uma rede de podcasts focada no reality e em outros programas de TV. "Em 2024, você vê pessoas na política agindo de maneira incivilizada, e o espírito esportivo em Survivor é mantido a um padrão que está muito além do que vemos nossos políticos seguirem."

Lacina, agora com 40 anos, disse que a reação ao seu boné MAGA —e o que ela lembrou como um clamor subsequente de fãs e ex-participantes do Survivor depois que ela diz ter postado uma foto de seu filho com Trump em suas redes sociais— a pegou de surpresa. Ela sentiu como se estivesse sendo falsamente caricaturada quando pensava que tinha visões políticas muito mais complexas do que poderiam ser resumidas por uma foto ou um boné. No programa, por exemplo, ela defendeu um competidor transgênero que foi exposto por um colega.

"Não deveria importar o que eu visto", ela disse. "Você acabou de me conhecer por 39 dias, e vai deixar uma peça de roupa de repente definir quem eu sou como pessoa."

Boehlke, 35, que se caracteriza como liberal, disse que o momento com Lacina foi um choque não porque ela se arrependesse de escolher alguém que apoiava Trump, mas porque a política simplesmente nunca havia surgido como assunto.

Lovett, fã de Survivor antes de participar do programa, passou a maior parte deste ano fixado nas minúcias da eleição presidencial de 2024 como parte de seu trabalho na Crooked Media, a empresa de mídia política liberal que cofundou com outros ex-integrantes da administração Obama em 2017. Mas houve uma lacuna notável —quando ele estava em Fiji por cerca de um mês em abril filmando a nova temporada.

Ele disse que entrou no jogo sem planejar mentir sobre seu passado se o tema surgisse, mas esperando se ater à sua profissão como apresentador de podcast em vez de seu tempo na Casa Branca, consciente de que ser franco sobre política não cai bem na ilha.

"Às vezes as pessoas se convencem a ter medo de dizer que são advogados ou de serem honestas sobre sua idade", disse Lovett. "Eu me preocupei mais em tentar não ser eu mesmo" e ter que manter uma ambiguidade.

O MUNDO REAL INVADE

Desde o início, tensões culturais da vida real chegaram à ilha. A primeira temporada do Survivor apresentou um competidor abertamente gay —que acabou vencendo— formando um vínculo com um ex-militar da Marinha que nunca havia estado perto de uma pessoa gay antes.

A temporada dividida por raça, filmada em 2006, foi controversa. Yul Kwon, que venceu a então chamada Survivor: Cook Islands, disse que quase desistiu quando os produtores revelaram o tema pouco antes das filmagens começarem.

"Eu estava realmente preocupado com como isso poderia se desenrolar", disse Kwon, 49, um executivo do Google, "e mais amplamente como as pessoas interpretariam o que aconteceu e politizariam isso para diferentes agendas políticas". Ainda assim, essa temporada acabou produzindo vários jogadores populares de várias origens raciais.

Uma temporada recente é mais lembrada pelas críticas sobre como lidou com as queixas das jogadoras a respeito dos toques inadequados de um competidor masculino. Um ano depois, em 2020, ex-jogadores negros do Survivor pressionaram a CBS por uma representação mais diversa no programa.

O Survivor não tem medo de exibir discussões difíceis ou controversas que ocorrem na ilha. Em uma temporada filmada em 2021, dois competidores negros expressaram desânimo ao ver dois outros jogadores negros sendo eliminados consecutivamente, levando a uma reflexão prolongada no conselho tribal sobre preconceito inconsciente.

Probst disse que os produtores também "não têm medo de contar uma história que envolva política em Survivor", especialmente se o momento capturar algo importante sobre a temporada. Em determinado momento, muitos anos atrás, Probst disse que o programa considerou uma temporada com o tema da divisão política. Eles acabaram desistindo.

"Mas não iríamos forçar uma conversa política simplesmente porque estamos no ar durante uma eleição", ele disse.

Lovett disse que o programa era encorajador como um experimento democrático em um momento em que os americanos têm profundas ansiedades sobre a política. "Eu realmente gosto que há essa forma de democracia em que um monte de pessoas pode assistir na corrida para uma eleição que não as faz se sentir pessimistas", disse.

E acrescentou: "Estamos na temporada 47, e ainda temos zero insurreições".

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