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Música
Descrição de chapéu The New York Times

Conheça YoungBoy, o rapper que mesmo preso chegou ao topo das paradas

Novo lançamento chega à Billboard enquanto artista aguarda julgamento

YoungBoy Never Broke Again Jimmy Fontaine/ The New York Times

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Joe Coscarelli
The New York Times

YoungBoy Never Broke Again, um dos rappers mais populares dos Estados Unidos, continua a ser obscuro, de acordo com alguns critérios. Aos 21 anos, seu perfil na mídia convencional é quase invisível, suas canções mal tocam no rádio e ele jamais se apresentou na televisão.

YoungBoy, conhecido como YB por seus fãs mais ardorosos, vem entrando e saindo da cadeia desde que era adolescente e no momento está encarcerado em seu estado natal, a Louisiana, à espera de julgamento por acusações de porte de arma como criminoso condenado. Procuradores da Justiça federal americana o definiram como “um perigo para a comunidade”.

Mas o novo disco de YoungBoy, “Sincerely, Kentrell”—seu nome real é Kentrell D. Gaulden– acaba de se tornar o quarto lançamento do rapper em menos de dois anos a chegar ao topo da parada de sucessos Billboard. E nos intervalos entre os lançamentos de discos, ele chegou aos dez mais com dois mixtapes adicionais, uma prova inegável de sucesso que solidifica sua posição como maior exemplo de uma nova era de estrelato via streaming, ainda que ele continue a ser um outsider na indústria da música e uma exceção.

No geral, a música violentamente obsessiva de YoungBoy foi ouvida mais de seis bilhões de vezes em serviços de streaming desde setembro do ano passado, o que inclui mais de um bilhão de streams de vídeo, mas foi executada apenas 55 mil vezes em rádios americanas no período, de acordo com a MRC Data, a divisão de estatísticas de mercado da Billboard.

No YouTube, onde ele tem quase dez milhões de seguidores e subiu quase 100 vídeos de música desde 2016, é comum que seu número de execuções supere o de cantores como Ariana Grande, Justin Bieber e Taylor Swift.

Na quarta semana de setembro, “Sincerely, Kentrell” fechou sua primeira semana no mercado com 137 mil unidades vendidas, superando por uma pequena margem as vendas de “Certified Lover Boy”, do furacão das paradas Drake. O novo lançamento de YoungBoy também deixou para trás a chegada ao mercado, no começo do mês, do muito aguardado primeiro álbum de Lil Nas X, que é muito respeitado pelo seu gênio de marketing.

E diferentemente de seus concorrentes nas paradas, YoungBoy não incluiu participações especiais em seu disco, em um momento da indústria musical em que a colaboração com nomes famosos é vista como caminho seguro para provocar uma disparada no número de streams dos aspirantes a líder das paradas de sucesso.

“Eu na verdade nunca vi coisa parecida no hip-hop”, disse Lanre Gaba, vice-presidente executivo de música negra na Atlantic Records, a gravadora que lança os trabalhos de YoungBoy, comparando os fãs inabaláveis do rapper aos do grupo de K-pop BTS. “Ele nem sempre foi um artista cuja entrada os guardiões tenham permitido em outros espaços. Mas isso só serve para tornar sua base de fãs ainda mais fervorosa”.

Aproveitando esse fervor e tirando vantagem da indisponibilidade do rapper como recursos de divulgação, a equipe de YoungBoy recorreu às suas vastas reservas de gravações de som e vídeo e se comunicou diretamente com os ouvintes, a fim de determinar qual deveria ser a forma do novo disco e sua estratégia de lançamento.

Executivos da gravadora realizaram chats coletivos nas páginas de fãs do rapper na mídia social a fim de fomentar e amplificar os esforços de marketing espontâneos desses grupos. E os assessores musicais de YoungBoy confiaram nesses mesmos fãs leais para ajudar a selecionar as faixas do disco.

Em alguns casos, eles recorreram a títulos criados pelos fãs com base no que o mundo do rap conhece como “snippets” –versões parciais e extraoficiais de canções não lançadas, que podem ter sido tocadas de passagem no Instagram e que os ouvintes passam meses e anos ansiando para ouvir novamente.

YoungBoy –também conhecido como NBA YoungBoy, o nome que ele usava antes que preocupações de direitos autorais forçassem uma mudança—, também participou intensivamente do planejamento, conversando diariamente com sua equipe em longos telefonemas, da prisão, todos interrompidos pelo limite compulsório de 15 minutos para a duração das ligações de detentos.

“YB faz música para YB”, disse Jason Goldberg, conhecido como Cheese, o engenheiro de gravação a que o rapper recorre com mais frequência. “Mas quando você leva em conta o que os fãs desejam e descobre uma correlação, acontece uma imensa explosão como a que estamos vendo. Todo mundo se envolve. E nós não deixamos as pessoas na mão”.

Cheese disse que “Sincerely, Kentrell” foi montado com base em 150 possíveis canções gravadas em quartos de hotel, na estrada em ônibus de turnê e em estúdios de todo o país, antes da detenção de YoungBoy em março.

Em uma das faixas, “Life Support”, disse o engenheiro, “dá para ouvir o barulho da estrada por sob os pneus, entre os versos”. Em outras gravações, ele montou cabos de 15 metros de comprimento, passando por uma janela de segundo andar para que YoungBoy pudesse cantar sentado dentro de um Range Rover estacionado, porque o Airbnb onde ele estava hospedado não permitia fumo.

As canções foram criadas totalmente de improviso e estão repletas de traumas, ameaças e lamentações como se extraídas da vida perturbada de uma pessoa que está batalhando para mudar –uma mistura volátil de política de rua, tragédia pessoal incessante e riqueza repentina.

Criado por sua avó na zona norte da cidade de Baton Rouge, Louisiana, YoungBoy deixou a escola na nona série e começou a cantar rap aos 14 anos, usando um microfone comprado no Walmart.

Mas mesmo que suas canções tenham decolado online, levando a um contrato de US$ 2 milhões (cerca de R$ 11 milhões) com a Atlantic em 2016, ele continuava a enfrentar problemas judiciais sérios.

Em 2017, diante de duas acusações de tentativa de homicídio em primeiro grau associadas ao seu papel em um incidente que envolvia tiros disparados de um carro, YoungBoy se admitiu culpado de uma acusação menos severa, a de agressão dolosa com uma arma de fogo, e recebeu uma sentença de dez anos de prisão, suspensa, e foi colocado em liberdade condicional.

Depois de novas detenções, entre as quais uma relacionada a violência doméstica em 2018 e de outro tiroteio no qual a equipe do rapper foi absolvida por ter agido em legítima defesa, YoungBoy foi condenado a passar 90 dias preso e a servir o restante de seu período de liberdade condicional em prisão domiciliar. (Ele mais tarde se admitiu culpado do delito de agressão por empurrar e estapear uma namorada no incidente de 2018.)

“Você tem uma escolha a fazer”, um juiz lhe disse, na época. “Precisa decidir se quer ser Kentrell ou NBA”. O rapper respondeu: “Sinto a mesma coisa. Não posso ser os dois”.

Mais recentemente, em março, YoungBoy foi detido por agentes federais em Los Angeles depois de uma perseguição em alta velocidade sob acusações relacionadas a uma detenção em Baton Rouge em setembro do ano passado, quando o rapper era parte de um grupo de 16 pessoas acusadas de uso de álcool e de porte de armas na gravação de um vídeo.

Os advogados de YoungBoy afirmam que ele está sendo perseguido injustamente –apontando para o codinome que as autoridades federais deram à sua operação, Never Free Again [liberdade nunca mais], “uma óbvia referência à música e à marca de marketing muito bem-sucedida de Gaulden” –e buscam a supressão de provas que dizem terem sido obtidas de maneira inconstitucional.

Eles classificam a perseguição do rapper pelo FBI em Los Angeles como “uma exibição de força e intimidação maciça e desnecessariamente militarista”.

O perfil de YoungBoy na vida real ao mesmo tempo criou obstáculos comerciais para sua carreira e tornou sua aura de fora de lei mais atraente, gerando comparações com Tupac Shakur, Gucci Mane e Lil Wayne.

“Eles quebram as regras, fazem as coisas do jeito deles e as pessoas percebem isso”, disse Alex Junnier, um dos empresários de YoungBoy. “Não há nada que pessoa alguma possa fazer para impedir isso”.

Ainda assim, alguns parceiros empresariais como o Spotify, a Apple e até o YouTube expressaram cautela, embora YoungBoy continue a dominar em seus canais. “A imagem dele me impedia de conseguir qualquer coisa em seu benefício”, disse Veronica Lainey, gerente de produtos do rapper na Atlantic. “Mas a sucessão de seus hits que chegaram ao topo das paradas realmente ajudou a mudar a narrativa”.

No entanto, os anos de volatilidade também requerem que a gravadora seja ágil em sua maneira de lidar com um artista iconoclasta e com sua carreira precária.

“Ele jamais vai aceitar que lhe digam categoricamente que algo deve acontecer, quando e como”, disse Shadeh Smith, comissária dos vídeos de YoungBoy na Atlantic, relembrando a época em que acordava e encontrava um novo vídeo do rapper subido por ele mesmo. “Agora, eu em geral tenho sorte e sou avisada de que alguma coisa está para chegar, mas isso nem sempre acontece”.

Já que YoungBoy estava ausente para o lançamento de “Sincerely, Kentrell”, a gravadora teve de mais uma vez recorrer à flexibilidade e criatividade, buscando “levar às ruas as conversas sobre ele que acontecem online”, disse Lainey.

A Atlantic colocou em exibição outdoors com o slogan “YB Better”, uma frase que os fãs do rapper usam para se pronunciar em seções de comentários da internet, e aproveitaram as novas regras da NCAA, a organização que comanda o atletismo universitário americano, sobre o uso de nomes e imagens de atletas para fazer de alguns atletas universitários influenciadores, pagando para que eles escrevessem posts sobre a música de YoungBoy. (Já a forte presença de memes sobre YoungBoy no TikTok surgiu organicamente, eles dizem.)

Quando a disputa com Drake pelo número um nas paradas ficou muito acirrada, a equipe de YoungBoy e seus fãs altamente leais entraram em modo turbo.

Para atrair mais interesse e gerar mais atividade, a gravadora acrescentou duas faixas bônus ao disco na metade da semana, entre as quais “Still Waiting”, que YoungBoy trabalhou com Cheese para gravar pelo telefone da prisão. E os fãs fizeram sua parte, estimulando uns aos outros para manter “Sincerely, Kentrell” no primeiro lugar; alguns deles participaram de festas de streaming para aumentar o número de execuções.

“Foram os fãs que o escolheram e não vão deixá-lo na mão”, disse Junnier, o empresário do rapper. “Uma pessoa como ele não deveria ter chegado à posição que chegou”.

Traduzido originalmente do inglês por Paulo Migliacci

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