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Valentina Ferragni (à esq.) e sua irmã Chiara em Nova York

Valentina Ferragni (à esq.) e sua irmã Chiara em Nova York Krista Schlueter - 17.fev.22/The New York Times

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Jessica Testa
The New York Times

Quando Chiara Ferragni passou a ser integrante do conselho da Tod’s, uma empresa italiana de produtos de luxo, as ações da companhia subiram em 12%. Ferragni, 34, tem dois filhos e 26 milhões de seguidores no Instagram, e é uma das influenciadoras mais famosas no mundo da moda, especialmente na Europa. Os negócios dela incluem uma marca de roupas e uma agência de talentos.

Nada mal para uma antiga blogueira de moda que as pessoas ainda chamam de Blonde Salad, às vezes. O termo "blogueiro" saiu de moda. E quando alguém o usa, agora, em geral é por engano. O que as pessoas querem dizer com a palavra é "criador" ou "influenciador". Mas todas essas expressões querem dizer essencialmente o mesmo –a diferença é que foram adotadas em momentos diferentes da história recente.

Nos três casos, estamos falando de pessoas que geram conteúdo online profissionalmente com base em suas próprias vidas: as roupas que usam, as viagens de férias patrocinadas que fazem, os compromissos sociais a que comparecem, sua paixão pelas criptomoedas. Vinte anos atrás, esse conteúdo era publicado em plataformas como o WordPress e era difícil quantificar seu alcance. Agora, ele surge principalmente no TikTok, no qual os indicadores, que incluem "likes", comentários e compartilhamentos, são muito mais acessíveis.

Se Ferragni não tivesse criado um blog em 2009, é possível que criadores como Addison Rae, 21, jovem atriz com 86 milhões de seguidores no TikTok (a quarta conta mais popular do app) não estivessem ocupando lugares de primeira fila no desfile de Michael Kors no mês passado –o evento mais estrelado da Fashion Week de Nova York—, a poucos metros de distância de Ferragni.

Isso porque Ferragni fez parte da primeira onda de blogueiros a desordenar o setor de moda. Na época, um post dela, Brianboy ou Garance Doré podia carregar o mesmo peso publicitário de um anúncio de página inteira em uma revista de moda famosa. Quando esses primeiros influenciadores passaram a comparecer a desfile de moda, não demorou para que começassem a ser acomodados em companhia dos um dia poderosos editores das grandes revistas.

Por muito tempo, a elite da moda rejeitou esse arranjo. "As pessoas costumavam ser esnobes quanto a qualquer coisa que viesse da internet", disse Ferragni, sentada no saguão do Bowery Hotel, em uma entrevista depois do final da New York Fashion Week.

Mas isso significa que agora ela também deixou de ser a novata em ascensão e com algo a provar. (Um crítico a descreveu na semana passada como "a mãe dos dragões", entre os influenciadores.) Ferragni gosta de assistir a vídeos do TikTok, por exemplo, mas ainda não encontrou seu papel no app, onde ela atrai apenas um sexto do número de seguidores que tem no Instagram.

"Eu às vezes faço vídeos para o TikTok; mas nem sempre me sinto eu mesma", ela disse. "É aceitável dizer que talvez aquela não seja a minha plataforma. Talvez não seja algo que que eu queira fazer".

O NEGÓCIO DA FAMÍLIA

Assim, de que maneira uma veterana da mídia social pode proteger seu legado, se ela não está conquistando novas plataformas? Ela segue o plano de jogo de Calabasas.

No ano passado, uma das séries de TV originais mais assistidas na Itália foi o reality show "The Ferragnez", estrelado por Ferragni e seu marido, Fedez, um rapper italiano que a pediu em casamento no palco, em 2017. A cobertura do casamento deles, em 2018, foi tão pesada quanto a do casamento do príncipe Harry com Meghan Markle, e eles permitiram a presença de câmeras em suas sessões de terapia de casal, na primeira temporada do programa. "É importante não retratar sempre uma vida feliz e perfeita", disse Ferragni.

Outros integrantes do elenco do reality show são a mãe de Ferragni (uma romancista que tem 630 mil seguidores no Instagram), seu pai, dentista (135 mil seguidores), e suas irmãs Francesca (32 anos e 1,3 milhão de seguidores) e Valentina (quatro milhões de seguidores.)

Chiara Ferragni não vê coisa alguma de estranho em que qualquer um deles tenha conquistado tantos seguidores. Os seguidores dela "simplesmente amam o estilo de vida", ela disse. "Eles gostam de você, simplesmente. Interessam-se por tudo que esteja conectado a você", o que inclui parentes e amigos.

Apenas sua irmã mais nova a seguiu ao mundo da moda. Valentina Ferragni, 29, criou uma linha colorida de joias finas, de gênero neutro, lançada em setembro de 2020 e descrita como "fácil de usar". O primeiro design dela para o Valentina Ferragni Studio foi um pendente em V para brincos chamado Uali, seu apelido, e que ela definiu como "um tributo a mim mesma".

A linha de joias se expandiu e agora inclui gargantilhas, braceletes e anéis, e todas as peças incorporam o logotipo da designer, um V volumoso. A companhia tem apenas alguns empregados, sempre mulheres de menos de 30 anos, e afirma que todos os produtos são artesanais e produzidos localmente. A linha é vendida por 400 joalherias italianas e pela rede de lojas de departamentos Rinascente.

Como costuma ser o caso entre celebridades irmãs, Valentina e Chiara Ferragni são muito parecidas; as duas usam cabelos repartidos no meio, têm olhos azuis reluzente, quase sempre maquiados com sombra brilhante, e optam por figurinos em cores vistosas.

Quando tinha 15 Anos, Valentina Ferragni costumava fotografar as roupas da irmã antes mesmo que o blog Blonde Salad tivesse sido criado, em uma época em que Chiara conquistava seguidores no Flickr, um serviço de hospedagem de imagens e rede social para entusiastas da fotografia. Chiara postava imagens no Flickr como se fossem um diário, em oposição a, por exemplo, pores do sol ou closes de flores exóticas. "As pessoas me odiavam", ela disse.

As irmãs foram criadas em Cremona, Itália. A mãe delas, Marina Di Guardo, amava tirar fotos e gravar vídeos com as meninas a despeito de não ter como compartilhá-los publicamente. Di Guardo no passado trabalhou no showroom da grife Blumarine, e por isso suas filhas se interessavam por moda desde pequenas.

Mas até que o blog de Ferragni decolasse, a ambição de sua irmã mais nova era ser arquiteta ou decoradora de interiores, ela disse. Valentina Ferragni ainda se lembra de ir ao seu primeiro desfile de moda em Milão com Chiara, cerca de sete anos atrás, e de ter medo "porque eu não sabia o que fazer". Ela estava de macacão jeans e usava um chapéu, e posou para fotos ao lado da irmã, cuja descontração diante das câmeras Valentina desejava desesperadamente emular.

Valentina Ferragni disse que continua a querer ser como Chiara, mas percebe que existem limitações. "Para algumas pessoas, eu serei sempre a segunda", ela disse. "Mas na verdade somos pessoas diferentes. Somos as duas loiras e temos o mesmo sobrenome, mas uma é Chiara e a outra é Valentina".

O IMPÉRIO DE UMA INFLUENCIADORA SE EXPANDE

Ainda assim, quando sua irmã é uma magnata da moda e líder do que alguns veículos de mídia italianos designam como "a família real", ficar em segundo lugar não é a pior coisa. Embora "meu sobrenome 20 anos atrás fosse apenas um sobrenome", disse Valentina Ferragni, também provou ser uma vantagem em um mercado superlotado. O Valentina Ferragni Studio informou que sua receita em 2021 foi de cinco milhões de euros (R$ 27,5 mi).

É um mercado no qual Chiara Ferragni também decidiu entrar, no final de 2021, um ano depois de Valentina ter lançado sua marca de joias. "Nossas linhas não concorrem", disse Chiara Ferragni. As joias da irmã mais velha são bijuterias, cristais e correntes com motivos decorativos em forma de coração.

Fabio Maria Damato, o gerente geral da Chiara Ferragni Collection e da Blonde Salad, reconheceu que inicialmente "o pessoal de negócios ficou preocupado". Mas logo se tornou claro que as duas irmãs estavam adotando abordagens diferentes e administrando companhias diferentes. (Afinal, Kim e Kylie não vendem cada qual sua linha de maquiagem?)

Damato começou a trabalhar com Ferragni cinco anos atrás. Ex-jornalista de moda, ele apareceu em "The Ferragnez" e em "Chiara Ferragni: Unposted", documentário de 2019 sobre a influenciadora, sempre no papel de braço direito de Ferragni, ajudando-a tanto a vestir roupas complicadas quanto a se acertar em situações de negócios difíceis, como a retomada de controle sobre a Blonde Salad, criada por Chiara e um ex-namorado.

Mesmo agora, enquanto a empresa busca ativamente investidores externos, Ferragni não tem planos de ceder o controle do negócio que leva seu nome. Mas, tendo em vista o fato de que os blogs morreram e que as pessoas "não vão mais a sites", ela abriu mão do Blonde Salad. O blog parou de veicular conteúdo novo, que agora ela reserva ao Instagram.

"Nós discutimos fechá-lo, mas decidimos mantê-lo aberto só por ser parte da história e da minha história", disse Ferragni.

Houve um momento, no final do ano passado, em que essa história parecia ter chegado a um clímax. Embora Ferragni tenha aparecido nas capas de dezenas de revistas internacionais nos 10 últimos anos, ela por fim apareceu, em outubro, nas páginas da Vogue italiana, a mais respeitada revista de moda de seu país.

A estética da Vogue Italia sempre foi mais artística e abstrata, suas tendências mais controversas e sua consciência social mais aguçada do que a de outras edições da revista. Mas, no começo de 2021, a Vogue anunciou uma mudança de estratégia a fim de consolidar a liderança de todas as suas publicações internacionais.

Isso levou à promoção de uma jovem, Francesca Ragazzi, ao posto de editora chefe da Vogue Italia. Uma de suas primeiras decisões foi colocar Ferragni na capa de uma edição dedicada a "recomeços", e a editora a definiu como "a protagonista ideal para interpretar essa nova direção".

Para Ferragni e Damato, o selo de aprovação da Vogue Italia –enfim!– foi sinal de uma mudança mais ampla na moda do pais, por muito tempo comandada por estilistas e executivos mais velhos, e companhias familiares que costumam ser resistentes ao que as "próximas gerações" tenham a dizer, segundo Damato. Em Milão, mais do que em outras cidades da moda, é difícil chegar ao sucesso antes dos 45 anos.

"Quando éramos jovens e estávamos começando, era difícil", disse Damato. Isso está mudando, e não só por conta do apoio de Ragazzi a Ferragni, ele acrescentou, mas também por causa da rede crescente de jovens estilistas, entre os quais Giuliano Calza, da GCDS, e Gilda Ambrosio e Giorgia Tordini, da Attico.

A geração mais velha da moda italiana "tem um bom conhecimento mútuo e respeito mútuo, mas eles não querem trabalhar juntos", disse Ferragni. "Nossa geração se apoia mais".

Ferragni aponta que essa é uma nova maneira de fazer negócios, na Itália. E isso também é boa notícia para a caçula da família, Valentina, em seus esforços para ao mesmo tempo se manter próxima da irmã e trilhar um caminho próprio.

"Eu amaria que as pessoas compreendessem que somos duas pessoas diferentes, temos dois negócios diferentes, duas sociedades diferentes, duas marcas diferentes", disse Valentina Ferragni. "Mas ajudamos uma à outra. Talvez um dia façamos uma colaboração".

Traduzido originalmente do inglês por Paulo Migliacci

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