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Tony Goes

Lula irado, Soraya lacradora e padre indisciplinado: terceiro debate foi o mais divertido de todos

Candidatos discutiram poucas propostas, mas geraram momentos memoráveis

 Candidatos à Presidência da República nos estúdios da TV Globo antes do debate
Candidatos à Presidência da República nos estúdios da TV Globo antes do debate - Eduardo Anizelli/Folhapress
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Foram mais de três horas de debate. Dá para maratonar algumas séries em menos tempo. O horário tardio tampouco ajudou. Mesmo assim, foram relativamente poucos os tempos mortos no debate entre presidenciáveis da Globo, o terceiro e último antes do primeiro turno. Todos os sete candidatos presentes estavam dispostos a causar, faltando três dias para as urnas.

Ciro Gomes (PDT), o primeiro a entrar em campo, escolheu começar com uma pergunta agressiva ao ex-presidente Lula (PT). O petista iniciou sua resposta com voz rouca e visível nervosismo, mas logo pegou ritmo e desancou seu ex-ministro. Ciro perdeu o rebolado, que não mais recuperou.

Ainda mais nervoso estava Jair Bolsonaro (PL). Com a falta de coragem que lhe é peculiar, quando tinha escolha só chamava Padre Kelmon (PTB) ou Luiz Felipe d’Ávila (Novo) para responder a perguntas que visavam apenas atacar Lula. Não teve o peito de interpelar o petista diretamente.


Isto não impediu uma incrível sucessão de direitos de resposta entre Lula e Bolsonaro, logo no primeiro bloco. O ex-presidente chegou a pedir desculpas por estar atravancando o ritmo do debate, mas o fato é que esse entrevero foi ótimo. O Brasil teve a chance de ver os dois primeiros colocados nas pesquisas se enfrentando quase no olho no olho, e de repente o debate ficou muito divertido.

É sacrilégio encarar um evento desses, que pode alterar o destino do país, como um mero entretenimento? Como "mero" sim, mas é fundamental que um debate segure a atenção do espectador. Já sabíamos de antemão que poucas propostas seriam discutidas. Os momentos de pugilato serviram para que os candidatos se revelassem no que têm de melhor e de pior.

Soraya Thronicke (União Brasil), cuja maquiagem estava pesada demais para a forte luz do estúdio, foi a grande lacradora da noite. Já começou errando o nome do Padre Kelmon, chamando-o de Kelson e Kelvin antes de optar por "candidato padre". No segundo embate com o questionável sacerdote, colou nele um epíteto insuperável: "padre de festa junina". A internet deitou e rolou, e a senadora sul-mato-grossense, sem chances de ser eleita presidente, foi coroada como a rainha dos memes.

Tecnicamente, ninguém se saiu melhor do que Simone Tebet (MDB). Serena, com pouco a perder, a outra senadora do Mato Grosso do Sul foi incisiva nas respostas, sem cair nas perguntas capciosas que lhe foram feitas. Não exibe mais a frieza que aparentou em sua entrevista ao Jornal Nacional, um mês atrás. Está plantando direitinho uma possível candidatura à Presidência em 2026.

As candidatas mulheres encararam um Bolsonaro fazendo um esforço incrível para não as desrespeitar acintosamente. O presidente só se exaltou quando foi confrontado por Soraya no terceiro bloco. Mesmo fingindo comedimento, é improvável que tenha conseguido mais votos entre o público feminino. Pelo menos, dessa vez ele aceitou ser maquiado, poupando o espectador de seu rosto escalavrado.

Luiz Felipe d’Ávila não cheirou nem fedeu. Não cometeu nenhum grande deslize, mas tampouco brilhou. Acabou servindo de escada para Bolsonaro, o que só acentuou sua irrelevância.

Mas ninguém levantou mais a bola do incumbente do que Padre Kelmon. Como no debate do SBT, o petebista fez o papel de segunda coluna de Bolsonaro, respondendo a perguntas obviamente combinadas a priori com o mandatário. Mas sua aparência bizarra, seu desrespeito às regras e seu puxa-saquismo desenfreado lhe garantiram, mais uma vez, o troféu de bobo da corte.

Ainda assim, com a desfaçatez que o media training proibiu a Bolsonaro, Padre Kelmon quase conseguiu tirar Lula do sério. No segundo bloco, os dois travaram o que pode tranquilamente ser chamado de barraco, que precisou ser interrompido pelo mediador William Bonner. Essa pausa forçada ajudou o ex-presidente a se recompor, e a rebater com firmeza o duvidoso padre em sua tréplica.

Com um sorriso irônico no rosto e muitos dados (nem sempre corretos) na ponta da língua, Lula estava a léguas do desempenho apático que exibiu no primeiro debate, na Band. Ele finalmente entendeu que a postura zen adotada anteriormente só o prejudicou. A perspectiva de ganhar no primeiro turno, ainda não assegurada, acendeu o fogo nos olhos do petista.

Sim, foi um debate longuíssimo e cansativo, porque até diversão tem limite. Mas o formato de embates diretos, que ainda pode ser aperfeiçoado, se mostrou o mais proveitoso de todos. Provavelmente, esse terceiro confronto não terá impacto considerável no voto de ninguém. Mas foi um momento marcante dessa campanha algo morna, para o bem e para o mal.

Tony Goes

Tony Goes (1960-2024) nasceu no Rio de Janeiro, mas viveu em São Paulo desde pequeno. Escreveu para várias séries de humor e programas de variedades, além de alguns longas-metragens. Ele também atualizava diariamente o blog que levava seu nome: tonygoes.com.br.

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