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Tony Goes

Apesar de demissões e do que dizem seus críticos, a Globo está longe da falência

Emissora passa por profunda reestruturação, para enfrentar melhor o futuro

Glória Menezes, Carlos Tramontina, Juliana Paes e Antônio Fagundes
Glória Menezes, Carlos Tramontina, Juliana Paes e Antônio Fagundes - Globo
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A extrema-direita e boa parte da esquerda brasileira discordam em quase tudo, mas convergem num mesmo ponto: o ódio à TV Globo. A maior emissora do país é vista pelos dois lados como uma de suas maiores inimigas. Ambos já falaram em impor restrições severas ao que a Globo veicula, o que configuraria censura, ou mesmo em cassar sua concessão –algo que só acontece em regimes autoritários, como na Hungria ou na Venezuela.

Enquanto a raiva pela Globo cresce nas redes sociais, a empresa passa por uma profunda reformulação, que começou há pelo menos oito anos. Muitos diretores trocaram de função, outros tantos foram desligados depois de anos de casa e a campanha "Uma Só Globo" buscou unir sob um mesmo guarda-chuva todas as empresas do grupo –o canal aberto, a Globosat, o Globoplay, o G1, a editora, as rádios – que, volta e meia, se tratavam como concorrentes.

Esses bastidores corporativos não costumam empolgar o público. Mas todo mundo vibra quando algum medalhão da casa não tem seu contrato renovado depois de décadas de serviço. Essas demissões (que na prática nem são tão visíveis assim, pois vários nomes dispensados já foram chamados para novos trabalhos, por obra certa) seriam, na opinião de esquerdistas e radicais de direita, um sinal inequívoco de que a Globo estaria indo à matroca.

Não está, longe disso. O Grupo Globo segue sendo o maior conglomerado de comunicação do país, e seu canal aberto, apesar das significativas perdas de audiência nas últimas décadas, continua na liderança absoluta em quase todas as faixas horárias. Só eventos esporádicos, como importantes partidas de futebol exibidas pela concorrência, conseguem abalar esse domínio.

Mas por que a Globo está limando quase todo seu elenco fixo? Por que abriu mão de nomes antes considerados estratégicos, como Tarcísio Meira, Glória Menezes, Antonio Fagundes e Juliana Paes? Por que está aposentando quase todos seus jornalistas que já passaram dos 60 anos de idade, como Chico Pinheiro e Carlos Tramontina?

Sim, a principal razão é a financeira. Ao longo dos anos, a Globo desenvolveu um sistema de "aplicação", para arcar com os salários altíssimos de suas estrelas. Quando ela estivesse no ar, ganharia 100% do combinado. Quando estivesse fora, 60%. Acontece que essas férias remuneradas poderiam se estender por anos –Adriana Esteves ficou em casa de 2012 a 2015, para descansar a imagem depois do turbilhão de "Avenida Brasil", recebendo da emissora sem trabalhar para ela.

Esse esquema fazia sentido quando havia uma disputa para valer entre os canais abertos, com o SBT e, principalmente, a Record tentando roubar figuras globais para seus próprios elencos. A Globo preferia pagar para seu ator ficar sem fazer nada do que deixá-lo aparecer na concorrência.

Mas aí chegou a internet, e o mundo mudou. Chegou o streaming, e o que já havia mudado virou de cabeça para baixo. Assim como já havia feito com a TV paga, a Globo foi a primeira rede comercial brasileira a investir para valer na nova mídia. Hoje, o Globoplay é a segunda maior plataforma do país, atrás apenas da pioneira Netflix.

A um custo astronômico, é verdade. Para não ser uma reles repetidora do que foi exibido antes pelo canal aberto, o Globoplay precisou gastar fortunas para adquirir séries americanas, novelas turcas e portuguesas, e até mesmo produções próprias como "Ilha de Ferro" e "Verdades Secretas 2".

Este dinheiro precisava vir de um lugar, ou de vários. Um deles são os cortes no elenco fixo, tanto na dramaturgia como no jornalismo. Além da evidente economia, a Globo também tem a chance de renovar sua imagem, em mais de um sentido. Dá chance a centenas de ótimos atores e repórteres ainda pouco conhecidos do público e ainda amplia a diversidade na tela, povoando-a com rostos jovens, não-brancos, de diferentes orientações sexuais.

Essa explicação talvez seja um pouco complexa demais para quem usa a hashtag #Globolixo. Principalmente para os bolsonaristas, que acreditam piamente que a falta de publicidade federal é o que vem matando a Globo (e por que essa mesma não estaria salvando os outros canais, já que é abundante por lá?).

Por isto mesmo, pense duas vezes antes de atacar a Globo nas redes sociais. A emissora merece muitas críticas, sem dúvidas, mas é mais do que precipitado comemorar sua falência quando isto nem está no horizonte.

Tony Goes

Tony Goes (1960-2024) nasceu no Rio de Janeiro, mas viveu em São Paulo desde pequeno. Escreveu para várias séries de humor e programas de variedades, além de alguns longas-metragens. Ele também atualizava diariamente o blog que levava seu nome: tonygoes.com.br.

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