Tony Goes

Está rolando uma caça às bruxas no jornalismo brasileiro?

Casos de Paulo Henrique Amorim, Marco Antonio Villa e Rachel Sheherazade são preocupantes

Rachel Sheherazade
Rachel Sheherazade, contratada do SBT - Gabriel Cardoso/SBT
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Na sexta-feira passada (22), o empresário Luciano Hang, dono das lojas Havan, sugeriu no Twitter que Rachel Sheherazade, âncora do SBT Brasil, fosse incluída na onda de demissões que assola o departamento de jornalismo da emissora de Silvio Santos.

Nesta segunda (24), a Record anunciou que Paulo Henrique Amorim será afastado do programa Domingo Espetacular, que ele apresenta há 14 anos. O jornalista segue contratado da emissora, mas seu futuro por lá está indefinido.

Na terça (25), Marco Antonio Villa confirmou que está deixando a rádio Jovem Pan, depois de ter sido suspenso por 30 dias.

Esses três casos têm um preocupante ponto em comum: todos envolvem jornalistas críticos a Jair Bolsonaro, que trabalham (ou trabalhavam) em veículos que apoiam explicitamente o atual governo.

A queda de Paulo Henrique Amorim até que demorou. Em seu blog Conversa Afiada, o jornalista jamais escondeu sua preferência pelo lado esquerdo do espectro político. No ar, na Record, ele costumava ser mais comedido – mas interessou à emissora enquanto o PT esteve no poder federal.

Villa e Sheherazade têm trajetórias mais surpreendentes. Ambos desfrutam há muitos anos da reputação de conservadores. Mas, depois que Bolsonaro assumiu, os dois passaram a apontar as falhas do presidente e seu entorno.

Isso desagradou a Felipe Moura Brasil, o novo diretor de jornalismo da Jovem Pan. Ele já havia afastado o economista e filósofo Joel Pinheiro da Fonseca (também colunista da Folha) da rádio –e olha que Joel, de esquerdista, não tem absolutamente nada. A saída de Villa não tardou.

O SBT não se manifestou quanto a Sheherazade. As lojas Havan são um grande anunciante do canal, mas não há notícia de Silvio Santos, algum dia, ter se dobrado aos caprichos de um patrocinador (até porque o maior patrocinador do SBT é ele mesmo).

De qualquer forma, é assustador ver que está aberta a temporada de caça aos “comunistas” (põe aspas nisso) na mídia brasileira. Nas redes sociais bolsonaristas circula até uma montagem com os retratos dos jornalistas que precisam ser “eliminados”. A lista inclui nomes como Ricardo Noblat, Eliane Catanhede, Miriam Leitão, Fabio Pannunzio, Josias de Souza e, da Folha, Reinaldo Azevedo e Monica Bergamo.

Aí bate a vontade de rir. Em seus delírios de poder, alguns dos fanáticos pelo atual governo acham que podem forçar todo e qualquer veículo a demitir quem eles não gostam. A democracia brasileira pode até estar em vertigem, mas ainda não chegamos a este ponto.

Só que é bom ficarmos de olho. Em países como a Hungria, a Turquia e a Venezuela, o autoritarismo foi se instalando aos poucos, quase sempre com o aval das urnas. Para o Brasil não seguir pelo mesmo caminho, convém, entre outras coisas, manifestarmos solidariedade a todo e qualquer jornalista –inclusive aqueles que defendem ideias opostas às nossas.

Tony Goes

Tony Goes (1960-2024) nasceu no Rio de Janeiro, mas viveu em São Paulo desde pequeno. Escreveu para várias séries de humor e programas de variedades, além de alguns longas-metragens. Ele também atualizava diariamente o blog que levava seu nome: tonygoes.com.br.

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