Tony Goes

Entrevista de Jô Soares a Fábio Porchat teve clima de passagem de bastão

Conversa simbólica foi ao ar em duas partes

 Porchat recebe o apresentador Jô Soares em seu talk show Programa do Porchat
Porchat recebe o apresentador Jô Soares em seu talk show Programa do Porchat - Edu Moraes/Record TV
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O pretexto da visita de Jô Soares ao “Programa do Porchat” (Record), exibida nesta quarta (18) e quinta (19), era até prosaico: o lançamento da peça “A Noite de 18 de Janeiro”, que Jô dirige e da qual também participa como ator.

Mas claro que não seria uma entrevista corriqueira. Para começar, foi a primeira aparição de Jô em um canal aberto desde que terminou seu contrato com a Globo, no final do ano passado. E logo na Record: não só a arquirrival de sua antiga casa, como também a primeira emissora da qual ele foi contratado, na década de 1960.

Só que houve um simbolismo ainda maior. Porchat quase foi às lágrimas ainda no monólogo de abertura da quarta, emocionado por entrevistar alguém que não só é um modelo a seguir, como que também desempenhou um papel-chave no lançamento da carreira do jovem apresentador.

Para quem ainda não sabe: em 2002, quando tinha apenas 19 anos e era um total desconhecido, Fábio Porchat foi assistir a uma gravação do “Programa do Jô” (Globo). Da plateia, mandou um bilhete para o anfitrião, pedindo para apresentar no palco um monólogo cômico. E não é que Jô topou?

Mais de quinze anos depois, consagrado pelo Porta dos Fundos e protagonista de seu próprio talk show, Porchat recebeu Jô Soares em seu programa com honras de chefe de estado. E Jô correspondeu à homenagem.

Parecendo mais frágil e envelhecido do que quando esteve no “Conversa com Bial” (Globo) em dezembro passado, Jô mostrou logo de cara que sua mente continua afiadíssima. E deslanchou as quase duas horas de conversa com uma revelação surpreendente: não sente falta de estar na TV.

Não foi o que pareceu ao longo de 2016, o último ano do “Programa do Jô”, com o apresentador lembrando a cada bloco que em breve a atração sairia do ar. A longa despedida teve algo de excruciante, até para o espectador.

Jô permaneceu na Globo por mais um ano, mas recusou todos os projetos que lhe ofereceram --como participar no “Jornal do Globo” comentando alguma notícia do dia, algo que já havia feito décadas atrás.

Agora, livre das amarras da TV e talvez já acostumado com sua nova rotina, Jô teve a elegância de admitir, no ar, que o tempo de seu talk show já havia passado. Citou Johnny Carson e David Letterman, dois ícones americanos do gênero, que se aposentaram ainda mais cedo do que ele.

E isto, justo no programa de um rapaz que ajudou a revelar. Foi como a passagem de um bastão em uma corrida de revezamento. Ou melhor, de um cetro: o antigo rei do fim de noite ungiu seu sucessor diante das câmeras.

Jô contou “causos” engraçadíssimos, falou de política, tocou bongô, lembrou suas passagens pela Record e pelo SBT. Também falou (um pouco) da peça que irá estrear.

Tudo relevante e divertido, mas nada comparável aos primeiros instantes de seu longo papo com Fábio Porchat. Um momento emocionante e cheio de significados, que já entrou para a história da nossa televisão.

Tony Goes

Tony Goes (1960-2024) nasceu no Rio de Janeiro, mas viveu em São Paulo desde pequeno. Escreveu para várias séries de humor e programas de variedades, além de alguns longas-metragens. Ele também atualizava diariamente o blog que levava seu nome: tonygoes.com.br.

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