Sóbria e trajando preto, cerimônia do Globo de Ouro foi altamente politizada
Já que não pode dizer que é a premiação mais importante do cinema americano --essa honra cabe ao Oscar-- o Globo de Ouro gosta de vender a si mesmo como "a melhor festa de Hollywood".
Há uma boa justificativa para isso: o álcool corre solto, antes e depois da cerimônia de entrega dos troféus. Os vencedores costumam estar "altos" quando ouvem seus nomes anunciados, e os discursos de agradecimento, não raro, saem cheios de imprevistos e até gafes. Todo mundo ri à pampa.
Mas não foi isso o que aconteceu neste domingo (7) no hotel Beverly Hilton, em Los Angeles, na Califórnia (EUA). A festa do Globo de Ouro foi sóbria, contida e altamente politizada.
LEIA MAIS
Veja como foi a cerimônia do Globo de Ouro 2018
Apresentação vira pedido de desculpas por assédios
O preto dominou o figurino. A cor foi escolhida como sinal de protesto pelo recém-formado grupo "Time’s Up" (ou o "tempo acabou"), formado por atrizes, diretoras, produtoras e outras profissionais da indústria do entretenimento, para denunciar o assédio sexual que ainda grassa nos bastidores.
O tapete vermelho só não ficou com cara de funeral porque muitas mulheres quebraram a solenidade do preto com brilhos e detalhes coloridos. Mas até os homens aderiram, alguns evitando a tradicional camisa branca do smoking e trajando preto dos pés à cabeça.
Coincidência ou não, todos os cinco filmes e programas mais premiados da noite não só são centrados em mulheres como têm forte viés feminista.
A minissérie "Big Little Lies" (HBO) levou o maior número de Globo --quatro ao todo-- e trata explicitamente de violência doméstica. Escolhida como melhor série cômica,"The Marvelous Mrs. Maisel" (Amazon) fala de uma dona de casa da década de 1950 que tenta a carreira de comediante " stand-up". E a melhor série dramática foi a mesma premiada pelo "Emmy", "The Handmaid's Tale" (que será exibida no Brasil pelo canal Paramount), uma alegoria futurista sobre a opressão da mulher pelo homem.
Nas categorias de cinema, os dois grandes vencedores foram a comédia "Lady Bird: A Hora de Voar" --que causou um certo escândalo por não ter sua diretora, Greta Gerwig, entre os cinco indicados ao prêmio de melhor direção-- e o drama "Três Anúncios para um Crime", sobre a luta de uma mãe para descobrir o assassino de sua filha.
Antes que alguém reclame de um suposto conchavo favorável à causa feminista, é bom lembrar que os membros da Associação da Imprensa Estrangeira de Hollywood, a entidade responsável pelo Globo de Ouro, não se reúnem para votar --portanto, ficaria difícil combinar uma estratégia.
Além disso, todos os agraciados são produtos de qualidade indiscutível. A premiação apenas refletiu uma tendência da indústria.
Os discursos foram muito mais sérios do que de costume. E nenhum mais que o de Oprah Winfrey, homenageada com o troféu Cecil B. DeMille pela carreira. Carismática, inclusiva e sem papas na língua, a apresentadora parece ter dado o pontapé inicial na campanha que pode levá-la à Casa Branca em 2020. Sim, já se fala em Oprah para presidente dos Estados Unidos.
O tom assumidamente feminista deve se diluir na entrega dos Oscars, que só acontece daqui a dois meses. Inclusive porque a premiação da Academia de Hollywood é cheia de categorias técnicas, ainda dominadas pelos homens.
Mas o Globo de Ouro de 2018 mostrou que alguma coisa mudou. Tomara que para sempre.
Comentários
Ver todos os comentários