Tony Goes

Por que não aceitamos que Ana Paula Arósio não queira mais ser famosa?

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Falta pouco mais de uma semana para o começo da Copa. Convulsões sociais eclodem no Egito, na Ucrânia, na Venezuela. Há eleições em outubro no Brasil, e no entanto quais são algumas das matérias mais lidas na internet na tarde desta terça-feira (3), enquanto escrevo esta coluna?

"Amigos se unem para ajudar a atriz Maria Gladys". "Após 50 anos, assistente de palco Russo deixa Globo". E, num tom menos dramático, "Patrícia Poeta comete gafe e vira assunto nas redes sociais".

Não existe nada mais ranzinza do que reclamar da futilidade das pessoas, que preferem se distrair com notícias do mundo do entretenimento do que se aborrecer com economia e política. É normal —e além do mais, quem sou eu, um colunista do "F5", para me queixar?

Mas é sintomático como gostamos de ver famosos —ou nem tanto— passarem por maus bocados. É a versão showbiz da "schadenfreude": a palavra alemã que descreve o prazer que sentimos com a infelicidade dos outros.

Nunca houve tanta exposição de celebridades na mídia. Revistas e sites esmiúçam em detalhes a doce vida que alguns levam: ilhas, jatinhos, festas, viagens. Claro que raramente é mostrada a ralação necessária para se atingir este patamar, os anos de preparação, as noites em claro. Parece que é fácil ficar famoso.

E nunca tanta gente quis ficar famosa, mesmo sem ter nenhum talento especial. Haja vista a proliferação de reality shows, concursos de calouros e vídeos amadores na internet. Muitos tentam, pouquíssimos conseguem.

Aí, quando alguém perde o que conseguiu, vibramos de satisfação. É reconfortante ver que fulana, que estrelou novelas de sucesso, agora mal consegue pagar o aluguel. Ou que beltrano, que emplacou um hit nos anos 80, hoje implora por uma chance num programa sensacionalista.

Bem feito, pensamos por dentro —e por fora também, dada a quantidade de comentários maldosos que essas notícias atraem.

Então, quando Ana Paula Arósio recusa uma suposta proposta milionária para voltar à televisão, ficamos pasmos. Como assim? O que essa mulher tem na cabeça?


Ela simplesmente não está a fim, pessoal. Não quer voltar a atuar, não precisa do dinheiro, prefere criar galinha. Mas nossa cultura colocou tamanho valor na fama, que não conseguimos entender que nem todos a perseguem.

E nem todos a mantém, é lógico. Pessoalmente, não me regozijo quando fico sabendo de alguma história triste. A profissão de ator é muito menos bem paga do que se fantasia por aí (pouquíssimas estrelas atingem salários estratosféricos), e a chance de uma carreira dar errado são grandes.

Mas também sou humano, e é claro que me divirto com as tentativas canhestras de se chegar o estrelato a qualquer custo. Como os vídeos da Nana Gouvêa "interpretando" em inglês, ou os "selfies" ridículos postados no Instagram disfarçados de marketing social.

Hehehe. Schadenfreude, schadenfreude.

Tony Goes

Tony Goes (1960-2024) nasceu no Rio de Janeiro, mas viveu em São Paulo desde pequeno. Escreveu para várias séries de humor e programas de variedades, além de alguns longas-metragens. Ele também atualizava diariamente o blog que levava seu nome: tonygoes.com.br.

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